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segunda-feira, 17 de abril de 2017

Have a good trip, Fronza Brother!

Depois de uma séria discussão com Dudu Fronza, o Fronza Brother do grande Ronaldo Fronza Júnior, aceitei (por intervenção do Ronaldo) publicar o texto que se segue:

Escrevi esse texto após uma discussão com o Mr. Ritter, pseudo dono desse blog. Eu mandei um texto meloso e ele me retornou dizendo, de forma educada – quase acadêmica - algo como: “porra, xará, assim não dá mais! Isso aqui tá virando novela das nove, novela mexicana, música sertaneja, o caralho! Mais um texto desses e será o último!”. Parece um membro da família Ochs dando mijada em jornalista do New York Times ou algum descendente de Assis Chateaubriand achando que ainda manda no Correio Braziliense. Confesso que fiquei ofendido com o Mr. Ritter, que disse cagar e andar para o que eu penso ou sinto. Ainda fez uma das coisas que mais odeio, comparou-me ao meu irmão: “Porra, nem parece irmão do Ronaldo! Ele sim, leva jeito para escrever para o blog, mas nunca quer, aquele grandíssimo filho da puta”. Ok. Então, combinei com o Mr. Ritter o seguinte: esse será o meu último texto, a minha última contribuição para esse espaço. (Até parece que ouço a voz do larápio falando “contribuição? Só se for para esse lugar ficar mais às moscas do que já está!”).
Vou escrever esse último texto para falar de coisas boas. Para falar de você. Para falar do quanto eu gosto de você. Do quanto eu gosto de falar com você, de ver você, de pensar em você e de escrever sobre você. Deve ser por isso, aliás, que você ficou de saco cheio - quase tão cheio quanto o do Mr. Ritter. Da última vez em que conversamos falei várias coisas sem sentido, que não valeria a pena comentar ou tentar explicar – do tipo, “vou abandonar o meu gato para ficar com você, afinal você tem alergia a pelos de animais. Mas uma coisa em especial, dentre as várias que você me disse, fez com que eu brigasse com o Mr. Ritter para publicar esse último texto. Foi algo como “eu ainda não sei o que você viu em mim”. Pensando nas coisas que vi em você, eu poderia escrever uma música e mandar para o pessoal do Kings of Leon gravar em inglês e fazer um clipe que seria o maior sucesso musical do século. Poderia escrever um livro de poesias que voltaria a colocar o gênero na lista de best sellers assim como acontecia quando Vinícius de Moraes se inspirava nas suas deusas gaúchas, cariocas e paulistas, em Copacabana, Ipanema e Leblon (nenhuma chegava aos seus pés), nos bons tempos em que palavras e sentimentos eram valorizados. Poderia escrever um romance de ficção em que eu seria o Dom Quixote e você a minha doce e linda Dulcineia del Toboso. Aliás, até poderia dizer que você é a minha Dulcineia, no entanto, a diferença entre você e a musa do Dom Quixote é que você é exatamente como eu te enxergo, enquanto a do Dom Quixote é apenas fruto da imaginação dele... Mas já enrolei demais, e antes que o impaciente Mr. Ritter corte esse texto ou desista de publicá-lo, vou explicar aquilo que você ainda não sabe.
Se não estou enganado, no dia em que conversamos sobre isso eu falei algo como aquela letra do Deixa em off, “eu sei que não era pra gente se envolver, que não era pra gente se encontrar, mas esse amor bandido não posso evitar”. E completei dizendo que no início eu não tive a intenção de me encantar tanto por você, mas foi acontecendo e que eu não entendia o motivo daquilo. Então, você concordou, dizendo a tal frase: “sinceramente, eu também não sei o que você viu em mim”. Agora, quando decidi escrever esse último texto, eu vi tudo claramente. Pois o que vi em você só está em você e em mais ninguém.
Primeiro, vi teus olhos lindos (compará-los aos olhos da Capitu faria com que o Mr. Ritter caísse duro ao ler essas linhas, então, vou poupar você e ele desse clichê horrível). Mas, sim, vi teus olhos e viajei neles. Voltei para os lugares mais maravilhosos pelas quais já passei.
Senti a brisa do mar das praias mais paradisíacas que já conheci (roubei essa foto do arquivo do Mr. Ritter). O clima quente nas areias finas e claras do Atlântico e as rochas formadas pela violência das ondas do litoral frio e belo da Califórnia no Pacífico. Olhando teus olhos fiquei curioso para entender o que mais se passa por trás deles, o que torna esse teu olhar tão profundo e tão encantador. E, quanto mais nossos olhares se encontravam, mais os seus olhos atraíam os meus e mais vontade eu tinha de fitar eles. É como ver o firework do 4 de julho em Los Angeles. Você sempre vai querer mais. Porque é belo, é magnífico, é grandioso e esplendido.
Segundo, vi seu sorriso. Impossível não se encantar. E tenho certeza que não fui o primeiro nem o único e nem o último. Seu sorriso, combinado com o seu olhar e com a sua boca linda, são mais belos do que todas as palavras que eu possa escrever para tentar defini-los. Seu sorriso é contagiante. Vendo você sorrir, tenho vontade de sorrir também. Meu coração acelera e fico me sentindo um moleque, o personagem de um romance de Mark Twain, que quando via as meninas da escola se aproximando começava a fazer palhaçadas e a plantar bananeira para chamar a atenção delas e fazê-las rir. E digo bobagens com tanta facilidade quando você está diante de mim, sorrindo, porque o seu sorriso simplesmente me inspira e me traz as energias mais positivas possíveis. E você nem sabe, mas você tem vários tipos de sorrisos, e é difícil de escolher qual é o mais belo. Tem a gargalhada, que é quando faço uma piada infame – geralmente relacionada a alguém que conhecemos. Tem o sorriso simpático, que normalmente você faz quando nos encontramos, antes dos cumprimentos. Tem o sorriso nervoso acompanhado do rosto levemente avermelhado, que é quando te faço um elogio.
Tem o riso de boca fechada, que é quando falo algo que não é muito humorístico mas que você concorda por acompanhar meu raciocínio. E tem o riso irônico, que é quando eu te faço qualquer tipo de cobrança, então, você dá uma risadinha e depois solta algo como “engraçadinho”. E, quando isso acontece, sei que na sequência vem algo como chumbo grosso (ainda bem que é chumbo, e não pólvora, aliás, nada do que vem de você me faz sentir mal ou incomodado). E tem o riso escondido por trás de outros sentimentos, como aquele, que está no fundo da sua expressão naquela foto em que você está com a testa franzida e olhar bravo. Eu posso estar cobrindo a guerra da Síria ou passando frio na Patagônia que, sempre que ver essa foto, vou sorrir e um nó de saudades desse breve e bom tempo tomará conta do meu peito.
Além do olhar e do sorriso, há os seus pensamentos. O que vou te dizer agora é um elogio, e não uma crítica: você é incoerente e confusa. E eu me perco nessa incoerência e nessa confusão. Mas eu enxergo isso. E tenho mais vontade de mergulhar nesse mar de incoerências e confusões (mesmo vendo a plaquinha indicando: Perigo, tsunami), pois eu também sou exatamente assim. E os seus pensamentos resultam em conversas fantásticas e inesquecíveis (pois sei que em pouco tempo vão ficar apenas as lembranças). E também refletem-se nos seus textos, escritos para todos os que te encantam, te irritam, te fascinam, te inspiram e te desagradam. Aliás, somos seres humanos, não somos sujeitos lógicos, previsíveis ou que, como você já escreveu, tem manual de uso ou de instrução. E é incrível como as pessoas nos cobram para funcionarmos como se tivéssemos um manual! (viu só, Mr. Ritter?). E é impressionante como todos gostam de nos enquadrar em caixinhas onde há rótulos: você tomou um porre, é O BÊBADO. Você convidou alguém próximo de você para sair, então é O TARADO. Se aceitou o convite, é A PIRINHA. Fumou maconha na frente da praia com os amigos na Califórnia, é O MACONHEIRO. Levou chifre (conceito mais ultrapassado, mas enfim) durante algum relacionamento (mesmo que de uma semana), é O CORNO. Saiu para beber e conversar com amigos que são assumidamente homossexuais, então você é O VEADO ou A SAPATA. Como diria a letra do Cazuza: “te chamam de ladrão, de bicha, maconheiro, transformam o país inteiro num puteiro...”.
E acho que esses rótulos, e o medo de ser colocada em uma caixinha com um desses nomes fez com que em algum momento você quisesse me deixar dentro da caixinha na qual estou enfiado, quieto em meu canto. Ou não, vai ver eu que estou viajando e isso só faz parte da minha imaginação e da nossa incoerência e confusão. O fato é que não consigo ficar dentro dessa caixinha. Aliás, minha irmã, mãe, pai, ex-namoradas, amigos e amigas sempre me chamam a atenção para isso, e eu sempre digo que estou cagando e andando para essas caixinhas de rótulos, e elas só existem na mente das outras pessoas, não na minha. Provavelmente já te falei isso e possivelmente você não concorda comigo – você e 99% da sociedade. Mas é por isso que sou tão inquieto. E percebo que, no fundo, você também é uma pessoa totalmente inquieta. E por isso as nossas conversas são tão gostosas, tão boas que quando estou contigo eu simplesmente não vejo o tempo passar: 20 minutos, 40, uma hora, duas, quatro...? Não sei... Pode ser no às vezes irritante online, pode ser no cara a cara, os assuntos nunca terminam, bem como as perguntas que você me inspira a fazer... O Mr. Ritter deve estar se questionando: e esse texto de merda, nunca vai terminar? Ok... Provavelmente ninguém leu até aqui... E existe uma possibilidade considerável de que nem você vai chegar ao fim dele... Mas vamos lá...
Não vou entrar aqui em outras questões óbvias, como gosto musical, literário ou, de uma maneira mais ampla, cultural.
Aliás, aprendi a gostar de muitas bandas e músicos que não conhecia través de ti. Esses dias até encontrei um músico irlandês, Hozier, que eu não conhecia. Não sei se você conhece, gosta ou não, mas as músicas dele – que estava passando em um especial em um canal qualquer – fizeram eu me lembrar de você, pois elas tocam no seu ritmo, no ritmo daquelas outras músicas, que cada vez que ouço também me fazem pensar em você. Contudo, apesar dos gostos em comum, logicamente, há as diferenças. Itália x Alemanha. Hat x Mcc (os segundos têm razão). Cerveja x Skol beat. Querer x Não querer. Ônibus x Avião. Então, prefiro discutir os assuntos, mais para te provocar do que por acreditar que você vá mudar de gosto ou de opinião – aliás, a última coisa que gostaria seria mudar algo em você, pois você é perfeita do jeito que é (inclusive pelas imperfeições e incoerências).
Também não vou falar em detalhes do quanto te acho linda, do quanto a sua pele branca combina com o seu cabelo negro, do quanto a sua boca é tão apaixonante quanto o teu jeito, o teu beijo, o teu olhar e o teu sorriso, do quanto é gostoso ficar te olhando e pensando em você ouvindo uma das dezenas de músicas que aprendi a gostar com você... E gosto de te olhar mesmo que você não goste disso. E, se desvio o meu olhar do teu, se olho para o lado quando estamos no mesmo ambiente, mesmo enquanto conversamos, é porque te quero perto, mesmo sabendo que isso é impossível. Foi desviando de seu olhar que me deparei com as suas unhas de Lady Bug, sua corujinha no colar, e outros detalhes que te deixam ainda mais bela.
E, por saber que você não gosta que eu goste de você do jeito que eu gosto, e pela rabugentice do Mr. Ritter, é que resolvi escrever esse último texto. Um texto que vou guardar para sempre, pois, quem sabe, no futuro, viajando pelo mundo, possamos nos reencontrar. Ou, como diria Humberto Gessinger: “um dia desses, num desses encontros casuais... talvez a gente se encontre, talvez a gente encontre explicação...”. E, então, ao chegar em casa, surpreso por ter te encontrado, vou catar esse texto, vou relê-lo e não vou dormir pensando em você, tentando imaginar como está a sua vida,
quem conquistou teu coração, se seu conquistador não está deixando os seus pés ficarem gelados embaixo das cobertas no inverno, se ele te beija direito, se ele sabe te acariciar como você gosta e merece, se ele consegue te beijar todinha te deixando toda arrepiada de desejo, se você ainda tem os mesmos gostos, se você viajou muito desde a última vez em que nos vimos, se você também pensa em mim de vez em quando... Se você ainda acha que sou o espinho que vai estourar o balão que passa voando, livre, leve e solto diante dos meus olhos. Aquele balão que queria pegar, mas não posso, pois sou um cacto.
Mas, como tem muito tempo até lá, sem ter a perspectiva de te ver e de ouvir a sua voz por muito tempo, enfim, de ter você como minha Dulcineia del Toboso, vou fazer aquilo que mais gosto de fazer: deixar os animais com os vizinhos, vender os meus móveis, minha bicicleta e minha motocicleta, pedir demissão do emprego e cair na estrada. Afinal, como dizia o Mestre dos Magos: para se achar, primeiro é preciso se perder. E, já que não posso me perder em seu coração, vou me perder pelo mundo, que é grande demais para nos deixar encaixotados em pequenas caixas. E, andando pela estrada afora, sem levar os doces para a vovozinha, vou recitando baixinho os versos da poesia do mestre do romantismo, Vinícius de Moraes, afinal, viver algo tão bom não é para amadores, como o Mr. Ritter pensa. Para degustar isso “é preciso um cuidado permanente não só com o corpo mas também com a mente, pois qualquer ‘baixo’ seu, a amada sente — e esfria um pouco o amor. Há que ser bem cortês sem cortesia; doce e conciliador sem covardia; saber ganhar dinheiro com poesia — para viver um grande amor”.
Hasta la vista, Mr. Ritter! Mandarei um cartão postal das pirâmides do Egito! E você, minha Dulcineia, se quiser me encontrar, já sabe onde procurar! Basta seguir os rastros que deixei pelo caminho. Rastros que só você tem o dom de decodificar, mas isso apenas se você quiser e for impermeável ao diz-que-diz-que que encontrará pelo meio do caminho. Não vou dizer que vou ficar te esperando porque há muitas ondas pra pegar, muito mar pra navegar, muitos ares pra cruzar, muitas multas pelas estradas pra tomar e muita gente pra conhecer e encontrar, enfim, há uma vida para ser vivida ao invés de se ficar parado no tempo e no espaço.


Mas, se você me encontrar enquanto corro por essa órbita, please, say “hello”, pois será um prazer ter a sua companhia nessa infindável viagem sem fim pelos incontáveis cantos do universo. Seja a bordo de um avião, de um elefante africano, de uma nave espacial ou de uma Kombi dos anos 70.
Agora saio de cena deixando um beijo daqueles que não vem da boca para você e um “passar bem” ao Mr. Ritter.

quinta-feira, 13 de abril de 2017

In the hidden heart of Las Vegas

Participei de um concurso que concorria a uma viagem de dez dias para três países da região balcãs, na Europa. Era o 2017 World Nomads Travel Writing Scholarship in the Balkans. Foram cerca de 8.500 participantes do mundo inteiro e os três vencedores, anunciados hoje, foram: um americano, um australiano e um neo zelandês. Como durante todo o processo os concorrentes podiam ler os textos uns dos outros, eu imaginava que era praticamente impossível vencer, pois havia textos excelentes de todas as partes do mundo. Como o texto era em inglês, e estou com preguiça para traduzir para o português, publico aqui o original, que concorreu ao prêmio. PS: usei o tamanho máximo permitido pelo regulamento, pois a história seria bem maior, se fosse permitido.

On a hot dry night of June 2014, I traded five dollars in paper for five dollars in coins so I could bet on the plastic horses at the Fremont Experience casino in Las Vegas. My future depended on my luck. The money from my scholarship, which I received to study for a year at NYU, was nearly gone and I was going on a cross-country trip from San Diego to New York. The scholarship was granted to me to travel from my home in Brazil to study for a year in the US. My plan was to cross the country from East to West, from New York to California, by bus then turn around and journey back to New York by car.
By the time I got to Vegas I had spent more than I expected to spend. I imagined myself a Brazilian Bukowski. While betting, I drank the beer that was served, for free, to the bettors. I went to the casino at 8PM. When I stumbled out onto the street at 2AM, I was drunk and happy. Somehow I had managed to win over a thousand dollars. My life had been saved.
That night I lived the American dream. I was Kerouac and Hunter Thompson. I was the real Gatsby. Well, I realized I was still poor and far away from home, but I sure felt relieved. The trick to win on the horses is to keep spinning and not stay sitting in the same place. I commented about this to a 50-year-old lady with gigantic breasts. She did not believe me. She loudly murmured: Bullshit.
During this trip I left the sky to visit the bottom of the well, thinking I would have to make my passage from New York on to Brazil because I was out of money. But I completely changed my style of life as a teacher by traveling like Kerouac, immersing myself in the interior culture of the US, a culture I had only known through literature and cinema. I have now seen what the country has, both better and worse: beautiful mansions and beggars on the streets.
In Las Vegas, walking with thousands of tourists, I stopped to talk with a street musician. He had a sign that said, "I do not show up in the movies shot in Vegas."
- Do you live on the street?
- I live under the earth.
- Under the earth?
- Yes, I live in one of the hidden tunnels of the city.
I remembered that once I had read some reportage about it. Even so, I asked him:
- Why?
He laughed and indicated with open arms what was around us.
- Look around you and you will have the answer.
Even with little money, I put a five dollar bill in his pot, to which he smiled and said:
- The next one is for you.
And he played a classic: Imagine, by John Lennon.

sábado, 8 de abril de 2017

Marcas no copo plástico

Mais uma do Fronza Brother:

Marcas de batom na borda de um copo plástico
No peito euforia, abraços, riso fácil
E com desconhecidos, seguia, criando laços
Transpirava alegria era dona dos seus passos

Quando fui servir teu copo plástico branco e vi a marca de batom nele, automaticamente me veio à mente a letra da música do Maneva. Aliás, essa deve ser apenas mais uma das várias músicas ou bandas que conheci através de ti. Gosto de viajar pelo passado, presente, futuro e para outros mundos, outros planetas, outras galáxias ouvindo elas. Lembra aquela vez que estávamos todos na beira da praia – amigos, conhecidos e desconhecidos - no final de tarde, com a turma tocando violão cantando Charlie Borwn, Nenhum de Nós, Raul Seixas, Engenheiros e outras? Até Robocob Gay cantei e dancei depois que o sol deu lugar para a lua e todos conversavam e cantavam e bebiam e viviam e olhavam a quebra incessante das ondas do mar. Era quase madrugada quando metade do pessoal já tinha ido embora e fiquei ali, sentado sozinho na areia, pensando como devia ser a vida dos milhões de peixes que moram entre o nosso litoral e o litoral africano... Fiquei imaginando como deve ser a vida na África, como seria bom viajar contigo para as praias de Angola, do Marrocos, de Serra Leoa, da África do Sul... Na minha mente eu já passeava contigo em cima de um elefante quando você se sentou ao meu lado e sem dizer nada escorou a cabeça no meu ombro, agarrou o meu braço direito, e ficamos ali, sentados, olhando para o mar. Como você já me disse algumas vezes: o silêncio às vezes é bom. E não precisávamos dizer nada um ao outro, pois o mar dizia tudo para nós. Quando você encostou a sua cabeça em mim eu não cheguei sequer a estranhar. Até esqueci de seu medo de que nossos amigos descubram o que já estava rolando com nós a um bom tempo. Dessa vez, ao contrário das outras em que me insinuei na frente dos outros, você não me chamou de maluco e eu não pude rir para dizer “maluco por você”. Assim, dessa vez não rolou aquela carinha de brava, que te deixa tão linda, mas que faz lembrar a carranca sem muita brabeza que a minha mãe fazia quando eu aprontava alguma quando era pequeno... Dessa vez foi diferente. Não fomos a Mônica e o Chandler do Friends que, no início do namoro, tentavam esconder tudo do Ross (brother dela).
Afinal, não estávamos namorando. Não éramos noivos, casados, nem nada. Éramos amigos? Companheiros? Não sei, acho que um pouco de cada coisa. Como chamam isso, não importa, o fato é que aqueles minutos em que você escorou a sua cabeça em meu ombro na frente do mar foram mágicos. Eu fiquei eufórico e calmo ao mesmo tempo. Tudo ocorreu tão naturalmente que ninguém sequer lembrou de nos olhar, pois cada um estava em seu próprio mundo, cantando, dançando, bebendo, falando. Foi então que beijei a sua testa e você me olhou e sorriu. Sem dizer nada, levantou-se, pegou-me pela mão e me conduziu de volta ao grupo, onde cantamos e dançamos a noite inteira.
Ah, baby, você me faz sentir tão bem. Lembrando do seu olhar e do seu sorriso eu canto de madrugada sozinho em casa. E lembrando o nosso primeiro beijo acordo com vontade de apertar a campainha do vizinho para desejar bom dia e de beijar o português da padaria, como na música do Zeca Baleiro. Gosto de citar músicas, pois várias delas parecem terem sido escritas para descrever como você me inspira. Mas, baby, eu adoro você como você é: livre, dona dos próprios passos. Por isso você é tão linda e inspiradora: você é como o peixe do oceano, o pássaro do céu, a leoa da selva africana. E por isso deixamos tudo em off, nem eu nem você queremos os estigmas e os rótulos colocados pelos outros. Queremos algo que é só nosso. Algo que ninguém pode controlar – às vezes, nem nós mesmos.

quinta-feira, 6 de abril de 2017

Gonzariando o que é obrigatório

Seguidamente algum aluno me pergunta: mas afinal, o que é jornalismo gonzo? Essa é uma pergunta foda de se tentar responder, pois há definições feitas pelo próprio Hunter Thompson que não dão conta do recado. A verdade é que o jornalismo gonzo pode ser definido como a união entre a vida e o estilo de vida de Thompson com seus textos literários-jornalísticos. Ele era o que ele escrevia. Acho que consegui resumir em uma frase um dos principais lados da minha tese de doutorado. Mas, por mais que eu fale, fale, fale e fale, só tem um jeito de se descobrir o que é jornalismo gonzo: lendo os textos de Hunter Thompson da fase gonzo. E, assim, eu entro num dilema professoral-acadêmico: eu não quero obrigar ninguém a ler a obra de Thompson. Seria contraditório. O próprio Thompson odiaria essa ideia. Ele era um defensor da liberdade, de cada um definir as suas próprias regras, um questionador das leis, da moral, dos bons costumes, da sociedade, das autoridades, enfim, de tudo que ia contra a liberdade individual de cada um. Então, se eu chegasse e dissesse para meus alunos: “vocês TEM QUE LER Medo e Delírio em Las Vegas para fazer um resumo valendo 10 pontos” eu correria o risco de, ao final da tarefa, o aluno me responder: “professor, fiz o resumo, mas você não entendeu nada que esse cara quis dizer, senão você não teria dado essa tarefa como obrigação”. É complexo.
E é foda. Pois eu gostaria que todos os estudantes de jornalismo lessem ao menos um livro de Hunter Thompson. O jornalismo e o mundo seriam bem melhores se todos os jornalistas já tivessem lido (e entendido) pelo menos a ideia central da obra de Thompson (que vai além do estigma das drogas e da piração). Entretanto, fico imaginando o que teria acontecido se algum professor tivesse me obrigado a ler um livro de Hunter Thompson quando eu estava na graduação. Possivelmente aconteceria uma das alternativas abaixo:

a) Eu não leria, cataria um resumo na internet e alteraria o texto pra passar com 7,0.
b) Pediria para alguém que leu me contar a história para eu fazer um resumo.
c) Não entregaria e ficaria sem nota e odiaria Hunter Thompson e o jornalismo gonzo pelo resto da minha vida.
d) Leria de má vontade, procurando achar todos os defeitos possíveis e imagináveis, pois essa é uma obra obrigatória, e sou contra tudo o que é obrigatório.
e) Não leria e escreveria as frases mais genéricas ditas pelo professor em sala de aula e anotadas no caderno, coisas do tipo “Hunter Thompson criou o jornalismo gonzo e, lendo esta obra, podemos perceber os motivos que a fizeram ser considerada um clássico do jornalismo literário mundial...”.

Então, eu jamais teria realmente lido um livro do Hunter Thompson e, muito menos, teria feito uma tese de doutorado sobre a obra dele.
O que eu tento fazer diante desse quadro – e que geralmente funciona muito bem – é dar apenas uma amostra, sem obrigação. Tipo o vendedor que oferece uma boquinha grátis no mercado: experimenta aí, sem compromisso. E o resultado é o mesmo: alguns gostam e querem mais e outros não (e ainda pensam “que professor retardado, considerar esse maluco um grande jornalista”), e cada um segue com a sua vida (com ou sem Thompson). Sem problemas.
Mas o que eu tenho feito é mostrar um trecho do documentário Life and Word of Dr. Hunter S Thompson e dar duas ou três páginas de alguns dos textos do jornalista que deixam claras as suas características e a sua visão mundo. Seria loucura tentar falar sobre essas características nesse espaço, afinal, quem quiser pode conferir a própria tese em que falo um pouco disso...
Bom, e por que escrevi tudo isso? Vou saber eu... Ontem comecei a escrever um texto que não terminei sobre crises de abstinência e ele se tratava justamente disso: coisas que não consigo ficar muito tempo sem ter ou fazer. E duas dessas coisas são: ler e escrever, não necessariamente nessa ordem. Eu andava meio estressado, meio angustiado, aí me dei conta de que fazia alguns dias que eu não pegava o livro que estou lendo. Li umas dez páginas e me acalmei. É tipo um viciado em crack que fica muito tempo sem o produto químico em seu organismo. E, hoje, senti essa necessidade insana de escrever. Por isso, escrevi sobre Thompson e Gonzo, afinal, breve tentarei explicar mais uma vez para uma turma com 40 alunos que diabos é jornalismo gonzo. E, na próxima crise de angústia e abstinência, caso eu lembre, escreverei sobre as outras coisas das quais não vivo sem. Hasta, imaginário leitor!

quarta-feira, 5 de abril de 2017

A dupla Gre-Nal e os cavalinhos

O escritor norte-americano Charles Bukowski, um dos mais famosos da contra-cultura e da geração maldita da literatura que começou a se destacar a partir dos anos 1960, era viciado em duas coisas: bebida e apostas em corridas de cavalo. Ele não era um especialista em turfe, mas desenvolveu técnicas simples para tentar errar o mínimo possível no hipódromo. Quando eu estava nos Estados Unidos realizando estágio doutoral, passei por Las Vegas e descobri uma corrida com minicavalos de plástico que corriam em uma minipista eletrônica. Esses eram os verdadeiros “cavalinhos”, que é como Bukowski fazia referência aos animais de verdade.
O negócio era chapa quente: U$0,25 por aposta. Troquei U$5 em moedas e comecei a jogar. Cheguei a estar perdendo U$3, mas quando resolvi adotar a técnica de girar na mesa, trocando de lugar para não ficar sempre no mesmo lado da máquina, comecei a vencer. Transformei os U$5 iniciais em U$40. Uma ninharia, para os apostadores milionários de Vegas, mas para a minha condição (de estar ali mais para ganhar a cerveja grátis servida aos apostadores) esse foi um lucro considerável. O almoço e o jantar do dia seguinte (que era basicamente três pedaços de pizza ou hambúrguer com fritas) estavam garantidos.
Escrevi tudo isso para dizer basicamente o seguinte: o futebol apresentado pela dupla Gre-Nal nesse início de temporada (que já nem é mais tão início assim) torna impossível qualquer tentativa de previsão. Não adianta mudar de lugar no sofá, ir para um bar e depois noutro, trocar a camisa da sorte. Não tem jeito. É uma montanha russa: numa partida o time joga bem e goleia e na outra perde ou empata com time pequeno. Dessa forma, para ganhar qualquer aposta envolvendo Grêmio e Inter em 2017, você só vai precisar de uma coisa: muita sorte. Mais do que o velho Buk tinha nos hipódromos de Los Angeles e da que eu tive nos cassinos de Las Vegas.

*Texto publicado no jornal Folha da próxima sexta.

domingo, 2 de abril de 2017

Saudades do velho Aranha

Quanto mais o tempo passa, mais eu sinto a influência do meu velho e bom amigo Felipe Brem, o famoso Aranha, na minha vida e no meu jeito de ser e de ver o mundo. Já escrevi outros textos sobre o Aranha nesse espaço, há anos atrás, mas nos últimos tempos, em que coisas sensacionais aconteceram rapidamente na minha vida, aquela filosofia de vida do velho Aranha, de sonhar e de perseguir o seu sonho, tem sido fundamental. Para quem não conheceu o Aranha, eu explico: ele era uma espécie de Hunter Thompson brasileiro sem saber quem era o Hunter Thompson. Era o espírito mais livre que eu já conheci na vida. Ele era aquele cara que te convidava para beber na segunda-feira, e se o convidado responde que “hoje é segunda”, ele respondia: “e daí? O fato de ser segunda não tem nada a ver com a minha vontade de beber nessa noite quente”. Aliás, foram várias as segundas ou terças ou quartas em que bebemos até altas horas da madrugada, conversando sobre todos os assuntos, resolvendo todos os problemas filosóficos da humanidade, sonhando acordado com viagens e aventuras ao estilo Jack Kerouac, planejando o futuro malucamente, falando coisas do tipo: “depois da formatura vamos arrumar um emprego em Salvador para curtir a praia tomando umas depois do expediente”. Mas, infelizmente, o velho Aranha não conseguiu se formar. Ele se foi pouco mais de um ano antes da formatura. Lembro como se fosse hoje, a gente combinando de levar uma garrafinha com algo alcóolico no bolso do paletó para tomar escondido lá de cima. Como ele ficaria sentado ao meu lado, ao levantar eu passaria a garrafinha para ele, que me entregaria de volta para ir lá receber o canudo. Tudo isso foi planejado num bar, numa noite de segunda-feira, depois da aula.
O Aranha era foda, no melhor sentido do termo. Acho que o cara mais foda que já conheci. Lembro-me de uma vez que uma estudante ruiva de Economia, uma daquelas de tirar o fôlego, veio em minha direção. Ela perguntou: “você é colega do Aranha?”. “Sim”, respondi sem entender nada. “Eu sou a Fulana. Por favor, diz pra ele que quero muito conversar”. Falei pra ele, que não deu muita bola, pois era só mais uma da lista de mais belas da universidade que corriam atrás dele (e eu, que achava ele feio pra caralho, nunca entendi como ele fazia isso). Era um Don Juan sem fazer força. Mais que o meu amigo Tiago Beck, que não poupou nem integrantes da minha família. Mas ele não era foda apenas pelo encantamento que provocava nas mulheres, ele era um cara que não tinha nenhum preconceito, pois tratava todos exatamente da mesma maneira: como se fossem seus amigos de infância.
Na primeira noite em que bebemos juntos era meu aniversário. Eu e o Beck encontramos ele e o professor Paulinho tomando umas num dos vários botecos da frente da universidade. Bebemos um pouco até que eu disse que era meu aniversário mas que ninguém (exceto pais e parentes) tinham lembrado ou dado bola. Ao saberem disso, o Aranha e o Paulinho transformaram aquela noite em uma festa homérica. O cara era foda. Fomos num boteco (daqueles bem botecão que tem mesa de sinuca) e ele destruiu no jogo, parecendo ter saído de um conto do João Antônio. Esse foi apenas um dos vários lugares que entramos e saímos naquela noite que não tinha fim. E o cara tinha todos os tipos de amigos. Sentava-se num bar para beber com qualquer um: professor, colega, amigo, homem, mulher, gay, travesti, idoso, jovem, pai de família, morador de rua, rico, pobre, louco, negro, branco, japonês, enfim, bastava ter uma boca para conversar e beber e ouvido para ouvir que era amigo dele.
Não bastasse tudo isso, lembro-me como se fosse hoje de uma balada em que estávamos no Absoluto. Alguém gravou isso, pelo que recordo (acho que está no meu DVD de formatura), mas não sei que fim levou o vídeo. Tinha uma banda tocando e de repente chamaram o velho Aranha (que naquele tempo não era nada velho, pois tinha 20 e poucos anos) para subir no palco. Ele foi lá e matou a pau. Tocou alguma música do Charlie Brown e o povo delirou.
Ainda tenho aqui o livro de poesias que ele escreveu e me deu na mesa do bar, dizendo: “Esse livro, quando eu morrer e tu tiver velho e teu filho achar na estante e perguntar quem foi que escreveu, tu diz: esse foi um amigo maluco que o pai teve”. Ri pra caralho diante da afirmação, sem imaginar que ele partiria tão breve.
E o Aranha me influenciou (e influencia) por ter me ensinado em alguns anos de convivência a importância de coisas como: sonhar, partir, curtir, ser feliz, amar, ser poeta, mandar a merda o que não te faz feliz, ser viajante, não poupar risos, não se importar com o que os outros pensam, não dar bola para o preconceito e para as mentes pequenas, se inspirar nas pessoas de mente aberta e que são felizes. Além disso, ele foi o primeiro cara que conheci também lia Bukowski. Conversamos muito sobre o velho safado nas mesas de bar nos arredores da antiga Fidene/Unijuí.
Por isso, cada vez que alguma coisa boa acontece na minha vida, lembro-me dele. Foi assim quando me formei. Foi assim quando parti para Porto Alegre para entregar panfletos de dia e fazer estágio no esporte da Rádio Gaúcha de noite. Quando passei no mestrado (e não agia como um acadêmico sério, regrado e preocupado com o status da academia), quando entrei no doutorado para pesquisar um cara muito parecido com ele (Hunter Thompson), quando fui para Nova York, quando cruzei os Estados Unidos de Leste a Oeste de ônibus e de Oeste a Leste de carro. Quando sentei para beber e apostar nos cavalinhos em Las Vegas. Quando entrevistei a viúva do Thompson no Colorado. Quando fiz grandes amigos que têm o mesmo espírito livre dele – sem importar idade, cara, sexo ou religião. E quando descobri novamente por que a vida é bela. Por tudo isso bateu uma puta saudades do velho Aranha. Com certeza é um cara que ouviria todas essas e outras histórias numa mesa de bar já programando outras viagens, outras loucuras, outros sonhos, outras histórias para outros livros. E, quando eu falasse de meus problemas, ele simplesmente diria: “toma logo esse trago, manda o que não te faz bem à merda e fica com a parte boa do negócio”. Simples assim. Saudades do velho Aranha

sábado, 1 de abril de 2017

O beijo que não vem da boca II

Sempre é bom compartilhar o sentimento puro e alheio, então, aqui vai mais um texto do meu xará Fronza, irmão do velho Ronaldo Fronza Júnior. Para quem interessar possa, segue:

Eu não sabia o que era mais rápido: a velocidade da água da cachoeira que caía a uns 50 metros de altura ou a velocidade de meu coração. O cenário era perfeito e, desde que te vi naquele início de tarde, flutuando em minha direção para dar um educado beijo no rosto, eu percebi que aquele seria um dia inesquecível. Eu olhava para aquelas águas, que você dizia serem geladas, e não sabia se deixava a insanidade tomar conta de mim para dar um mergulho naquele líquido fluído que se movimentava tão rapidamente barranco abaixo, ou se criava coragem para te falar tudo o que eu sentia e tudo o que desejava. Mas a timidez, que vezemquando volta como acontecia quando eu entrava na adolescência, tomava conta de mim. Eu queria dizer que você estava linda, bela, magnífica, perfeita, que era tudo de bom que eu poderia sonhar, uma energia que faz a minha vida ficar mais rara e que coloca um sorriso gigantesco na minha cara, mas enfim, a única coisa que eu consegui dizer foi algo totalmente banal como: “essa água deve ser tão gelada quanto a da Califórnia”. E quanto mais eu tentava consertar, mais bobagens insignificantes eu falava, do tipo, “deve ser gelada por causa das geleiras do Polo Norte que derretem e vão para a costa oeste americana...”. Essa é a versão que ouvi dos moradores de Los Angeles, mas porra (sorry, but... você também gosta dum palavrão...), eu saquei que não estava indo para lugar nenhum falando isso...
Aquela era uma situação mágica: você completamente linda, em frente de uma singela paisagem, com o barulho das águas caindo ao fundo... E meu coração não me ajudando nem um pouco, apenas acelerando e me deixando mais sem jeito... Nem mesmo o fato de ter enfrentado parto de cinco filhos, de ter viajado pelo mundo, de ter trabalhado em jornais e rádios tendo que entrar ao vivo para falar sobre coisas que eu não tinha ideia do que significavam, de ter defendido TCC, dissertação e tese de doutorado e de pós-doutorado, de ter que enfrentar o pânico de avião viajando 12 horas até o norte dos Estados Unidos e ao oeste da China, de ter conhecido o fundo do poço e ter conseguido me reerguer sem saber como, de ter trabalhado como empacotador de supermercado e auxiliar de mecânico para ter o que comer, de já ter me apaixonado e me decepcionado mil vezes, de ter que falar em público sem ter o que dizer, enfim, nada que eu havia vivido até aquele momento se comparava com o que sentia diante de você, em frente àquela cachoeira. Não que o nervosismo tenha sido maior ou menor do que em outros momentos. Mas foi único. Eu estava ali, diante de uma bela paisagem, estando completamente apaixonado por você, falando um monte de bobagens simplesmente para evitar o apavorante silêncio... Foi então que um anjo, um santo, um cúpido, enfim, sei lá eu quem, chegou ao meu ouvido e disse: “vamos cara, se mexe, senão você vai deixar passar essa mulher magnífica, que pode ser a garota linda e doce que você tanto sonhou”. Então, olhando para o alto, observando aquela água caindo lá de cima, respirei fundo, e resolvi te encarar. Você baixou os olhos e eu perguntei se eu poderia ser sincero. Você disse que sim e, então, um breve diálogo aconteceu. E, depois de ouvir algo como “puta que pariu”, já tendo você em meus braços, finalmente nossos lábios se encontraram. Os sinos tocaram.
E eu percebi naquele momento, que aquele não era um beijo que vem da boca, como no romance do Ignácio Loyla Brandão. Aquele era um beijo que vinha do coração, da alma, das águas que seguiam caindo ao nosso lado. Aquele era um beijo que nunca mais seria apagado da memória, acontecesse o que acontecesse. Era um beijo ao mesmo tempo esperado e inesperado, aguardado e rejeitado, desejado e refutado, sonhado e conquistado. Foi um beijo orquestrado pelo som das águas, ritmado pelo batimento de nossos corações, sonhado pelas noites insones em que eu fiquei acordado pensando em ti. Ok, nem te perguntei se você concorda comigo, mas foi o que senti, não pela boca ou pelo cérebro, mas pelo coração. Um beijo insano e cheio de energia. Um beijo ditado pelo ritmo e pela beleza das águas da cachoeira, que nunca param de cair... assim como eu gostaria que nossos lábios nunca parassem de se encontrar... Foi muito bom. Foi mágico, inesquecível e indescritível. "Vou pedir, aos céus, você aqui comigo... vou jogar... no mar... flores pra te encontrar!". Foi musical e foi poético.