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quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Scliar, Quixote e outros causos

Como a leitura dos livros do Bukowski funcionam mais como uma terapia do que qualquer outra coisa, vou lendo-os lentamente. Como comentei aqui outro dia, estou lendo Mulheres. Além de Mulheres, o único que eu tenho conhecimento de que foi publicado em português e que eu não li ainda é o Cartas na Rua. Um clássico, por sinal, que pretendo adquirir na próxima Feira do Livro de Porto Alegre. Por essas e por outras, vou lendo os livros do velho Buk lentamente, pois se os termino rapidamente, não terei de onde fazer essa terapia bukowskiana que funciona mais ou menos assim: quando você está estressado, seja por motivos de trabalho ou de mulheres, você lê os textos do Buk abre uma latinha de cerveja e simplesmente relaxa enquanto o mundo desaba ao seu lado.
Enfim, como percebi que minha leitura do Mulheres estava muito acelerada, resolvi começar a ler outro livro paralelamente para desacelerar o bagulho. E a opção que fiz foi por Exército de um Homem Só, do Scliar. Comecei hoje, cheguei recém na página 27, mas estou gostando muito. Confesso que tinha essa dívida com o Scliar, pois esse é um dos livros que o consagrou e que eu ainda não tinha lido. Por enquanto, pelo que estou percebendo, a história se trata de um Dom Quixote-judaíco-comunista. Ou daria ainda para interpretar como uma crítica à idéia comunista de igualdade para todos, etecétera e tal, pois o personagem foi criado claramente com forte inspiração quixotesca. E aí eu sugiro outra leitura, tanto para quem já leu o livro do Scliar, quanto para quem pensa em ler algum dia: o próprio Dom Quixote, de Miguel de Cervantes. Enfim, você pode adaptar o Dom Quixote para várias situações. No caso, o Scliar adaptou a um comunista judeu, se é que estou entendendo bem a obra, já que li as 27 páginas até agora entre choros e bagunças da Lari, que volta e meia tenta tirar os livros de minhas mãos para colocar na boca ou amassar. Mas, a história de Cervantes também pode ser adaptada, por exemplo, para o torcedor gremista que acredita piamente que o Grêmio um dia voltará a ser um grande campeão ou ainda a um militante de algum partido pequeno que crê que a sua sigla ainda terá um grande líder revolucionário que entrará para a história, ou algum maluco que acredita que um dia não haverá corrupção no Brasil. Ou seja, Dom Quixote é uma fonte inesgotável de inspiração, tanto é que o personagem de Cervantes já é, por si só, um exército de um homem só. Entretanto, esse exército solitário ganha um simpatizante: Sancho Pança, que o segue apenas porque Dom Quixote lhe promete uma ilha para governar quando derrotar seus inimigos (que só existem na imaginação do fidalgo maluco).
Bom, o fato é que a leitura do Exército de um Homem Só está sendo muito prazerosa e também indico a todos. Vou parando por aqui, pois a Lari está embaixo da mesa do computador com uma caixa cheia de papéis bagunçando tudo e querendo comer metade da papelada.

sábado, 27 de agosto de 2011

Nova teoria duduziana


Os anos que correm e a experiência acumulada muitas vezes nos ajudam, mas outras vezes nos desolam. Fico pensando nisso agora, com a casa dos 30 chegando perto. Inclusive, antes de entrar no assunto principal desse texto, quero ressaltar aqui que me identifiquei em grande parte com o Satolep, do Vitor Ramil, porque o personagem volta para a cidade fictícia, que como já disse, é a representação de Pelotas, para passar a virada dos 29 para os 30 anos de idade. Ou seja, como estou prestes a chegar aos 30 e estou morando em Pelotas, não teria como não me identificar com essa obra.
Mas, como dizia, a experiência sempre é boa, só que fico pensando que seria melhor se eu a tivesse quando era mais novo (algo completamente contraditório e irrealizável). Por exemplo, pensando sobre a vida, concluo que se anos atrás eu soubesse tudo o que sei sobre as mulheres (que, confesso, não é lá grande coisa), eu teria tido melhor sorte em muitas das tantas baladas que fui com o intuito de caçar. Pensei sobre isso esses dias, quando passei em frente a Universidade Católica de Pelotas (UCPel) e aqueles barezinhos todos estavam fervilhando com estudantes e, em frente à uma casa noturna, tinha um grupo de gurias, e, dentre essas gurias, tinha uma loira que era A LOIRA, com um short curto, bem arrumada, tudo no lugar e coisa e tal. Ela dançava alegremente na calçada, como se estivesse dançando sozinha em seu quarto. E ela era nova, muito nova (pelo menos pra mim). Tinha uns 17, no máximo 18 anos... Então, nobre leitor, é aí que está! Vocês se ligaram na associação do “dançando como se estivesse sozinha no quarto” com a parada da idade?!?! Pois é. Foi então que me dei conta da teoria, que na verdade é óbvia.
Acompanhem o meu raciocínio. Essas guriazinhas que começam a sair nas baladas, foram se criando psicologicamente e se formando fisicamente dentro de casa, assistindo a filmes bestas, novelas idiotas e seriados de todos os tipos. Então, quando elas saem para a noite, elas saem pensando em viver o que elas viram nos filmes bestas, nas novelas idiotas e seriados. Ou seja, no imaginário delas, os caras que elas devem ficar devem ser bem arrumados, bonitos, de preferência ricos e com carro, exatamente como os galãs dos filmes bestas, dos seriados e das novelas idiotas. Então, nessas primeiras saídas delas, um cara como eu, como você, que lê esse blog, não terá nenhuma chance com elas, por dois motivos: primeiro, muito dificilmente você se enquadrará no tipo de homem perfeito do imaginário dela, por mais que você se julgue rico e bonito. E, segundo, por desconfiança e orientação dos outros, afinal, o pessoal mais velho, que gosta dela, e que sabe que ela é linda, já vai orientar, antes das primeiras noitadas: na noite os caras chegam de tudo quanto é jeito, sóbrio, bêbado, caindo de bêbado, enfim, mas não dê bola para nenhum e não poupe em dar fora sendo curta e grossa. E, por esse motivo, muitas gurias viram a cara quando você pretende simplesmente se apresentar ou convidar para dançar.
Complementando minha teoria, geralmente essas gurias começam a ficar mais acessíveis depois de terem levado muita porrada psicológica em relacionamentos frustrados e de terem se decepcionado muito com os tipinhos que batiam com o perfil do seu imaginário. Ou seja, elas percebem, aos poucos, que o sarado, rico e playboy geralmente têm um cérebro do tamanho de uma amêndoa e só sabe falar de carro e outras banalidades. Então, é aí que você, nobre e astuto leitor, passa a ter chances de se consagrar, pois, quando ela chega nesse estágio, ela te olha e pensa “ei, esse pode ser o cara que estou procurando”. E, então, ela pode te dar uma chance, se você não for muito burro e idiota (do tipo, chegar bêbado se gabando para ela que você isso, que você aquilo)...
Enfim, mas eu não sabia de nada disso no tempo em que eu saia (sic!). Por isso me lamento de ter feito tais descobertas tarde demais. Fica a dica para quem ainda está na caça (ou está começando a correr atrás do troço).
Uma boa caçada e um bom Grenal a todos.
PS: apesar de usar termos como “caça” e “pegar” eu não sou machista, afinal, elas também usam esses termos...

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Favoritismo vermelho

Mais do que nunca, o Inter é favorito para o Gre-Nal de amanhã. Tem mais time, vive momento melhor, tem melhores jogadores, tem mais técnico e tem mais títulos que o seu arquirival. Antes estava tudo tecnicamente empatado, mas agora o Inter fez 2 a 1 no placar de Recopas conquistadas. O Grêmio ainda tem mais Copa do Brasil, mas o Inter tem mais campeonatos brasileiros. Portanto, essa Recopa fez com que, na disputa por quem tem mais títulos, o Inter abrisse uma Sul-Americana e uma Recopa de vantagem. E, por essas e por outras, mesmo sem Guiñazu e, talvez, sem D’Alessandro, o Inter entra como ultra-favorito no Gre-Nal de amanhã como poucas vezes se viu na história do clássico.
Torcer para o Grêmio amanhã é sofrimento certo. Mesmo com a chegada de Roth, o time do Grêmio segue desorganizado, com um monte de maluco correndo, cada um para um lado diferente, fazendo com que os torcedores se desesperem a cada jogo. Já no Inter, o Leandro Damião só falta fazer gol de bunda. De resto, ele já fez todo o tipo de gol. Ou seja, o Inter é melhor e vive uma fase ótima, com uma conquista de título recente, enquanto o Grêmio segue em crise, sem títulos, e com um time medíocre. O Grêmio talvez ainda se safe porque em clássico tudo pode acontecer e porque o jogo é no Olímpico. Mas, ainda acho esses dois pontos insuficientes para combater o favoritismo colorado.
ANALISTA TRICOLOR – Para superar minha depressão futebolística, cogitei seriamente em procurar um analista, quem sabe o de Bagé, do Luis Fernando Verissimo. Até já consigo antever o meu encontro com o seu dotô:
Entro na sala, e ele me diz:
- Te senta no pelego, índio velho, que tem um monte de louco esperando ali fora.
Sento.
- Mas o que se passa, índio velho, desembucha?!
- É meu time, dotô. Ele não ganha mais nada há anos... E pior, o outro time, o rival, ganha tudo e tem um baita time, enquanto o meu não desanda dotô...
- Tchê, já tentaste não acompanhar mais futebol, ou trocar de esporte, passar para o vôlei, basquete, futebol americano, rugby....?
- Não dotô. Eu não consigo. Não sei nem as regras desses esportes.
- Você acha que a dor que sente vendo teu time perder tudo e o outro time ganhar tudo é a pior dor do mundo?
Penso por um instante, e respondo, meio gaguejando:
- A-acho.
- Levante-se, índio velho! – ordena do dotô. Levanto. O dotô se aproxima e diz:
- Aposto que não é pior do que isso – pow!
E me da um joealhaço no saco... Saio me arrastando do consultório e ainda ouço ele gritar:
- Próximo!
Um bom fim de semana a todos. Sem joelhaço no saco nem derrota no Gre-Nal...

*Texto publicado no J Missões deste sábado

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Grandeza espiritual

“Amai o seu inimigo como a você mesmo“. Fico pensando hoje, anos depois de ter ouvido essa frase bíblica pela primeira vez, na dificuldade implicada na concretização dessa atitude no nosso cotidiano, afinal, essa é uma ação teoricamente tão simples. E também fico pensando como praticamente ninguém põe em pratica esse conselho religioso, que é um dos mais válidos e que mais traz paz interior.
Você, aí do outro lado do jornal, já pensou ou já tentou alguma vez fazer isso? Mas não digo no sentido de perdoar da boca para fora, mas sim, me refiro a parte prática do negócio, que envolve o seu interior, o seu espírito, a sua alma, ou seja lá como você quiser chamar isso tudo. Realmente perdoar aqueles que te magoaram com as maiores atrocidades desumanas que se possam imaginar, aquelas atrocidades que seriam condenadas por qualquer júri popular, não é para qualquer um.
Eu, particularmente estou há um bom tempo tentando lidar com isso, mas, cada vez que estou prestes a perdoar todas as atrocidades que certas pessoas cometem (principalmente quando envolvem crianças) eu tenho simplesmente vontade de esganar essas pessoas. E quando digo esganar, não é uma esganação simples, mas uma esganação tortuosa e psicopática, ao estilo filme Cães de Aluguel. Para você ter uma noção do filme, quando o torturador fica a sós com a vítima ele fala: “Os outros estavam te torturando para você contar. Mas comigo não faz a menor diferença se você vai falar ou não, porque vou te torturar por puro prazer“. Pois é, tem pessoas que às vezes fazem com que eu entenda a cabeça dos loucos de raiva homicidas. E aí que entra a dificuldade de colocarmos em prática o “amai o seu inimigo“. Pois, uma criatura para ser considerada sua inimiga tem que ser completamente oposta de você em todos os sentidos, e, além disso, também tem que tomar atitudes para te prejudicar, ou seja, tem que ser muito, mas muito irritante e impertinente. E mais: para alguém seguir querendo te prejudicar, mesmo quando você está a mil quilômetros de distância, a vontade que você tem, quando o sangue ferve, é de você ir a pé até onde essa pessoa está e aplicar uma Dama de Ferro (quem quiser saber mais, consulte o Mr. Google) sem dó nem piedade.
Pois é, amigos. Mas o crescimento do espírito está justamente ligado a superação dessa barreira, desse sentimento dominado pela emoção. A grandeza do espírito está ligada justamente à razão (e como esperar razão de pessoas irracionais?). E, nesse sentido, lembro do livro e do filme Nosso Lar, quando o espírito de André Luiz, psicografado por Chico Xavier, narra sua visita feita à sua família, anos depois da sua morte. Ele encontra a sua esposa casada e com novos filhos e descobre que o atual marido proibiu os filhos do próprio André Luiz de mencionar o nome do pai dentro da casa que um dia foi sua. E, mesmo tendo uma série de motivos compreensíveis para ficar com raiva e querer prejudicar o atual marido de sua ex-esposa, ele o ajuda a escapar da morte. Ou seja, ele tinha todos os ingredientes e justificativas necessários para ter feito “justiça“, mas, ao invés de ter ficado apenas observando a morte do rival, ele resolveu ajudá-lo. Quem realmente faria isso no lugar de André Luiz? Praticamente ninguém. E mais: tudo ocorreu rapidamente, ou seja, no calor dos acontecimentos ele não usou a desculpa do “estava com a cabeça quente“.
Enfim, tendo de um lado a versão Cães de Aluguel e de outro a de André Luiz, hoje, chegando na casa dos 30, estou ficando mais com a versão do André Luiz, pois, estou concluindo, cada dia mais, que a única coisa que levamos dessa vida é a grandeza espiritual. O resto é resto e deixemos o resto para as pessoas irracionais.

* Texto publicado em A Tribuna Regional.

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Andando em círculos

Terminei de ler Satolep. Um belo romance com linguagem poética. Entretanto, no momento estou mais num clima realista do estilo nu e cru. E nada melhor do que um livro do Bukowski para, enquanto ler, sentir-se como se estivesse conversando com o melhor amigo tomando uma cerveja ou um destilado qualquer. Aliás, no Mulheres, nome do livro, ele vai contando histórias de romances e pequenos casos em que ele se meteu, sempre com a mesma ladainha de 99% dos relacionamentos: início só Love e sexo, depois tédio com angústia e, por fim, encheção de saco e brigas até se chegar ao nível da separação. É a lei da natureza. E, em cima dessa ladainha toda, compositores escrevem músicas, seja rock, sertanejo ou pagode, cineastas fazem filmes, escritores escrevem livros, espertos gananciosos escrevem novelas clichês que quem está envolvido nessa porra toda adora ver e por aí vai...
Só que o que diferencia o velho Buk dos demais é a crueza das atitudes e sentimentos do seu personagem autobiográfico, Henry Chinaski. Vejam só que genial o seguinte trecho, em que Chinaski conversa com sua pseudo-namorada, na cama, enquanto ela lhe espreme as espinhas das costas :

- Uau, tem um ótimo aqui! Cuspiu pra fora! Me certou no olho!
- Você devia usar máscara de mergulho.


Agora vejam como, na sequência do diálogo, aproveitando o clima de descontração do casal, ela vai direto ao ponto:

- Vamos fazer um Henryzinho! Pensa nisso: um Henryzinho Chinski!

E, enquanto a mulher esperava que o velho Buk de repente dissesse “claro, baby, é pra já, afinal, eu te amo e vamos trepar gostoso“, ele simplesmente responde, com toda a sinceridade:

- Vamos esperar um pouco;
- Eu quero um baby agora!
- Vamos esperar.


Diante da negativa, a mulher faz o que todas fazem diante de uma negativa de seus respectivos machos (seja ele marido, namorado, noivo, amante, etc): enchem a porra do saco.

- Você só quer saber de dormir e comer e ficar largadão e trepar. A gente parece lesma. É o próprio amor de lesma.
- Eu gosto.


E, na sequência da encheção de saco, elas sempre gostam de dizer que você mudou e aquela baboseira toda:

- Você costumava vir escrever aqui. Se ocupava. Trazia tinta e fazia seus desenhos. Agora você vai pra casa e faz as coisas interessantes lá. Você só vem comer e dormir aqui, e daí vai embora logo de manhã. É chato, pô.
- Eu gosto.
- A gente não vai a nenhuma festa há meses! Eu gosto de ver gente! Tô de saco cheio! Acho que vou enlouquecer de tanto saco cheio! Quero fazer coisas! Quero DANÇAR! Quero viver!
- Ai, meu saco.
- Você tá velho demais. Só quer saber de ficar sentado criticando tudo e todos. Nunca quer fazer nada. Nada é bastante bom pra você!
Dei um rolê na cama e me levantei. Comecei a botar a camisa.
- Que é que cê tá fazendo? – ela perguntou.
- Vou dar o fora daqui.
- Taí. Na hora que as coisas não correm do seu jeito, você pega e se manda porta afora. Nunca quer conversar sobre as coisas. Vai pra casa, se embriaga, e daí fica tão mal no dia seguinte que acha que vai morrer. Então me telefona!
- Vou dar o fora dessa porra.


Típico. E, como nos 99% dos casos, eles brigam, ficam uma semana sem se ver e depois voltam, prometendo que tudo será diferente e blá, blá, blá, blá.
Isso tudo é tão óbvio que chega a ser divertido e genial ler esses textos do Bukowski. Enfim, tem gente que gosta de novela, eu gosto dos livros dele...
Hasta!

sábado, 20 de agosto de 2011

Doce loucura

Vejam vocês a ironia da vida. Eu, que até poucos anos sempre fui seco e raquítico, agora estou, digamos, mais arredondado... Enfim, nessa nóia de ficar mais fino voltei a fazer academia. Devido a critérios financeiros e de proximidade optei por uma academia mais popular, freqüentada por todo o tipo de gente: caras com cara de cantor de rap e hip hop, pagadeiros, rockeiros, caras com camiseta de torcidas organizadas de Grêmio, Inter, Brasil de Pelotas e Pelotas, homens e mulheres musculosos e tatuados com caras de maus, armários com caras de segurança de inferninho, outros com ares de ex-presidiários. Nada que assuste, mas, comparado com a maioria dos freqüentadores do recinto me sinto um guri do ensino infantil.
Entretanto, hoje aconteceu algo curioso. Cheguei para malhar atulhado de roupas: calça de abrigo, camiseta de manga curta, moletom, blusão e jaqueta. Depois de alongar e correr na esteira, fui tirando a tralha toda e fiquei só com a calça de moletom e a camiseta de manga curta. Fui para a outra parte da academia, onde ficam os caras com caras de maus e as minas com caras de más, mas, estranhamento, parecia que todo mundo estava me olhando com cara de assustado. “Carajo“, pensei comigo mesmo. Perto deles eu sou um frangote, não tenho tatuagem, não estou nem com a minha camisa do Pearl Jam, nem com camisa Xavante ou da Geral do Grêmio, por que estão todos me olhando com essas caras de assustados? Inclusive, tem um cara com cara de mau, que tem todo o estilo de cantor de rap, que mete peso bacaraí, tá sempre de manga cavada e tem o braço todo tatuado e, ao me cumprimentar, olhou-me com olhos arregalados, como se fosse eu o mau da história.
Estava cada vez mais sem entender nada, porque eu nem ponho tanto peso ãnsim para causar medo em alguém.
E eis que, quando estava fazendo um exercício para o bíceps (que não vou mencionar o nome para evitar piadas óbvias, principalmente considerando o fato que estou morando em Pelotas) enfim, estava fazendo o tal exercício quando presto atenção em mim mesmo, olhando-me no espelho, e vejo que estou com a camisa do lado avesso. “Aí está!“, concluí com meus botões. Esses caras devem estar achando que eu sou louco, e eles, apesar de serem maus, não são loucos, e ninguém, por mais malvado e grande que seja é páreo pra um louco... Por isso a cara de assustado dos caras! Pensando nisso tudo, quase me deu um ataque de riso na frente do espelho, entretanto, limitei-me a explodir de rir por dentro, só emitindo um incontrolável risinho com canto da boca.
Foi nesse estado de princípio de insanidade que, sem me incomodar mais com o fato dos caras e das minas acharem que sou louco, continuei com o treino até o fim, e, depois disso quando alguém me olhava com cara de assustado eu retrucava com um olhar como se dissesse “quê que é meu? Vai encarar?“.
É a doce loucura tomando cada vez mais espaço na minha massa cinzenta.
Hasta!

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Depressão futebolística

A rodada desse final de semana é mais importante do que parece. Principalmente para o Grêmio, que joga a sua segunda partida consecutiva fora de casa e, logo depois, tem o Gre-Nal do Olímpico. E é por conta do clássico que os jogos de Grêmio e Internacional nesse final de semana são extremamente importantes.
Comecemos pelo Grêmio. Caso perca para o Atlético-GO, a tragédia estará estabelecida, pois, nesse caso, o time de Roth chegará ao Gre-Nal na zona do rebaixamento. E, caso perca o clássico, começará a se afundar na parte de baixo da tabela de classificação. Portanto, derrota em Goiás está completamente fora dos planos tricolores.
Já para os colorados, a situação é ao mesmo tempo parecida e diferente. Diferente porque a luta colorada é pela parte de cima da tabela. Mas semelhante porque, em caso de derrota, também chegará ao Gre-Nal precisando urgentemente da vitória, pois, duas derrotas consecutivas praticamente eliminam o sonho do título e deixam bem longe do Beira-Rio uma vaguinha na Libertadores... Ou seja, Grêmio e Inter chegam na rodada desse final de semana precisando vencer para não correr o risco de, quem perder o Gre-Nal, acumular duas derrotas seguidas (que para o Grêmio seriam três – Ceará, Atlético-GO e Inter). Aliás, fico imaginando como ficaria a situação de Roth no Olímpico caso isso acontecesse? O bombeiro estaria morrendo queimado junto com as vítimas que lhe chamaram para socorrer?
RONALDINHO – É curioso, mas vai ter gremista torcendo pelo Inter contra o Flamengo nesse final de semana. Eu confesso que nem vou assistir, pois vou torcer por um 0 a 0 sem graça, combinado com uma vitória corintiana. Pois é: na luta entre rubro e alivi negros eu fico do lado dos paulistas. Aliás, só uma coisa seria pior do que ver o Ronaldinho campeão Brasileiro: aturar o Inter conquistando mais um título. É, meus amigos, a torcida gremista aos poucos vai deixando de ser meramente gremista para também ser corintiana, vascaína, etc. É fogo, meu povo!
SELEÇÃO – Mesmo considerando o Ronaldinho um sem caráter, gostei da convocação do Mano, afinal, com isso, ele, no Flamengo, e o Damião, no Inter, serão desfalques importantes nas rodadas do Brasileirão que estarão rolando. Aliás, a cada jogo que passa o Damião me lembra mais um dos maiores ídolos gremistas: Jardel. É gol de cabeça atrás de gol de cabeça. E os adversários do Inter, assim como os do Grêmio nos tempos de Jardel, não aprendem: deixam a bola chegar na área e não dão a pressão necessária para evitar o gol. Depois de aguentar o Inter campeão de tudo, o Ronaldinho no Flamengo comendo a bola e voltando para a seleção, os viúvos do Jardel (me incluo nesse rol) ainda choram o aparecimento de um jogador com as mesmas características do cabecinha de ouro no maior rival. Mais uma vez: É fogo, meu povo! Só de pensar nisso tudo começo a sofrer de depressão futebolística. Mas, como diria o Xiru missioneiro: pior que tá não vai fica... Ou vai, vá saber...
Um bom final de semana para todos.
*Texto publicado no Jornal das Missões.

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Jornalismo de humor

Na década de 1960 o jornalista norte-americano Hunter S. Thompson “inventou” um novo tipo de jornalismo: o jornalismo gonzo. Vale ressaltar, para quem não é do ramo jornalístico, que no período também surge o estilo que ficou conhecido como New Journalism, que tratava, resumidamente, de uma convergência entre o jornalismo e a literatura através do romance de não-ficção, que hoje é chamado de romance-reportagem, livro-reportagem ou simplesmente jornalismo literário. Enfim, autores como Truman Capote, autor de A Sangue Frio, e Gay Talese, autor de A Mulher do Próximo e Reino e Poder, dentre outros, fizeram história nessa época. Porém, Thompson ficou de fora desse grupo, ousando um pouco mais: além de usar técnicas literárias em suas obras jornalísticas, ele adotava uma linguagem frenética, marcada pela ironia e pelo humor, que ganhava as páginas de revistas como Playboy e Rolling Stone.
Agora, 50 anos depois do surgimento do jornalismo gonzo, o jornalismo que aposta no humor ganha intensidade e a cada dia conquista mais adeptos. Claro que não podemos comparar esse “jornalismo de humor”, praticado por programas como o CQC e por programas de mesa redonda de emissoras de rádio e TV, com o jornalismo gonzo de Thompson. Para o leitor entender melhor, basta ler a seguinte definição que o próprio Thompson deu de si mesmo e de seu estilo: “Eu era o famigerado autor mais vendido de livros estranhos e brutais e um colunista de jornal amplamente temido [...] Eu também era bêbado, louco e vivia armado até os dentes”. Isso sem contar o uso exagerado de drogas e de outras loucuras praticadas durante a sua vida, que terminou em fevereiro de 2005, quando ele mesmo atirou contra a sua cabeça, aos 67 anos, “17 a mais do que precisava ou desejava”, conforme ele mesmo escreveu no bilhete que deixou após o suicídio. Aliás, praticando o jornalismo gonzo, Thompson chegou a xingar um entrevistado, que respondia suas perguntas friamente, afim de obter a notícia para o jornal em que trabalhava.
Pensando na história de Hunter S. Thompson e na eclosão do jornalismo de humor pós-moderno, percebo que há um círculo vicioso, causado pelo surgimento de um novo público que os meios de comunicação e as editoras estão tendo que tratar. Esse novo público pensa em entretenimento, muito antes de pensar em informação, e, com isso, os meios jornalísticos estão tendo que adaptar a informação ao entretenimento sem cair no sensacionalismo barato, rejeitado por esse mesmo público que gosta de seriados como Two and half men e Friends, que têm o humor irônico no DNA.
Por tudo isso, obras como as de Thompson e de outros escritores, como Charles Buskowski e Jack Kerouac, estão sendo cada vez mais traduzidas para o português. Nos últimos anos, aproximadamente três décadas depois de serem escritas, obras como Reino do Medo, da Companhia das Letras, Medo e Delírio em Las Vegas, Hell’s Angels e Rum: diário de um jornalista bêbado, da LP&M, todas de Thompson, foram traduzidas e ganharam milhares de leitores brasileiros, fazendo com que editoras e leitores ficassem satisfeitos...
Sei que para muitos eruditos conservadores isso representa o fim dos tempos, entretanto, acho essas transformações positivas, pois, além da quebra de paradigmas ainda faz com que passamos a refletir sobre o modo de vida que levamos. Mas isso já é outro assunto, que rende outros textos. Por isso, por enquanto vou ficar esperando os próximos lançamentos dos falecidos Thompson, Bukowski e Kerouac, que, mesmo mortos, estão tendo mais livros lançados do que muitos escritores vivos por aí...
*Texto publicado no Diário Popular (Pelotas) e A Tribuna (Santo Ângelo).

domingo, 14 de agosto de 2011

Satolep


Para entender melhor Pelotas, estou lendo um livro indicado por alguns amigos que manjam de música e literatura: Satolep, do Vitor Ramil. Confesso que, quando fui à livraria, ainda não tinha decorado esse nome. Cheguei e pedi um livro do Vitor Ramil, sem citar o título. O vendedor me mostrou o Satolep e um outro, mais antigo. Cocei o queixo, achando que não fosse o Satolep, e comentei “é um que fala sobre Pelotas...”. E ele, de bate-pronto, retrucou: “Ah, então é o Satolep”. Achei meio estranho, pois Satolep me lembrava uma palavra estrangeira, e não um livro-romance que tem como elemento principal uma cidade do interior gaúcho... Mas, mesmo assim, levei o livro.
Dia desses, mesmo com uma porrada de outros livros me esperando para as leituras obrigatórias, inventei de começar a desvendar o que havia por trás daquela palavra misteriosa Satolep. Resumindo, a obra tem uma linguagem poética e cativante, um enredo muito bem construído, onde o personagem-narrador conhece o escritor pelotense João Simões Lopes Neto nos seus últimos dias de vida e, a partir daí, conta elementos particulares de Pelotas. E, numa dessas, sem que ninguém me contasse, eu fiquei olhando para a capa do livro, lendo o título: Satolep. Fiquei matutando mentalmente o que seria Satolep... Satolep, Satolep Satolep... Lembrei de Antares, que o Erico Verissimo criou para representar Cruz Alta. Mas Satolep, o que tem a ver com Pelotas? Foi então que resolvi ler a tal palavra de trás para frente e descobri: Satolep é Pelotas de trás para frente!! Tu vês. Para quem acompanhou o lançamento desse livro, e para quem já acompanhava a obra do Vitor Ramil, isso não é nenhuma novidade, inclusive, minha descoberta pode soar bestial, mas fiquei orgulhoso por ter desvendado sozinho esse mistério. Ao fazer tal descoberta, murmurei comigo mesmo: “elementar, meu caro Dudu...”.
E, assim estou lendo o Satolep, descobrindo mais sobre a alma de Pelotas, pois, como falei, é um livro muito mais romântico-poético do que histórico-didático. Aliás, essa obra tem duas particularidades: primeiro, depois que você começa a ler, não quer mais parar. E segundo: depois que começa a ler você passa a ver Pelotas com outros olhos... E, como é dia dos pais e faz sol em Pelotas, vou pegar a patroa e as crianças para dar uma circulada por Satolep!
Hasta!

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Chorando de barriga cheia

Conheço muita gente que tem de tudo, financeiramente falando, que também tem saúde e que não tem problemas graves para serem resolvidos, mas que mesmo assim vivem de mau humor e não aproveitam em nada a vida. Tem gente, por exemplo, que conta com um casarão que ocupa meio quarteirão, tem um terreno gigantesco que daria para fazer um churras com os amigos por fim de semana, mas que nunca ocupou todo o espaço para nada. E, nas raras vezes em que ocupa, ainda reclama da sujeira deixada pelos convivas. Também conheço gente que pode viajar um monte, mas que nunca deixou as fronteiras das Missões. Enfim, cada um aproveita o dinheiro do jeito que acha melhor (afinal, quem sou eu para meter o bedelho?), mas o que me espanta é que muitas dessas pessoas, ou por serem mal amadas, ou por qualquer outro problema psicológico, vivem reinando e de mau humor. Como diz a letra de uma música do Martinho da Vila: é gente que vive chorando de barriga cheia.
Pois, ultimamente, tenho visto muitos colorados nessa situação. O Inter ganhou de tudo nos últimos anos. Aliás, ganhou em quatro anos mais do que havia conquistado em quase 100 anos de história. Porém, isso parece não ser o suficiente para os colorados andarem por aí, rindo a toa. O Inter, inclusive, está prestes a, definitivamente, ter mais títulos internacionais do que o Grêmio. Por enquanto os colorados apresentam uma leve vantagem, com uma Sul-Americana a mais. E agora, se conquistarem o bi da Recopa, terão uma Recopa a mais que o Grêmio (por enquanto está 1 a 1).
Enfim, caso conquiste o título, os colorados começam a abrir uma vantagem antes inimaginável em relação ao seu maior rival... Para além disso, o Inter já tem a eterna vantagem de nunca ter caído para a Série B do Brasileirão. Portanto, acho melhor os colorados pararem de bancar os bebês chorões, se concentrarem para virar o placar contra o Independiente, para acumular mais um troféu na sua galeria, pois, certamente esse período atual do Inter será lembrado no futuro como uma época gloriosa, assim como os gremistas suspiram ao lembrar dos tempos do Renato jogador nos anos 80 e do Felipão treinador nos anos 90.
DIA DOS PAIS – Antes da minha Larissa nascer, eu não tinha ideia do que era ser pai. Até imaginava alguma coisa, mas não tinha certeza do que isso representava na vida de um cidadão. Hoje, vendo a minha nenê falando “papapapapa”, querendo andar pelo apartamento inteiro, sem se importar com a minha dor nas costas, sei o que isso representa. Aliás, não tem dor que não valha a pena quando vejo aquele sorrisinho maroto no seu rosto, feliz da vida por ter a atenção dos pais e da maninha toda para si.
Mas, além de comemorar o dia dos pais ao lado da minha filhota, também desejo um feliz dia dos pais a todos os pais santo-angelenses e ao meu pai, o famoso seu Nabuco, que até hoje ajuda em tudo o que preciso e que me deu a educação, o apoio moral e financeiro, que me permitiram hoje ser professor da Universidade Federal de Pelotas, uma das mais conceituadas do Estado e do Brasil. Saudades dele e de toda a família! Um bom final de semana para todos, e de preferência, com vitórias para os pais gremistas e colorados.
*Texto publicado no Jornal das Missões de sábado.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Olho mágico

O ano devia ser 1995. Ou seja, eu tinha lá meus 14 anos e estava com os hormônios a flor da pele. Como muitas coisas na minha vida ocorreram tardiamente, naquele tempo eu ainda não sabia o que era noite, nem bebidas e nem mulheres. Tinha uma noção imaginária, mas ainda não tinha provado o melhor que a noite, a bebida e as mulheres podem oferecer... Enfim, o fato é que devido a isso, minhas paixões platônicas eram freqüentes e, em diversas ocasiões, curiosas. Como a que lembrei noite dessas, ao ouvir tamancos passarem pelo corredor aqui do prédio...
No ano referido, como de costume, estávamos passando o verão no litoral catarinense. Tudo em família, como sempre: pai, mãe, irmãos e alguns tios e primos. Cada ano ia alguém junto passar o veraneio conosco. Acho que naquele ano foram a minha prima Vanessa e a minha madrinha Vaceni. Mas também pode ser que era a minha tia Leila e a minha prima Kaúla... Enfim, sei que tinha gente envolvida no pedaço. Mas chega de enrolação e vamos direto ao ponto...
A primeira vez que a vi foi pelo olho mágico. Estava eu, zanzando pelo apartamento, possivelmente em um dia de chuva, sem ter muito o quê fazer, quando ouvi um barulho no corredor. Como um típico guri de 14 anos desocupado, fui dar uma conferida no olho mágico. O que vi me deixou hipnotizado: uma guria morena, que devia ser um ou dois anos mais nova do que eu, usando um short sumário, com cabelos escuros e cumpridos. Mesmo naquela imagem distorcida do olho mágico, apaixonei-me na hora! E assim começaram a se passar os dias daquele veraneio. Ouvia um barulho no corredor e corria para o olho mágico espiar. Você deve estar pensando “que coisa de psicopata“, mas lembre-se que eu era um guri de 14 anos sem muito conhecimento sobre a vida. Agia por puro instinto. Aquela imagem me fazia bem, logo eu fazia de tudo para tê-la diante dos meus olhos. E eu ficava ainda mais enfeitiçado quando ela ia e vinha da praia, vestindo biquíni, mostrando a sua pele pigmentada pelo sol, com os cabelos lisos correndo até quase a cintura.
Porém, como era de se esperar, meu segredo logo foi descoberto por todos no apartamento. Possivelmente a primeira a descobrir tenha sido a minha irmã, que, como uma típica irmã mais nova, passou a me pentelhar. Meus pais, nem lembro o que falavam, mas é provável que a mãe tenha achado aquilo um absurdo e o pai tenha achado graça. Já a minha prima (ou a Vanessa ou a Kaúla), depois de também ter me zoado, aderiu à causa, elaborando um plano para que eu me encontrasse com a vizinha, que até então, só conhecia através do olho mágico...
O plano acabou sendo posto em prática meio que por acaso. Alguém lá em casa teve a brilhante ideia de colocar um peixe em um saco plástico e levar para o apartamento. Acontece que a vizinha tinha uma irmã mais nova, e a minha prima, para unir o útil ao agradável, teve a brilhante ideia de oferecer o peixe para a guriazinha. Como eu era excessivamente tímido, incumbi ela de ir lá, oferecer o tal animal marítimo à criança. Pois eis que eu estava lá, com o peixe na mão, me preparando psicologicamente para ir levar o peixe no apartamento da vizinha, quando a minha prima entra de surpresa no nosso AP acompanhada da cria e da... vizinha! Quando meu cérebro voltou ao ar, depois do choque inicial, eu só conseguia sorrir com cara de bobo para a vizinha, tentando não falar nenhuma bobagem. Por fim, ocorreu tudo bem: eu entreguei o peixe e fiquei olhando a vizinha de perto por um bom tempo, enquanto a minha prima conversava com ela, esperando, inutilmente, que eu puxasse algum assunto com a guria, coisa que não aconteceu, para decepção geral da nação... O fato é que aquele foi o momento mais glorioso que tive naquele verão. E, até o nosso último dia no litoral catarinense, sempre que eu ouvia um barulho na porta da frente, eu corria para o olho mágico espiar a dita cuja...
Pensando agora, quase 15 anos depois, concluo que o quê mais vale nas paixões é o imaginário. Possivelmente se eu a tivesse conhecido para além do olho mágico e tivesse rolado um love mais profundo e duradouro, eu descobriria que ela é só mais um rostinho bonito e sem conteúdo, pronto para me encher o saco por qualquer porcaria. Por isso fico satisfeito ao lembrar do episódio e concluir que não passou de um caso passageiro de verão vivido através do olho mágico.

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Diário de um jornalista bêbado

Acabei de ler no final de semana “Rum: diário de um jornalista bêbado”, do Hunter S. Thompson, aquele mesmo que já comentei aqui outras vezes, autor do “Medo e Delírio em Las Vegas” e “A grande caçada aos tubarões”. Além desses, estou com o Hell’s Angels na estante e estou aguardando mais um dele, autobiográfico.
No “Rum”, Thompson conta como foi a sua estada em Porto Rico, no período em que trabalhou em um jornal de língua inglesa na ilha, quando tinha vinte e poucos anos. Na verdade, é um romance ficcional autobiográfico e, mesmo escrito décadas atrás, ainda vale para se entender como funciona uma redação de jornal, principalmente do interior. A descrição que ele faz da redação em Porto Rico vale para alguns jornais em que trabalhei. Portanto, acho que a ralação geral é universal, principalmente em pequenos jornais. Assim como ocorre em muitos lugares, o dono do jornal não está nem aí para os funcionários, só quer produção e cobra amor à camisa de cada um. Os funcionários, por sua vez, também não estão nem aí para o jornal, passam se queixando do trabalho, buscando uma fuga em um copo de bebida (especialmente rum), mas, no fundo no fundo, sempre acabam se matando para cobrir as pautas, numa espécie de amor platônico à profissão.
Enfim, para exemplificar o tom da obra, vou citar o seguinte trecho do livro, onde o dono do jornal está querendo que Thompson assuma a chefia do empreendimento, justamente por não contar com nada melhor no momento. No trecho, o empresário descreve os funcionários, em um estilo típico dos empresários desse ramo:

“Sala não está nem aí para o jornal. Não está nem aí pra nada”. Curvou-se para a frente e largou a bola de beisebol sobre a mesa. “Quem mais? Moberg é um bêbado, Vanderwits é um doente mental, Nooman é um idiota, Benetiz não fala inglês... Santo Deus! De onde tirei essa gente?” Desabou de volta na cadeira, grunhindo. “Preciso de alguém!”, berrou. Vou ficar louco se precisar fazer esse jornal sozinho!”.

Para quem já trabalhou em pequenos jornais desse Brasil afora, esse discurso não soa nada familiar?
Em outro trecho, quando um funcionário entra sem bater na sua sala, o dono do jornal fala:
“Ah, meu Deus, de onde você tira a audácia de entrar aqui sem bater? Juro por Deus que vou colocar você num hospício! Fora daqui!”. E, depois de uma breve discussão, ele comenta com o personagem de Thompson: “A audácia desse cachaceiro desgraçado. Deus do céu, um cachaceiro desses tinha que ser executado”.

Vejam vocês. Enfim, resumindo tudo, trata-se de um baita livro, com um fim espetacular (ao estilo do filme Cães de aluguel) que vale muito a pena de ser lido.
Hasta!

* Pesquisando no Mr. Google, acabo de descobrir que foi lançado nesse ano nos Estados Unidos um filme baseado no livro. Um dia deve chegar à terra tupiniquim.

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Amy Winehouse: A construção/desconstrução de heróis/vilões

Assisti ontem a um documentário sobre Amy Winehouse que me fez pensar. Como não passava de um admirador distante da Amy, ou seja, nunca tinha pesquisado a sua vida a fundo nem acompanhava as suas notícias, eu tinha em meu imaginário a Amy que os grandes grupos, principalmente de televisão, tentaram vender: uma maluca, sem noção, drogada e bêbada. Na verdade, o que eu mais gostava na Amy era do momento Amy Winehouse do Pânico na TV. Achava aquilo sensacional e me matava rindo vendo a Amy tendo crises, chutando latas de lixo em praças públicas, derrubando tudo no supermercado, etc. E, depois, com a morte da Amy verdadeira, a imagem que vi sendo vendida pelo Jornal Nacional, pelo Jornal Hoje, enfim, pela Globo, era a mesma: a de uma Amy sem noção do que fazia que foi “morta pelas drogas”. Ou seja, trataram ela como uma retardada que usava drogas sem saber o que estava fazendo... Pura babaquice.
Vendo um simples documentário de pouco mais de uma hora, mas com subsídios de fundamento e muitas entrevistas concedidas pela cantora à MTV, deparei-me com outra Amy. Uma Amy fisicamente linda, falando ordenadamente, claramente, fluentemente, demonstrando muito conhecimento sobre música e tendo absoluta noção do que estava fazendo. As imagens dos shows que mostraram nesse documentário são imagens da Amy conversando conscientemente com o público, de bom humor, rindo, ou seja, são shows que você olha e pensa: “porra, que puta show, como eu queria estar lá!”. Aliás, essa é a cara das pessoas que são focadas em close no público. Essa imagem é totalmente contrária das que os noticiários brasileiros optaram por mostrar quando falaram sobre a sua morte. O que se viu foi uma série de cenas descontextualizadas mostrando uma Amy cambaleante, magra, fraca, humilhada e retardada. Tudo edição descontextualizada, feita sem nenhum conhecimento de causa (falo em edição no sentido jornalístico, não no de alteração de imagens graficamente). No documentário, inúmeras vezes Amy fala em entrevistas que a maioria de suas músicas foram escritas para ex-namorados. Ela diz ainda que, quando estava no palco, tentava reviver exatamente o que sentia quando fez a música. Essa seria uma bela justificativa para as suas “panes” em shows. Ou seja, se quando ela escrevia a música estava destroçada emocionalmente, no palco, enquanto cantava, ela revivia aquele momento e ficava novamente destroçada. E nada melhor do que um pouco de álcool e drogas para acentua esse estado de espírito.
Além disso, o documentário mostra uma Amy muito consciente de que ela representa boa parte da juventude londrina e também da influência que a sua família teve em sua música, pois, desde pequena ela ouvia clássicos do jazz, do rock, etc. Inclusive, muitas músicas foram inspiradas por clássicos dos anos 1960-1970, demonstrando o conhecimento profundo que ela tinha da sua profissão. Em outro trecho, antes dela explodir como celebridade, Amy conta que não imaginava ser cantora. “Eu queria ser jornalista. Não acho que canto bem, e escrevo apenas o que sinto”, disse. Acho que se ela fosse jornalista, teria morrido um pouco mais cedo ainda... Ou não, porque aí não teria tempo para ficar chorando decepções amorosas...
Enfim, o fato é que parte da imprensa mundial e a maioria da imprensa nada especializada brasileira apresentaram a Amy sob o ponto de vista moralista do: “ó, ela era drogada, por isso morreu. Que sirva de exemplo pra vocês...”. Ah, francamente! É muita merda sendo enfiada goela abaixo do grande público, que, como diz um personagem de um livro do Erico Verissimo é como um monstro com muitas cabeças, mas sem cérebro. Inclusive, pelas entrevistas concedidas durante os seus 27 anos de vida, acho que Amy morreu mais pelas sequências de desgosto em relacionamentos do que por qualquer outra coisa. As drogas e a bebida em excesso só foram o estopim da sua morte.
Concluindo, após conhecer um pouco mais sobre quem foi Amy Winehouse, tenho plena consciência de que ninguém, muito menos jornalistas mal-informados da Globo, tem colhões para julgar uma cantora de seu gabarito.
Hasta!

Roth, o Imortal

Nada mais justo para assumir um clube que se autodenomina imortal, do que um treinador imortal. Confesso que, há pouco tempo, disse para outros gremistas: “Se o Grêmio contratar o Roth eu não assisto mais aos jogos até o fim do ano”. Mas, com os resultados e atuações pífias que o tricolor teve no curto período sob o comando de Julinho Camargo, eu fui um dos primeiros a sonhar com Celso Roth de volta ao Grêmio. Inclusive, para recebê-lo, acho que os torcedores deveriam ter feito uma festa pirotécnica, como aquela que estava sendo programada no início do ano, quando o clube ainda sonhava com Ronaldinho Gaúcho.
Celso Roth, o treinador mais imortal da história do futebol gaúcho, deverá cair como uma luva nesse time do Grêmio. Roth dá preferência para a estabilidade do sistema defensivo, para só depois armar a equipe ofensivamente. Isso irrita os torcedores quando o time conta com diversos jogadores ofensivos de qualidade, o que não é o caso do Grêmio. O novo velho treinador do Olímpico deverá arrumar de imediato o sistema defensivo do time, que está há muito tempo uma zona, uma peneira, uma festa de arromba para os adversários, independente do jogo ser fora ou em casa... Só parando de levar gols é que o Grêmio vai sair da parte debaixo da tabela. Os torcedores sabem disso. Por isso a maioria dos gremistas ficou satisfeita com o nome de Roth para comandar o time. Inclusive, no papel o Grêmio tem bons jogadores. Victor é inquestionável. Jogadores como Lúcio, Rochemback, Gilberto Silva e Douglas não podem ter desaprendido a jogar de uma hora para outra. E na frente, André Lima, Leandro e Miralles não são maus jogadores. O que faltava, desde a saída de Renato, era comando no vestiário. É inadmissível um jogador, por mais estrela que for, deixar o treino jogando o colete no chão por estar brabo com uma decisão da comissão técnica. E Roth não tolera esse tipo de coisa. Roth é o treinador que deixou Ronaldinho Gaúcho e outras estrelas de Grêmio e Inter no banco de reservas, irritando torcedores. Não se intimida. Não importa se o autor da indisciplina foi um jogador de seleção ou um recém egresso das categorias de base. Esse é o Imortal Celso Roth, o eterno salvador da pátria da dupla Gre-Nal.
Inter – Já o Inter perdeu Roth para o Grêmio. A situação dos colorados é parecida com a que estava o tricolor. Esse treinador aí, que nem sei o nome de cor, não tem nenhuma expressão e os adversários estão fazendo a festa. O clube supervalorizou um torneio que não tem valor nenhum, comemorou uma vitória nos pênaltis contra o Milan em uma decisão de 3° lugar, mas, ao chegar em Porto Alegre, conseguiu a façanha de empatar com o bisonho Atlético-GO no Beira-Rio e levar um chocolate do Fluminense no Rio. Está na hora da diretoria colorada acordar. Afinal, são só cinco pontos que estão separando o clube do Beira-Rio do clube do Olímpico. Em um campeonato de pontos corridos isso é muito pouco. Assim como o desempenho do Inter, que queria o título, e agora já se contenta com uma vaguinha na Libertadores. Do jeito que está, os colorados logo vão ter que comemorar uma permanência na Série A, única corneta que lhes resta contra os bi-rebaixados gremistas.
Como diria o Gaguinho: por hoje é isso pessoal. Um bom final de semana para todos, inclusive para o meu amigão Celso Roth!

*Texto publicado no Jornal das Missões deste sábado.

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Mentiras nada sinceras

Terminei de ler, dia desses, o livro do Lobão: 50 anos a mil, escrito em parceria com o jornalista Claudio Tognolli. A obra, muito mais do que a autobiografia de um músico famoso e polêmico, é uma denúncia social em vários aspectos. Primeiro, a história da família de Lobão, em si, é a própria caracterização da falência da família cristã pós-moderna conservadora. O pai de Lobão era um ultra-conservador de direita e a mãe, além de conservadora, era superprotetora. A história da família é semelhante à de muitas pessoas, não só de classe média alta, como era o caso de Lobão, mas de todas as classes sociais. A infância de Lobão e de sua irmã, um ano mais nova, teoricamente foi feliz: regada a passeios em família, visitas a tios e avós, reuniões em sítios com tios, primos etecétara e tal. Porém, com a chegada da adolescência de ambos, o núcleo familiar acabou ruindo justamente por aquilo que teoricamente o sustentava: o conservadorismo.
Para vocês terem uma idéia, quando Lobão começou a tocar bateria, por pura diversão de um moleque de pouco mais de 10 anos, seu pai o pegou, colocou-o no carro e levou para uma praça, no centro do Rio, mostrar os mendigos que lá viviam. “Viu, assim termina a vida dos músicos”. De início, quando ainda era um guri, a lavagem cerebral feita por seus pais ainda funcionava. Tanto é que Lobão refugava sempre que surgia algum convite para entrar em alguma banda, pois seus pais queriam que ele fosse “alguém” na vida, e não músico... Mas, pais, avós, tios e outros que tentam surproteger os filhos com idéias hiperconservadoras e falsas ilusões (do tipo: morar em um sítio é melhor que em uma cidade grande porque é violenta etc, etc, etc) não podem evitar o óbvio: um dia a criança vai se tornar adolescente e entrará em contato com o resto do mundo e verá que as coisas não são exatamente como seus tutores lhe falavam que eram. E isso aconteceu com o Lobão e com sua irmã.
Além dessa descoberta, que acontece na vida de todos, em um período em que a onda “experimente todas as drogas” estava no auge, Lobão e a irmã acabaram se tornando tudo aquilo que seus pais mais repugnavam: usuários de todos os tipos de drogas e, no caso de Lobão, músico. A partir de então, a família de Lobão nunca mais foi a mesma, e o fim de seus pais vocês já podem imaginar (não vou contar, mas quem quiser saber, pode ler o livro).
Resumindo a história toda, um terço da obra é usado para descrever toda essa situação, apesar de que, mesmo depois que se tornou músico famoso o fantasma da família sempre acompanhou a trajetória de Lobão. Já no restante do livro são relatados fatos históricos, como por exemplo, a relação de Lobão com outros músicos consagrados, como Hebert Viana, Lulu Santos e Cazuza, além de uma rápida e forte menção feita a Renato Russo.
Entretanto, a maior denúncia social da obra vem quando Lobão narra as suas prisões, sofridas por porte de drogas. Na época, o músico foi eleito o símbolo do que a parte conservadora do judiciário, do campo político e da polícia combatiam e, com isso, sofreu inúmeras perseguições e abusos. No caso dele, o fato de ser famoso não ajudou. Muito pelo contrário, só atrapalhou. No livro ele conta, por exemplo, uma prisão em que os policiais acabaram cheirando o pó que Lobão portava. Em outra parte, ele narra a perseguição que a polícia e as autoridades locais, das cidades em que Lobão tocava, faziam contra seu público, efetuando verdadeiras operações pente fino em seus shows.
Enfim, os pormenores de tudo isso valem a pena de serem conferidos no próprio livro. E, para os adultos de caráter podre que acham que conseguem comprar a atenção das crianças à força, com falsas promessas e mentiras ilusórias, fica o exemplo do Lobão: o contato com o mundo real é inevitável. Aliás, em música Cazuza certa vez disse: “mentiras sinceras me interessam”. Mas, muitas das mentiras contadas às crianças não são nada sinceras e nem têm boas intenções...
Um bom resto de semana a todos.

*Texto publicado em A Tribuna Regional.