Lucky Jim
(ALERTA! CONTÉM SPOILER)
Meu filho
achou que eu havia enlouquecido quando me pegou na sala ouvindo música
clássica, tomando um vinho e lendo Lucky Jim. “É para me sentir no
interior da Inglaterra dos anos 1950”, expliquei. Ele não entendeu nada e
continuou achando que eu tinha pirado. De qualquer forma, achei Lucky Jim,
do escritor britânico Kingsley Amis (1922–1995), um excelente e autenticamente
britânico livro. Descobri a obra em uma lista divulgada por um escritor no Instagram
do Estadão, em celebração ao Dia do Leitor. Li a sinopse, gostei e
comprei. Não me arrependi.
Para falar
do enredo, é preciso entender os personagens. O principal é Jim Dixon, um
professor universitário em uma pequena cidade do interior da Inglaterra. Como
está em uma espécie de estágio probatório, ele precisa agradar a todos,
especialmente ao professor Welch, um senhor que, indiretamente, dá a entender
que está começando a apresentar sintomas de demência. Dixon, contudo, mesmo
atrapalhado, tenta de tudo para agradar ao chefe — que, no fundo, ele odeia.
Ao longo da
história, Dixon se envolve, meio sem querer, com Margaret, outra professora que
tentou cometer suicídio após romper com um namorado e que Welch leva para sua
casa para que seja bem cuidada. No entanto, logo Dixon percebe que ela é
extremamente geniosa — com sintomas de bipolaridade aguda — e, mesmo tentando
agradá-la de todas as formas, sempre acaba se dando mal. A mulher de Welch é
aquela típica senhora inglesa, estilo sargentona, que manda no marido e tenta
manter tudo sob controle. É nesse cenário que surge o filho do casal, Bertrand,
um pintor barbudo e mulherengo, que namora Christine, mas mantém um caso com
Carol, colega de Dixon e também professora, casada com outro personagem.
Resumindo:
o enredo todo se passa no ambiente universitário, com várias intrigas e
mesquinharias cômicas que eu, como professor, obviamente achei o máximo. Na
edição da Todavia que comprei, porém, há um erro na sinopse: diz que Dixon
tenta conquistar Margaret. Na verdade, não. Ele é amigo dela, enquanto ela
acredita que são um casal. Dixon passa a maior parte do tempo tentando desfazer
esse mal-entendido para manter apenas a amizade, mas não consegue.
Romanticamente, ele acaba se envolvendo com Christine, a namorada de Bertrand,
com quem desenvolve uma acirrada rivalidade que culmina em uma briga física
antes da grande palestra — já no final do livro — que definiria o futuro de
Dixon na universidade. Bertrand, por sua vez, nem gosta tanto da namorada, mas
quer ficar com ela para conseguir um emprego através do tio dela, que (atenção
ao spoiler!) acaba contratando Dixon após este fazer uma palestra
horrorosa sobre Happy England e não ser efetivado pela universidade.
Mas, para o
leitor entender o estilo de Kingsley, quando disse que é autenticamente
britânico, coloco abaixo um trecho de uma cena cômica. Dixon havia sido
convidado (e ido por obrigação) em um evento cultural promovido por Welch na
sua residência, que ficava em uma região mais afastada da cidade e que, assim, fez
com que os convidados pernoitassem na sua amplíssima mansão. Acontece que
Dixon tomou um porre e adormeceu em sua cama, mas como o cigarro estava aceso,
acabou queimando parte da colha e da mobília do quarto. Contudo, ao acordar,
ele não lembrava de nada. Ao contrário de um estilo cru e bukowskiano, Kingsley
adota o que chamei anteriormente de um estilo autenticamente britânico, quase
formal, para descrever a cena cômica:
“Ele próprio
teria feito tudo aquilo? Ou um viajante, um ladrão, acampara em seu quarto? Ou
fora vítima de algum ser estranho como o Horla de Maupassant, apreciador de
tabaco? Pensou que, de modo geral, devia ser mesmo o responsável por tudo, e
desejou que não fosse assim. Certamente isso significaria a perda do emprego,
em particulares deixasse de procurar a sra. Welch e confessasse o malfeito
sabendo de antemão que seria incapaz de fazê-lo. Não havia desculpa que não
consistisse no indesculpável: um incendiário não merecia mais perdão quando se
soubesse que era também um bêbado – e tão viciado que suas obrigações para com
os anfitriões e os outros convidados, sem falar na atração de um concerto de
câmara, nada representava comparadas à tentação da bebida” (p.79).
Aliás, foi
após esse incidente que Dixon começa a se aproximar da namorada de Bertrand,
que o ajuda a se safar dessa. Mais adiante, também há um baile que reúne toda a
comunidade universitária – incluindo a família Welch e Dixon – que ocupa boa
parte da trama e que acaba por aproximar ainda mais Dixon e Catharine.
Enfim, encerro aqui esse pequeno resumo pessoal para que, no futuro, quando eu quiser relembrar a história desse livro, eu possa consultar e ler tal sinopse novamente tomando um vinho e ouvindo música clássica para me aproximar um pouco mais do romântico e charmoso interior da Inglaterra dos anos 1950.
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