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sábado, 30 de agosto de 2014

Morte anunciada

Mimimimi - não escrevo mais - mimimimimi - preciso escrever - mimimimimi - estou gripado desde que cheguei ao Brasil - mimimimimi - preciso escrever a minha tese - mimimiimimimimi....

Ok, segue um texto novo que sairá semana que vem no J Missões, se o editor, Deus e o dono do jornal assim quiserem...



Nos anos 1990, o filósofo Pierre Bourdieu usou a TV para fazer uma crítica à própria televisão. Desse discurso, proferido em um canal francês, surgiu o livro “Sobre a televisão”. Agora eu, um mero jornalista e acadêmico missioneiro, em um jornal de Santo Ângelo, mas com uma veia megalomaníaca, uso o jornal impresso para fazer uma crítica ao jornalismo praticado pelos nossos jornais de papel. Essa autocrítica, na verdade, é comum quando feita em relação ao próprio jornal em que se escreve, sendo que, quem ocupa esse cargo é chamado de Ombudsman (Folha de SP, O Globo, e outros grandes contam com esse profissional). No entanto, não pretendo ser um Ombudsman no JM, apenas quero brincar um pouco com a filosofia de Bourdieu.
Em meio a tantas horas de viagens no cross-country que fiz pelos Estados Unidos, veio-me uma recordação à mente: Eu era professor da disciplina de Jornalismo Impresso do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL) e lembro que fiquei estarrecido diante da seguinte cena. Perguntei a uma turma de 40 estudantes:
- Quem aqui tem o hábito de ler jornal impresso?
Nada. Nem um minguinho apontado pro alto.
- Ok. Vou reformular a pergunta. Quantos de vocês pegam, pelo menos uma vez por semana, um jornal impresso nas mãos?
Dois ou três disseram que faziam isso, mas raramente. Porém, uma aluna foi mais ousada:
- Eu pego o jornal de vez em quando, mas porque meu pai assina. Por mim não precisava.
Na época tive a reação imediatista de um professor universitário de jornalismo: mas como??? Esses alunos estão malucos??? Como querem ser jornalistas sem ler JORNAL!!??! Mas depois, anos depois, no meio do deserto americano, quando já estava dirigindo há umas cinco horas e tinha mais outras cinco para dirigir no mesmo dia, refleti: será que são os alunos que estão errados ou é o jornalismo impresso praticado que está defasado? Ou será que ele está realmente condenado à morte? Lembrei-me do título do livro do Garcia Marquez: “Crônica de uma morte anunciada” – em que todos sabem que o assassinato vai ocorrer, mas seguem lendo o livro. E recordei ainda do livro do Umberto Eco “Não contem com o fim do livro”. Concordo com o Eco , o livro não vai morrer. Nem a revista. Mas e o jornal impresso? Tenho minhas dúvidas... Praticado do jeito que está, com uma pilha de releases sendo impressas em papel de enrolar peixe, com matérias acríticas, com textos meramente informativos – que podem ser lidos em milhares de sites – o jornalismo diário impresso assina a sua sentença de morte. E por que eu escrevo aqui? Possivelmente porque sou da geração que está mais para o lado dos pais dos meus alunos, do que para a geração dos meus alunos... Sou dinossauro. Não vou viver para presenciar essa morte, afinal, enquanto nós, dinossauros, ainda respirarmos, o jornalismo impresso terá o seu lugar na nossa escrivaninha... Porém, só até enquanto respirarmos...