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sábado, 29 de janeiro de 2022

Sobre férias, praia, livros e filmes

 


Estou de férias em Xangri-lá, na casa dos meus pais. Aliás, esse tem sido o destino das minhas férias nos últimos cinco ou seis anos. Sou um semimorador de Xangri-lá, pois fico por aqui mais ou menos uns dois meses por ano. Essa é uma praia tranquila, colada em Capão da Canoa, a casa no litoral de muitos porto-alegrenses. Eu me implico com eles, os porto-alegrenses. No geral, eles chegam aqui e pensam que estão lá: não respeitam faixa de segurança, sinais de trânsito, filas preferenciais nos mercados e tudo o mais o que eles fazem na caótica e suja capital dos gaúchos. Acabo resmungando: por que não ficam por lá, diabedo? Esses dias fiz essa pergunta e minha pequena disse: mas tu também não mora aqui! Eu respondi, de bate pronto, que sou um semimorador, pois meus pais moram e eu fico 15% dos 12 meses do ano por estas bandas. Durante as férias, todos os dias possíveis eu corro/caminho na praia por cerca de duas horas. Esses dias fui correndo daqui, de Xangri-lá, até a frente da casa do meu amigo, escritor e médico Sérgio Stangler (aquele mesmo que previu a minha morte e que tem os originais inéditos do meu grande romance), perto do farol, em Araçá. Fui pesquisar no Google e descobri que percorri – entre ida e volta – mais de 10 quilômetros. Tu vês.

Também tenho aproveitado as férias para ler e ver filmes. Depois do livro do Jorge Amado, comentado por aqui no penúltimo post, eu li “O sol é para todos”, da Harper Lee. Um livro singelo, com uma história simples sobre o cotidiano da família de um advogado que é contratado para defender um homem negro acusado de estupro nos Estados Unidos segregacionista do início do século XX. Não vou dar detalhes, mas a escrita da autora nessa obra me fez lembrar alguns livros da primeira fase do Erico Verissimo, como “Olhai os lírios do campo” ou “O resto é silêncio”. Terminado o livro, fui procurar o filme, que ganhou o Oscar de melhor roteiro adaptado de 1963. Confesso que foi uma das melhores adaptações de livros para o cinema que já vi.

Não vou lembrar de todos os filmes que vi nesses dias. Destaco, positivamente, “The rescue” (O resgate), um documentário que trata do milagroso salvamento do time infantil de futebol que ficou dias preso em uma caverna alagada na Tailândia, em 2018. Vale muito a pena e, creio eu, deva disputar o próximo Oscar da categoria. Negativamente aponto “Faroeste Caboclo”, a adaptação da música do Legião Urbana. Fui ver na expectativa de ver o João de Santo Cristo roubar as velhinhas no altar, comer todas as menininhas da cidade e gastar todo o seu dinheiro de rapaz trabalhador na zona, mas nada disso acontece. Além disso, o pobre João só leva no cu (literalmente) durante o filme, mudaram a ordem dos acontecimentos e suprimiram as partes em que ele se dá relativamente bem. Pobre João. Uma injustiça. O resultado foi um filme decepcionante para quem, como eu, ouve o clássico de Renato Russo desde os 10 anos (três décadas curtindo esse som).

Voltando para a literatura, dia desses li “Todo o dia a mesma noite”, um puta livro-reportagem da jornalista Daniela Arbex sobre a tragédia da boate Kiss. Nessa semana ouvi na rádia que estão fazendo uma série na Netflix baseada na obra, que é dramática, emocionante, triste e revoltante. Também não darei “spoiler”. Paralelamente a tudo isso, estou lendo um livro técnico de quase 600 páginas: Mercado de Capitais, do professor da UFMG, Juliano Pinheiro. Um livro didático e excelente para se alfabetizar minimente sobre finanças. Ainda vou escrever mais sobre isso em breve, se a previsão do Stangler não se concretizar. E, por fim, estou na metade da biografia do Lula, obra de Fernando Morais, que dei de presente de Natal para o meu pai. Sobre ela talvez, se estiver inspirado, vou falar mais futuramente. Ah, e obviamente, se a previsão do Stangler falhar. Aliás, falando em morte, um dia talvez eu escreva um texto sobre o picareta Olavo de Carvalho, que voltou para o inferno há pouco. Mas não posso garantir, pois creio que ele não é digno da minha atenção. Se for, vai um texto para divertir o cruel, diabólico e insaciável leitor.

Bueno, chegou a hora da minha corrida/caminhada pela praia. Se eu não voltar nos próximos meses é porque o Stangler acertou e, talvez, ficou rico.

Hasta!

terça-feira, 4 de janeiro de 2022

A morte da assinatura de um assinante morto

 



            Cancelei a minha assinatura do jornal Dário Popular. Hoje. Está certo, atento leitor, eu sou colunista do Diário Popular, aqui de Pelotas. E, não se espante: sim, como colunista, se eu quiser ter acesso ao jornal, eu tenho que assiná-lo, pagando integralmente a anuidade ou a mensalidade. E vou morrer. Segundo o meu amigo, escritor e médico Sérgio Stangler, eu vou morrer em breve. Para a sorte do Sérgio, talvez ele fique rico por dois motivos: um, ele vai ter acertado a premonição e, portanto, vai poder além de ser médico dizer que é algo como Pai de Santo ou vidente; e, dois, eu tenho um livro escrito, o melhor que já produzi (de todos os quatro) que está nas mãos dele, pois não encontrei nenhuma puta editora que tope publicá-lo me pagando um mínimo percentual das vendas. Assim, pedi para que, quando eu morrer, ele fique responsável de publicar todas as bobagens que são doidas demais para não serem compartilhadas com humanidade. E, na cabecinha dele, isso deve ter algum valor monetário (algo que eu não acredito muito em um país como o Brasil). Mas tudo bem, cadum, cadum.

            E o que uma coisa tem a ver com a outra??? Ora, muito fácil. Primeiro vou explicar os motivos do meu cancelamento da assinatura. Creio que, assim, rapidamente o astuto leitor vai ligar uma coisa com a outra. A minha assinatura semestral venceu dia desses. Veio a cobrança e eu não paguei. Assim, imaginei que parassem de enviar o jornal. A minha ideia era parar com a assinatura no último mês de 2021, pois fico até metade de fevereiro de 2022 fora de Pelotas, assim, voltaria a assinar quando voltasse, normalmente, tudo na paz do Nosso Senhor. No entanto, a cobradora do jornal veio me cobrar. Disse que eu devia para o jornal. Eu quis saber como ãnsim (?!), como perguntam lá nas missões. Ela explicou que eu não havia pago o boleto que tinham me enviado. Então eu expliquei toda essa história da viagem e tals. Ela cagou pra mim e disse que eu não podia fazer isso, pois teria que pagar pelos jornais que recebi, em um tom que me senti um vigarista, um Zeca Urubu, um caloteiro que queria ficar rico dando golpes em inocentes jornais do interior gaúcho. Tentei dizer que eu era assinante e colunista, que eu só queria negociar o troço todo, mas ela cagou pra mim e ponto. Para ela, o negócio se resumia a: VOCÊ DEVE, VOCÊ PAGA! That’s it.

            Achei tudo meio estranho. Estou fazendo um curso de finanças e, além do que já havia estudado sobre administração durante o próprio curso de Jornalismo, eu havia aprendido que as empresas não sobrevivem sem cientes. E um leitor de um jornal, para uma empresa jornalística, é um cliente. Se são 20 mil assinantes, são 20 mil clientes, e se tratar todos assim durante muito tempo, cedo ou tarde a casa cai, mesmo que leve gerações. Então, lembrei de todos os lugares em que trabalhei e que convivi com funcionários que cagavam pra todo mundo. Pensei: “essa é um desses tipos”. Contatei instâncias superiores e obtive o mesmo resultado: cagaram pra mim novamente. Bueno, diante disso, só vi uma solução: cancelar a assinatura para toda a eternidade.

            Entenderam a relação disso com a minha morte?? Não?!?! Está bem, vou desenhar para o burrinho leitor compreender. Imaginemos que eu mantivesse a assinatura do Diário Popular. E, uma semana depois, a premonição do Sérgio Stangler se confirmasse e eu batesse as botas. Eles continuariam com todos os meus dados e seguiriam enviando o jornal para o meu endereço. Tentariam me cobrar no celular, no e-mail, enviariam mil boletos para lotar a caixinha de correspondência, que chegaria para futuros inquilinos desse apartamento e que as colocariam no lixo sem abrir. Eu, como estaria mortinho da Silva, não responderia às mensagens de whatts nem aos e-mails. A cobradora rapidamente concluiria que eu havia sumido para dar golpes em outras cidades interioranas no meu plano de enriquecer rapidamente. Assim, as cobranças viriam e viriam e viriam e viriam até que depois de, sei lá, alguns anos, alguém lá no jornal diria, com ar de Sherlock Holmes:

- Hei! Esse tal de Eduardo Ritter está recebendo o nosso jornal há décadas e nunca nos paga!!! Vamos pegar ele!!!

            Nesse período, a senhora patroa seria viúva e minha filha estaria formada, trabalhando, quando numa bela tarde de sol aparece um sujeito engravatado para entregar uma cobrança judicial. A viúva abriria o papelzinho e cairia dura para todo o sempre ao ver as cifras da cobrança. E minha pobre filha, teria que trabalhar arduamente durante anos e anos para pagar a dívida do velho pai morto, que não quis cancelar a assinatura do jornal que cobra infinitamente aos seus assinantes enquanto eles não procurarem o jornal para efetuar o cancelamento.

            Entenderam agora? Ah, e vocês também devem estar se perguntando: Bueno, o Stangler é um médico conceituado. Ora, se ele dissesse que eu iria morrer, eu procuraria todos os médicos para fazer todos os exames possíveis para evitar a minha partida para ao além. Mas calma, apressado e angustiado leitor. Os motivos não são um câncer ou veias entupidas, gases ou excesso de hemorroidas. Não. Segundo ele, eu vou morrer por causa da neblina que apareceu lá em Araçá, do lado de Capão, e por causa de uma toninha desfalecida encontrada na areia. E, para confirmar, teve o quero-quero que morreu do coração lá nas dunas enquanto perseguia a cadela dele. Eis a frase, ipsis litteris: “De tantos presságios, não pude evitar de entender o que me estava sendo avisado pelos céus: o Eduardo Ritter vai morrer!”. Bueno, diante disso, me sinto mais aliviado em ter encerrado a assinatura do Diário Popular.

Hasta o além!