O Totó do futebol?
São muitos os casos de amor, suspeitas e traição na literatura e na dramaturgia nacional e internacional. Numa das mais clássicas, em Dom Casmurro, de Machado de Assis, o personagem Bentinho termina o romance sem saber se foi ou não traído por Capitu. Poderíamos dizer que ele é o corno imaginário: mesmo que na realidade ele não fosse corno, ele passou a ser, pois, na sua imaginação, ele age como um corno. Como diria algum filósofo qualquer: cornice é um estado de espírito.
Mas não é só na ficção que a literatura conta com cornos. Hugh Hefner (foto), fundador da Playboy, por exemplo, muito antes de ter a idéia de exibir as beldades americanas nuas em páginas de papel na década de 1950, era um simples funcionário de alguma empresa qualquer, noivo de uma mulher comum. Na época, as mulheres casavam virgens, sabecumé. Mas Hefner não se conformava, e tentava de todas as formas traçar a mulher antes do casamento, entretanto, suas investidas foram em vão. Para chegar às redes com a pretendida, ele ficou noivo. Tudo ia bem, até que certa vez, vendo um filme no cinema (naquela época as pessoas também iam aos cinemas) a noiva começou a chorar compulsivamente. Após muita insistência de Hefner, ela confessou: havia liberado para um outro cara. Hefner sentiu-se traído até a alma, mas acabou deixando passar e casou com a fulana, vindo a ter uma filha com ela. Porém, a partir de então, ele focou a sua vida nos negócios, e deu no que deu: tornou-se um bilionário que contava com meia dúzia de amantes, a maioria capas ou coelhinhas da Playboy americana.
Já os mais devassos, como o americano Charles Bukowski e o cubano Pedro Juan Gutierrez, não se importam muito com relacionamentos. Caso alguma mulher os traísse, eles diriam para elas algo como “mas e desde quando nós temos algo além de sexo?”. Outros sofrem até a alma, como o francês Alexandre Dumas filho, autor do clássico Dama das Camélias, em que ele narra o relacionamento que teve com uma prostituta na década de 1840. Para ele, tudo era motivo de desconfiança, desconforto e pânico, entretanto, amava a cortesã como poucas vezes se viu alguém amar uma mulher na literatura universal.
Enfim, vendo tudo o que está acontecendo entre o Grêmio e o Ronaldinho Gaúcho, fico me perguntando: que tipo de corno o Grêmio é? Foi traído até a alma pelo seu ídolo há exatos 10 anos e, agora, simplesmente esqueceu de tudo em uma crise aguda de amnésia. Será que o meu professor Juremir Machado da Silva tem razão, e o Ronaldinho é a Clara da novela das oito enquanto o Grêmio é o Totó? Será que perdoará o Ronaldinho e voltará a ser traído, da mesma forma que o personagem de Toni Ramos?
Analisando friamente, a impressão que se tem é que o Grêmio é o homem que foi traído pela mulher amada há 10 anos, acabou fazendo beiço e promessas de que nunca mais a procuraria, mas ao voltar a ter a chance de tê-la de novo, pensando em todas as suas curvas, prazeres e encantos, não resiste e tenta a felicidade novamente. Porém, nessa história toda os gremistas terão duas possibilidades: na primeira, a consagração com um belo futebol e títulos, que apagará o episódio da traição de Ronaldinho em 2000. Nesse caso, é como se o amante traído voltasse a encontrar a ex-amante a todo o vapor sensual e sexual. Na segunda opção, ele pode bancar o corno manso, que, apesar de perdoar a ex-amante, não consegue desfrutar de seu belo corpo, mesmo tendo-a do seu lado. Enfim, uma espécie de Totó. Aliás, esse é um nome bem sugestivo para esse tipo de corno...
Ah, e feliz ano novo a todos!
Texto publicado no Jornal das Missões de hoje.