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terça-feira, 7 de setembro de 2021

Exército de um Dudu só

 


            Esse é um texto que gostaria de escrever bêbado, mas não posso, pois amanhã tomo a segunda dose da vacina contra a Covid. É um texto que poderia ser triste, porém creio que não vai ser o caso. É um texto sobre como eu, conhecido em alguns ciclos como Dudu, fiquei complemente sozinho em relação ao meu exército de anos atrás, mais especificamente, do final do século XX. Como fui totalmente abandonado pelos meus ingratos e desgraçados soldados. Não fui um bom comandante e perdi o posto para o capitão golpista. Vou tentar explicar.

            Tive uma infância e adolescência perfeitas em relação a amizades. Nunca sofri bullying, sempre tive uma porrada de amigos, desses que frequentavam a minha casa em Santo Ângelo. Às vezes tinha alguns que até lá posavam. Como meu pai era o único sócio da AABB da cidade, eu agendava jogos no campo de futebol sete e escalava os que jogavam. Vezemquando a lista passava dos 30 nomes. Sentia-me o técnico da seleção: tinha que fazer cortes. Os critérios não eram técnicos, era amizade e afinidade. E, dentre os selecionados, eu ainda escolhia os que ganhariam carona no carro do pai. Chegamos a colocar dois no banco do carona e mais cinco atrás. Oito, com o pai, que também jogava. Mais que um time sete. Chegando lá, não raras vezes havia mais de dezena de bicicletas. Fazíamos três, quatro times, e o horário de uma hora virava duas, três, cinco, oito! O tiozinho, gente fina, sempre deixava. Como aqueles campos eram desconhecidos na cidade (e era dos melhores!) essa era uma barbada nossa. E, como disse, eu era uma espécie de comandante: o dono da bola e do campinho. Porém, modéstia parte, jogava bem.... Era um dos melhores.

            No colégio, durante o Ensino Médio, nossa turma sempre teve uma média de dez a quinze alunos do sexo masculino. Não tinha internet, não tinha Orkut, quiçá Facebook. Tinha o telefone, que era o instrumento usado para agendar os jogos. E tinha, obviamente, as conversas pessoais, as idas de uns na casa dos outros, as festas, etc. Em 2001 entrei na faculdade e aos poucos fui perdendo contato com toda essa turma de Santo Ângelo. A sensação que tenho é que se quisesse, pegava o telefone e reuniria todo mundo no campinho da AABB de Santo Ângelo (agora pagando a hora, óbvio). Apareceu o Orkut e vez ou outra aparecia alguém daquela turma como amigo. Alguns até viravam contato no MSN. O tempo passou, e chegou o Facebook. Creio que cerca de 60% daquela turma apareceu em algum momento como amigo. No entanto, vieram as eleições de 2018 e boa parte se perdeu ali. E agora, em 2021, depois de todos os motivos que todos sabem (vou ficar apenas no incentivo ao não uso de máscara e de distanciamento em um cenário com quase 600 mil mortes) se foi mais uma leva. A leva final. Em resumo, fiquei sozinho. Se hoje for para Santo Ângelo, não tenho ninguém para ligar para conversar. Ou melhor, não tenho vontade de procurar ninguém daquele tempo. O que foi bom, foi bom, mas ficou lá, no passado. De todos os meus colegas de Ensino Médio, até onde sei, apenas eu (EU num universo de 20 a 25 guris) não votei e não apoio o capitão. Perdi todos os meus soldados para ele. Não sobrou um. Só eu. Talvez, dentre toda aquela turma do futebol da AABB ainda haja um ou outro que não compactua com a barbárie (mortes, inflação, guerra contra a democracia, etc) que está aí, patrocinada pelo líder oficial da nação. No entanto, não se manifestam nesse sentido publicamente, o que me faz desconfiar que também abandonaram o meu barco e ficaram no do capitão.

            Para não cometer injustiças, há dois daquele tempo que desconfio que compartilham a minha perspectiva, mas não vou mencionar nomes, pois não tenho certeza. Sei que recentemente houve baixas frustrantes e inesperadas. Quando eu falei que não queria contato com quem apoia um governo responsável por tantas mortes, não estava brincando. Vivendo num estado como o Rio Grande do Sul, cada vez mais me apego ao estilo antissocial e niilista do velho Buk: prefiro ficar sozinho, com meus livros e minha cerveja. Porém, para a minha sorte, depois daquela fase “das antigas” vieram muitos outros amigos e amigas. Para ficar com eles, topo largar os livros, abrir umas e celebrar a vida juntos! Todos vacinados. Todos a favor da democracia. Somos poucos, mas estamos unidos.

            Hasta!