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quinta-feira, 14 de fevereiro de 2019

Monte Titlis: um lugar do caralho

Vou começar com uma dica quente, apesar da neve: se você está procurando um lugar do caralho pra passar a lua de mel, vá para os Alpes suíços. Não tem lugar melhor no mundo para se sentir no paraíso. É o contraponto das praias paradisíacas do Caribe. Porém, o frio, a neve, o aquecedor na cabana com a paisagem branca lá fora remete ao romantismo. Pelo menos pra mim, praia e calor me faz sentir vontade de sair, ouvir música, dançar, ver gente. Já a neve e o frio dá aquela vontade de ficar deitado na cama olhando a paisagem pela janela fazendo outras coisas, se é que você me entende...
No nosso caso, tudo começou ainda antes de chegar aos alpes. O trecho de Milão até Engelberg, na Suíça, foi de tirar o fôlego. Sem exageros, é simplesmente um sonho. A Cris foi a viagem inteira dizendo “olha ali, olha ali!”, e eu espiando, com um olho na estrada e outro nos alpes com as pontas brancas no topo, parecendo um sorvete com cobertura. É demais. Simplesmente demais. Nem o nervosismo de dirigir na neve pela primeira vez fez com que eu perdesse o ar de “devo estar sonhando”. Se você tiver a oportunidade de fazer isso uma vez na vida, faça.





Aliás, abro um parêntese. Como comentei em outro post, minha ideia inicial era ir de Milão a Monique e de lá ir para Paris, sem parar na Suíça. Quem me fez mudar de ideia foi a minha ex-colega Dani Picoli, que trabalha hoje na Onelife, que intermediou a nossa viagem. Ela foi para os alpes e começou a postar fotos e fotos nos Facebook. Achei simplesmente incrível. Então, mudei os planos e resolvi trocar a Alemanha pela Suíça. Munique dever ser bom e tudo o mais, mas, porra, os alpes são incomparáveis.
Ficamos em uma das opções mais baratas de Engelberg: a pousada St. Jakob. Quem sobe no monte Titlis tem outras opções, mas dessa você vai a pé até lá. E mais: é um luxo só, apesar do preço razoável. Ficamos no último andar da cabana. Dentro do quarto você pode ficar só de cueca e colocar a cerveja gelar na sacada. Aliás, da sacada você tem uma puta vista para um lago na beira da montanha. O quarto é amplo e o banheiro é com banheira. Em síntese, um lugar do caralho.



Chegamos lá e curtimos a cabana, a paisagem das redondezas, o lago na frente da pousada e tudo o mais. Porém, como não sabíamos nada sobre a cidade, fomos pegos de surpresa e tivemos que jantar na pousada pagando 20 euros cada prato. A comida é ótima, mas para quem não pretende gastar muito, há a opção de pegar algo no super e fazer o lanche no quarto, como fizemos no outro dia.
Quando amanheceu, partimos rumo ao monte Titlis. A pé, da cerca de 15 minutos. Vesti o uniforme: roupa térmica, calça jeans, blusão, casaco, bota de neves, touca e luvas. Não lembro muito do frio, pois vendo aquela paisagem toda você nem liga. Chegamos na estação e entramos na fila dos ingressos. Metade das pessoas estão ali para esquiar. Mas também há casais apaixonados, famílias com crianças, grupo de amigos, etc.
Quando a Cris viu o teleférico ela disse “eu não vou subir nisso daí”, ao que retruquei: “carajo, então o que você veio fazer aqui???”. Convenci ela a subir. Estranhamente, eu não estava nenhum um pouco nervoso, mas sim excitado com toa a paisagem. Não sei se foi pelo fato de ver a cabine presa no cabo de aço acima, da altura não ser tão grande quanto em um avião, mas estava muito a vontade nas alturas. Minha única preocupação era admirar tudo e tirar fotos.
Chegamos lá em cima. Tratamos fazer tudo: a ponte que balança, a caverna de gelo, o ponto mais alto, o teleférico giratório (o primeiro da Europa a girar 360 graus), etc. Foi de tirar o fôlego. Mais tarde, ainda encontramos um bar com cadeiras expostas ao sol. Na fila para pegar a cerveja conheci um suíço original com uma barba parecida com a do meu amigo e aluno Ramon Mendes. Ele gostava de futebol, principalmente dos clubes espanhóis. Contei para ele toda a história do roubo do River contra o Grêmio, pois ele havia visto na TV a final Boca x River. Ele também disse que acreditava que o Brasil estava indo desgovernadamente para o fundo do poço com a eleição de um fascista que só pensa em si. Para alguém que vive em um país onde as coisas são pacíficas e a população se ajuda, é difícil entender porquê um povo "alegre" elege um cara que quer que o povo se foda e que prioriza a lógica do "eu acima de tudo e o resto que se foda". Tentei explicar, mas não consegui. Aliás, não consegui porque nem eu sei o motivo que levou os brasileiros a cometerem esse suicídio social. Enfim, peguei a cerveja, despedi-me do Ramon suíço de esquerda, e deitei em uma cadeira, admirando a paisagem como se estivesse numa praia. Coloquei todas as fotos no Facebook, então, convido você a olhá-las lá. Aqui, selecionei algumas do passeio pelo monte. Afinal, há imagens que realmente valem mais do que um milhão de palavras.












Como disse, esse é o lugar perfeito para qualquer turista brasileiro, pois lá há o que não temos no Brasil: muita, muita neve. E, como falei no início do post, é o lugar perfeito para uma lua de mel, pois a paisagem é inspiradora. Fica a dica. 

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

Fazendo as pazes com a Itália


Minha relação com a Itália é, digamos, bizarra. Talvez, por brasileiros e italianos amarem futebol, é que ela até então se resumia às rivalidades e outros preconceitos, estereótipos e bizarrices. A primeira lembrança que tenho sobre a Itália é a Copa de 1990. Porém, como eu morava em Panambi, uma cidade com a cultura alemã muito forte, torci loucamente pela Alemanha no auge de meus 9 anos de vida. Acho que já contei isso aqui: naquela época a minha seleção era a alemã. Recordo-me que até não tinha aula em dia de jogos da Alemanha, lá em Panambi. E, como meu sobrenome é Ritter, no meu imaginário infantil eu era um alemãozinho. Além disso, como é público e notório, a grande rival da Alemanha no futebol é justamente a Itália. Acho que a partir daí eu comecei a “secar” os italianos e isso se tornou mais forte ainda em 1994, quando já tinha me conscientizado da minha triste sina de ser brasileiro, e o Brasil de Romário e Bebeto bateu a Itália de Baggio na final. Foi o título da seleção que eu mais vibrei até hoje. Também sequei loucamente a Itália na final da Copa de 2006 contra a França e a vitória daquela seleção horrível fez reascender no meu espírito um ranço com os italianos.
Com o passar dos anos a minha birra com a Itália se expandiu com a fama que os italianos têm de serem pão duros e sovinas. “Gringo pão duro” é praticamente sinônimo de italiano para alguns. E não é apenas pão-durismo, mas também, a fama de explorarem ao máximo qualquer um, até a mãe ou o filho. Eu trabalhei para “gringos” da Serra Gaúcha e, acreditem, foi horrível. Querem que você trabalhe muito além das horas na empresa em troca de uma merreca, além de descontar de seu salário até o ar que você respira. Não sei se todos são assim, mas meu ex-chefe com sobrenome italiano era. Entretanto, o mundo gira, e em Nova York tive colegas italianos e graças ao futebol, rapidamente ficamos todos amigos. A vida seguiu e volta e meia à rivalidade Brasil/Alemanha x Itália reaparecia, com o futebol ou além dele.
Quando chegou a hora de planejar a nossa viagem, a Alemanha estava incluída no roteiro. Porém, acabei trocando-a pelos alpes suíços (conforme vou voltar a falar em outro post). Já a Itália ficava no caminho. Então, incluí Milão na nossa rota. E, eu diria que não apenas fiz as pazes com a Itália como me apaixonei loucamente por ela. Provavelmente, depois de Paris (que é uma cidade muito mais cosmopolita do que francesa) Milão foi a minha cidade preferida. Ficamos lá dois dias, então, diferentemente do que vinha fazendo, não vou contar histórias em ordem cronológica. Vou simplesmente compartilhar algumas delas que ainda estão frescas em minha memória.
Quando acordamos já de tarde após as 20 horas de viagem e fomos para a rua, as pessoas conversando em italianos já me encantaram. Nunca tinha visto tanta gente falando italiano ao mesmo tempo. Até então havia presenciado apenas grupos de italianos conversando nos Estados Unidos, o que não me permitiu perceber como o idioma é bonito. Parecia que todos cantavam. Ouvindo italianos de verdade falando italiano você fica com vontade de também falar em italiano. Aí eu entendi ouro ranço meu com a Itália: não tem nada mais irritante do que ver um brasileiro tentando falar italiano. Fica uma fala forçadamente cantada, ridícula, bizarra. É deprimente e irritante. Acho que se algum dia eu estudar italiano só vou praticar o idioma no cursinho e/ou na própria Itália. Por isso, ouvir os italianos (ou estrangeiros que REALMENTE falam fluente) falando italiano é música para os ouvidos. Aliás, as italianas falando italiano é extremamente sedutor – e creio que as mulheres pensam o mesmo dos italianos.
Fomos ao Duomo. Trata-se de uma catedral simplesmente magnífica. Você fica embasbacado diante de tanta beleza. Assim como na Sagrada Família, em Barcelona, você pode ficar horas admirando aquilo tudo e viajando no tempo, pensando, “caraca, como construíram tudo isso séculos atrás?”. Fomos todos os dias até o Duomo – aliás, praticamente tudo fica nos arredores. Não vou ficar falando ponto turístico por ponto turístico que visitamos, senão o texto ficaria chato, mas tive que comer uma pizza italiana e beber um vinho na galeria Vittorio Emanuelle II. E vou dizer pra vocês: pizza e vinho na Itália não é apenas um prato culturalmente popular, mas também economicamente popular. E o melhor: não vai ovo na massa da pizza.
No entanto, uma das cenas bizarras desse trecho da viagem aconteceu na frente do Duomo. Há centenas, quiçá milhares, de pombos ali por perto. E você abre os braços e eles pousam em você. Obviamente que a malandragem tira proveito. Tem uns carinhas que colocam milho na sua mão para os pombos virem. Claro que depois você tem que dar uma gorjeta generosa para eles. Mesmo percebendo isso, caí num golpe. Estava a Cris, de braços abertos, esperando os pombos. Chegaram dois caras dizendo que eram do Quênia puxando mó assunto. Quando eu disse que era brasileiro, ele exclamou: “Corinthians!” e eu: “não, não, Grêmio!”. E ele logo repetiu, sorrindo: “Grêmio, Grêmio”. Conversa vai e vem, ele se oferece para tirar foto de nós juntos. Dou a câmera para ele. Nisso o outro vem e coloca milho na nossa mão. O sinal de alerta começa a piscar na minha mente: milho = gorjeta. Que merda! Fui tapeado. Mas, isso não foi nada. Enquanto um amarrava uma pulseirinha no meu braço, outro amarrava outra no da Cris. “É do Quênia, para dar sorte para vocês”. E eu: “ok, really really thank you”. Então, o papo mudou. O sorriso simpático dos supostos quenianos sumiu e eles queriam nos cobrar 50 euros por tudo (as fotos, o milho e as pulseirinhas). Eu até diria que não pedi nada – como acabei fazendo depois, com outro cara que veio dar uma rosa pra Cris para tirar uma foto e eu disse que odiava rosas – mas o carinha continuava com a minha Nikon no pescoço. Olhei ao redor. Uma multidão. Se eu vacilar, esse carinha vai sair correndo com a minha Nikon. Saquei duas notas de cinco euros da carteira enquanto puxava a Nikon do pescoço dele. Paguei 10 euros por milhos e uma pulseirinha que certamente não foi feita no Quênia, mas ali, nas ruelas de Milão. Ainda estou com a pulseirinha e não pretendo tirá-la para nunca mais cair em um golpe. Sempre que alguém vem com papinho, oferecendo muito por pouco, eu olho para a pulseirinha e digo não. Se o sujeito insiste, sou grosso. Aprendi do pior jeito.
Fora esse contratempo e o hotel, que não era lá dos melhores, tudo ocorreu espetacularmente bem. Encantei-me com os bondinhos, com os museus, com as explicações dos guias dos museus que só falavam em italiano e que eu não entendia nada mas ficava ali, ouvindo aquelas palestras como se fossem uma ópera. Cogito, futuramente, estudar italiano e passar uma temporada na Itália. Todas as vezes que precisei pedir informações os italianos foram solícitos e amigáveis, mesmo quando não falavam praticamente nada em inglês. O clima de Milão (espiritualmente falando) é ótimo, é alegre, é envolvente.
As pessoas conversam bastante, sorriem, gargalham. Você se sente como se estivesse numa festa coletiva mesmo quando está apenas caminhando sem rumo pelos arredores do Duomo.
Até quando pegamos o bonde lotado para ir até o bairro de Naviglia as pessoas conversavam e riam. Aliás, o bairro é simples, tem um canal bem mais modesto do que o famoso de Veneza, mas é acolhedor. Jantamos pizza e vinho numa noite lá. Em resumo, adorei toda a cidade. Fora os golpistas, tudo (até a simplicidade) me deixou apaixonado por Milão. E creio que o resto da Itália deve ser parecido (voltei sonhando em conhecer Roma).
Para finalizar, uma anedota. Certa noite, depois de ter tomado várias taças de vinho no jantar, chegamos ao hotel e vi umas garrafas bizarras de cerveja no freezer da recepção. Peguei duas e bebi antes de dormir. No meio da madrugada, ainda meio bêbado, levantei para ir ao banheiro. Como em cada hotel o banheiro fica em um lugar diferente, acabei levantando da cama e indo reto. Abri a porta e PUM! caí de pernas para o alto dentro do armário. A Cris acordou assustada com o barulho enquanto eu resmungava “caralho, é o armário!”. O banheiro ficava mais para o lado... Por via das dúvidas, na noite seguinte, trocamos de lugar.