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segunda-feira, 28 de abril de 2008

O aniversário maldito


Rudiero havia terminado com a namorada há poucos dias. Não dava mais para agüentar. Era muito ciumenta, detestava a família dela, e a família dela também o detestava. Isso desde o início, quando foi conhecer os velhos, e o sogro, ou melhor, ex-sogro, se implicou que ele estava “só” trabalhando com o pai. “Mas e quando você vai estudar e ganhar bem?”, perguntou o velho. “Olha, estou pensando somente no meu trabalho no momento, quem sabe futuramente...” e não conseguiu completar a frase, pois viu que os olhos do velho estavam fixos nos seus, somente esperando por um tropeço para golpeá-lo. O velho soltou apenas um “hmmmmm”, e a velha largou a indireta: “tem gente que não sabe o que quer da vida”. Ele olhou para Andréia, sua namorada, e ficou suplicando uma ajuda, que não veio. Mas os olhos dela demonstravam que ela o entendia. Sabia que seus pais não perdoavam. O problema foi que, devido ao seu gênio explosivo, a relação entre ele e a família dela se tornou insustentável. Primeiro, ia lá e batia boca. Discutia sobre tudo: futebol, política, religião, cor do carro que ele compraria depois que estivesse casado com a Andréia, tudo. No fim, sempre ia embora emburrado e prometendo nunca mais voltar lá. “Agora, só saio contigo para passearmos em algum lugar longe de nossas famílias”. Dizia isso, porque a mãe também não gostava nenhum pouco da nora.
Certa manhã, acordou, abriu a porta do quarto, e flagrou ela conversando com a empregada sobre a nora. “Ela é meio devagar, não sabe cozinhar, não limpa nada, e ainda por cima está fazendo cursinho pré-vestibular. No mínimo vai embora no final do ano e vai deixar ele chorando de novo”. O "de novo" era por conta da outra ex-namorada de Rudiero, que o abandonou para fazer um intercâmbio nos Estados Unidos. A princípio, não terminariam o namoro. Até que ela veio com uns papos de que com a distância ficava difícil e tudo mais, e quando resolveram romper, passaram-se duas semanas e ela já estava cheia de fotos novas no orkut com o namorado americano. “Desgranida. O próximo atentado do Bin Laden vai ser no pátio da casa dela, vai ver”, dizia para si mesmo enquanto rasgava todas as fotos da ex-namorada em mil pedaços.
Agora, fazia menos de um mês que havia terminado com Andréia. Tudo por um prato quebrado. Os sogros estavam viajando, os dois estavam sozinhos na casa dela, ele estava tirando os pratos da mesa, e um deles escorregou e se espatifou no chão. Ela virou o diabo e ofendeu-o tanto, que ele virou as costas, juntou suas coisas e foi embora. Ele se justificava para cargos de consciência, dizendo que sempre era xingado e maltratado pela namorada, e estava cansado de xingá-la também. Nos piores pegas, era “filha da puta” pra todo o lado. Mas dessa vez não quis responder, apenas a deixou. Sem rancor, sem raiva, sem choro, sem arrependimento. O que o surpreendeu foi que ela aceitou tudo na boa, inclusive, gostou da idéia. “Acho que é melhor assim”, disse ao telefone no outro dia. E para piorar ainda mais a situação, já ficara sabendo que ela andara saindo e ficando com antigos rolos. Ele, no entanto, aceitou bem, até porque em um período de três semanas também já havia encontrado outras duas possíveis namoradas futuras.
A primeira era loira, baixa, com coxas fartas, busto arrebitado e gostava de usar uma blusinha que deixava aquele umbigo redondinho de fora. Chamava-se Fernanda. Apesar do corpo escultural, não era tão bonita de rosto. Parecia que tinha o nariz desproporcional ao tamanho dos olhos, que não combinavam muito com as orelhas. Já a segunda, que conhecera dois dias depois da primeira, era morena. Tinha praticamente a mesma altura que ele e era linda de rosto. Seu nome era Manuela. Os cabelos escuros combinavam com os olhos, e a boca se encaixava perfeitamente naquela face que parecia ter sido esculpida a faca. Por outro lado, não tinha o mesmo corpo da Fernanda. Era reta, sem bunda, ou, como dizia o seu amigo Chacota, uma legítima “sem sal”. Mas ele gostava dela, principalmente do olhar e do sorriso.
Classificava a relação com Fernanda como algo mais carnal e seu namorico com Manuela como uma coisa mais espiritual. Simplesmente sentia-se em paz com ela, enquanto que com Fernanda ficava mais agitado e, enfim, excitado mesmo.
O tempo foi passando, e ele não se decidia. O fato de morar na Lapa, enquanto Fernanda morava em Botafogo e Manuela no Flamengo também facilitava. O problema foi quando completou 8 meses de namoro com as duas, data que coincidia com o seu aniversário. Ambas ficaram ansiosas para comemorar a troca de anos dele em sua casa e finalmente conhecer a família de Rudiero. Tinha feito a burrada de prometer para ambas, quando perguntavam da sua família: “quero te apresentar aos meus pais numa ocasião especial...”. Então pensava, franzia a testa, e com ar grave, exclamava: “Já sei! No meu aniversário!”. Pois é, agora a data se aproximava como um leão se aproxima de sua presa em uma corrida incessante. Estava levando na boa o namoro com ambas. Em casa, ninguém nunca se preocupou, já que trocava de namorada praticamente de mês em mês, mas nunca tivera duas ao mesmo tempo. Até pegava algumas por fora quando arranjava uma fixa, mas nunca nada sério duplamente. Quando os amigos faziam perguntas, piadinhas ou o criticavam, ele respondia seriamente, com ar profundo: “a única coisa que eu quero é amar as duas criaturas profundamente...” e suspirava. Até respondia que aceitaria que elas namorassem outros caras. “Não quero nada em troca, apenas poder amá-las”.
Quando ele não estava, a discussão em torno disso era calorosa. Muitos planejavam até dar em cima de uma delas para ver até onde o discurso de Rudiero era verdade, mas o temperamento explosivo do amigo acabava por acovardá-los.
Mas dessa vez era o Rudiero quem estava acovardado. O que fazer? Durante a semana dividia as atenções. Como trabalhava, ficava com uma de segunda à quarta-feira, dizendo que tinha muito trabalho de quinta até domingo. A distância entre os bairros facilitava o afastamento nesses dias. Já para a outra, dizia o inverso: que não tinha tempo nem para respirar de segunda até quarta, mas depois, dava uma aliviada. Sempre quando chegava cansado no primeiro dia dos encontros, ia logo se desculpando: “trabalhei muito, minha paixão, vamos deixar para namorar amanhã”. E realmente cumpria a sua promessa, e os dias seguintes eram de paixão intensa. Mais carnal com Fernanda, e mais sentimental com Manuela.
O problema foi o diabo do aniversário e a maldita promessa. Levar uma em casa de manhã até o meio dia, e outra de tarde até de noite era impossível. Seu pai até aceitaria e acharia bonito, mas sua mãe jamais perdoaria. Os dois estavam divorciados desde que completara 15 anos, mas não faltavam a um aniversário do filho. Inventar uma desculpa, uma viagem? Isso, uma viagem. Teria que viajar a trabalho e passaria sozinho o aniversário. Apenas com a família. Faltando dois dias para a data, telefonou para as duas. Fernanda aceitou numa boa, não fez muita questão. Rudiero primeiro se sentiu alegre, depois aliviado, depois estranhou. Como assim, “tudo bem”? Não insistiu nem um pouquinho... Depois, ligou para Manuela, que teve a mesma reação. Desligou o telefone e ficou cinco minutos pensando, com as mãos sobre as coxas, olhando para o armário tapado de adesivos do seu tempo de adolescência.
Para buscar consolo, acabou ligando para Andréia, que a essas alturas já estava namorando com outro. Era o diacho. Ligou para ex-namoradas, ex-rolos, e nada, ninguém queria ele no seu próprio aniversário! E agora? Mal imaginava ele que o pior ainda estava por vir. Na véspera do aniversário, seus pais anunciaram uma reconciliação e na empolgação do amor reatado resolveram viajar para Natal para passar uma segunda lua de mel. Rudiero ficou desolado. Acordou no dia do seu aniversário e não encontrou ninguém. Fez um ovo frito com arroz no almoço, acompanhado de um suco de saquinho de uva. De tarde, comeu uma bacia de pipoca com guaraná. De noite, quando já estava a ponto de tirar no cara ou coroa se iria optar pelo suicídio ou não, olhou para o seu cachorro Banzé, abriu uma garrafa de Velho Barreiro, ligou “Sucessos de 1995” no som e passou a embebedar-se. No outro dia, o corpo de Rudiero foi encontrado ao lado do corpo de banzé, que estavam ao lado de três garrafas de Velho Barreiro vazias e algumas pílulas de ecstasy. As suas últimas frases foram: “só você me entende”.
Seu nome não era Jim Morrison, nem Renato Russo, nem Kurt Cobaim, nem Jardel. Seu nome era Rudiero Castro, e tinha 27 anos e um cachorro chamado Banzé... E na entrada da porta do céu, ele e Banzé foram recebidos por Charles Bukowski, que disse que os recém chegados é que devem bancar a rodada...

sexta-feira, 25 de abril de 2008

O dia em que o lobo cuidou das ovelhinhas



Essa vai em homenagem a todos os meus ex-colegas de faculdade e amigos, que sempre acreditaram que existe algo inexplicável entre eu e a cerveja. Pois meu tio, que também é Ritter, conseguiu não sei de onde uma caixa da Cervejaria Ritter! E disse que essa foi a primeira cervejaria do Rio Grande do Sul, fundada no porto de Rio Grande. “Os imigrantes chegavam aqui e tomavam dessa cerveja. Ela é de antes da Brahma”, disse.
Como jornalista que se preze, acabei de pesquisar agora a história da tal Cervejaria Ritter, e uma breve consulta ao google já aponta que ela é de 1870! Só que ao contrário do que meu tio disse, ela teria sido fundada em Pelotas e não em Rio Grande, mas como a caixa mostra, ela se alastrou pelo Rio Grande do Sul, já que, como podemos ver na foto diz: Cervejaria Ritter Porto Alegre. E para falar a verdade eu confio mais na informação do meu tio...
Pensando um pouco sobre o assunto, vejam vocês! Meus antepassados eram muito espertos. Só que isso tudo era um perigo eminente, porque um Ritter sendo dono de uma cervejaria era mais do que ÓBVIO que não daria certo. Que o digam os Dudus, os Fábios, as Carolinas, as Karinas, as Vanessas, os tios e tias todos e todas, etc, etc, etc...

Na foto, a versão 2008 dos irmãos Ritter, só que ao invés de ter uma cervejaria, esse ai tem apenas um copo de cerveja....

Filosofia de bar



Passei quinta-feira de noite no famoso bar do meu tio, em Porto Alegre. O Bar Garibaldi, localizado na Avenida Venâncio Aires, próximo a José do Patrocínio. Bem em frente à Praça Garibaldi. Pois bem, já mencionei o bar em textos anteriores. Infelizmente dessa vez o Pula-Pula não estava lá, senão colocaria aqui uma foto dessa figura folclórica da cultura gaúcha e porto-alegrense. Sorte minha que a Globo ainda não descobriu esse talento, nem esse reduto humano tão curioso, portanto, posso explorá-lo com exclusividade.
Estava lá um outro senhor, que aparece em uma dessas fotos, o de barba branca, e, porra, o cara é um filósofo. Também estava lá meu amigo Cristiano, e, obviamente, o meu tio. Estávamos nós quatro filosofando acerca de relacionamentos. Na verdade eu e o Cristiano, como mais novos, apenas ouvíamos os mais velhos. Em resumo, eles chegaram à conclusão de que a única mulher que não incomoda é a mãe da gente e olhe lá, e que o único jeito de tolerar um relacionamento é tendo uma amante. “O bom é ter uma mulher certa e uma amante certa”, disse o senhor. Certa, no sentido de correta. “Antigamente eu me preocupava, achava meio antiético ter amante. Hoje descobri que é o único jeito de salvar o relacionamento”, disse ele. Já meu tio, completou: “Com mulher a gente só perde. Não dá pra tenta ganhar nada com mulher. Tem que já entrar pensando em perder o menos possível”. Em meio a essas, quando alguém se referia a mãe, um outro entendia mal e perguntava:
- A amante?
- Não, a mãe.
- Ah bom...
Ou senão o contrário:
- Quem? A mãe, essa?
- Não, a amante pô.
- Ah, bem que eu desconfiei.
Em meio a essas filosofias, o Cristiano e eu nos olhávamos e exclamávamos: “tu vês”. Achei interessante a visão de mundo deles, apesar de não concordar (por motivos mais óbvios do que 1+1=2). Mas meu tio, olhando para o Cristiano e eu, e sabendo que nós estamos curtindo nossos respectivos namoros, disse: “eu não me apaixono mais, mas quem é novo tem que mais é que se apaixonar e aproveitar. Ai não se preocupa com mais nada”, disse. “Quando somos novos a gente se incomoda, mas é a melhor coisa do mundo”, completa o velhinho.
Nesse ponto até concordo com eles, mas acho que para não entrar naquela outra de que “mulher só incomoda” e tal tem que fazer de TUDO para manter viva essa paixão e tem que AMAR de verdade, e só quem ama sabe do que estou falando. E não jogar a culpa na outra pessoa, mas sim, assumir as responsabilidades em todos os sentidos. Mas isso já é outra questã com várias controvérsias, portanto, paremos por aqui com esse assunto.
Depois deu na TV a notícia do padre maluco que voou com os balões. Mostravam as equipes de busca, e o velhinho olhando tudo aquilo começou a pensar em voz alta, bebendo sua dosezinha de whiskey: “O cara pirou. Mas também, basta estar são para pirar. Quando vê um de nós pira – dizia ele, colocando o dedo indicador na cabeça e discursando com os olhos arregalados. Já pensou – começou a falar olhando para mim – se um de nós surta e resolve que quer voar de balão! Cada um cada um. Todo mundo tem o direito de pirar e de ter sua loucura”, concluiu. Depois, ele se revoltou: “mas que padre filha da puta. Olha o prejuízo que deu com todos esses aviões e bombeiros atrás dele”, e seguiu bebendo seu whiskey.
Mais tarde, quando estávamos todos filosofando sobre segurança pública em Porto Alegre, entrou um carinha chapado de loló. O cheiro forte tomou conta do bar. O tio tocava ele para fora e ele voltava. Era como um cachorro sarnento que é expulso da calçada, mas não arreda pé. Ele dizia “eles estão ali, eles estão ali. Sai daí, vai saindo um por um bem quietinho. Vão saindo”, apontando para as mesas vazias, com olhar vidrado e a língua enrolada e cambaleando de um lado para o outro. E o tio gritava “eles já foram, e tu vai ir também!”, e ia rapidinho tocar ele pra fora com uma cadeira na mão: “vou te fincar na guampa essa cadeira se tu voltar”, ameaçava. Enquanto o tio discutia com o cara, o velhinho filosofava: “não adianta discutir com um cara desses. Ele já está completamente fora. É como discutir com louco. Que nem ontem, no jogo do Inter (5 a 1 no Paraná), um cara ficou brabo com o Pula-Pula porque ele não calava a boca. O cara só pode ser louco! Querer que o Pula-Pula fique quieto é ser mais louco que o próprio Pula-Pula...”.
Numa dessas, o cara do loló voltou, parou na frente de uma as mesas, e fiquei observando a baba que escorria pelo queixo, lambuzando toda a camiseta e o chão do bar. O tio tocou ele de novo, exclamando “mas que inferno! Isso aqui é pior que o inferno, ta lôco!”. E dessa vez ficou de cão de guarda na porta, para garantir que o sujeito não voltaria.
Vez ou outra entra alguma daquelas figuras que já falei em outros textos, tentar pegar cinza dos cinzeiros para fazer fumo de crack, ou com moedinhas para comprar cigarros avulsos. É assim o tempo inteiro. E em meio a isso, para suportar o cotidiano do bar, é só filosofando sobre a vida mesmo: “eu já não me preocupo mais. Já me tiraram tudo. Agora tenho que ficar aqui, comemorar o aniversário do Pula-Pula amanhã e esperar meus 60 anos pra fazer uma festa se ainda estiver vivo. Mas também vai ser a última...”, diz, enquanto o velhinho tenta anima-lo “não diga isso, não diga isso...”.
E enquanto eu escrevo essas linhas, sei que está rolando uma grande, animada e tumultuada festa de aniversário do Pula-Pula no bar do tio. E viva o Pula-Pula!


terça-feira, 22 de abril de 2008

Arriba e Arriba! A vida é uma música!

Passou a quarta-feira, sexta-feira, não importa a feira! Passou o sábado, o domingo o feriado, e aca estoy yo escrevendo para vassuncês! Descobri uma coisa muito importante na viagem que fiz para o exterior. Aliás, uma não, duas. Quer dizer, duas nada, três! Primeiro, eu não consigo viver sem música. É inexplicável, mas na medida em que o tempo vai correndo, e quanto mais tempo passa e eu não ouço nenhuma música, nem uma musiquinha mísera, eu vou ficando angustiado, irritado, preso, sufocado! Então, começo a cantar mentalmente o primeiro som que me vem à mente. Lá no hotel onde ficamos tinha uma ampla área no último andar do prédio, onde se tinha uma bela vista de Ciudad de Leste. Quer dizer, a vista era mais bela de noite, com as luzes. Foi nesse lugar que encontrei meu refúgio musical. Tocava música castelhana a toda a hora, e eu ficava lá, parado, em pé, olhando aquela imagem e ouvindo aqueles “arriba e arriba muchachedo!” durante vários minutos. E ouvindo aquilo lembrava do velho e bom Paulinho dançando suas músicas castelhanas nas festas no Itaí, onde ele fechava os olhos e parecia que voltava para Barcelona e sua vida boêmia, agitada, animada e muito musicada em solo espanhol.
Desde que voltei, no feriado de segunda, não paro de ouvir música. Saio de carro, ando devagar para poder ouvir o máximo de música até chegar no lugar onde estou indo. Chego de meio-dia, ligo o DVD do Pear Jam, do Rappa, dos Engenheiros, do U2, ou qualquer outro para acelerar o movimento dos neurônios na minha cachola. Vou ao banheiro assobiando Carnaval de Veneza. Acordo, e para o desespero do meu irmão, que mora no quarto ao lado, ligo o rádio e aumento o volume para ouvir do banheiro, enquanto o chuveiro faz “tchhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh, iiiiiiiii-iiiiiiii-iiiiiiiiiiiiiii-tchhhhhhhhhhhhhh-iiiii-iiiii-iiiii” (o iiiiiiiii é o barulho irritante do cano). Saio do banho, e deixo o som ligado até o último minuto antes de sair de casa. Até para estudar e ler eu fico com o som ligado. Concentro-me com maior facilidade, parece. Penso melhor, escrevo melhor, raciocínio melhor, vivo melhor! Por isso, adoro música! I love music, bybe! É isso ai.
A segunda coisa que aprendi, é que a porra dos guardinhas das aduanas dificilmente pedem a tal da carteirinha de vacinação. Eles vêm com aquela cara de Garfield, se achando superior e tratando os turistas como se fossem criminosos, enfiam a carona na janela do carro e fazem de tudo para você ficar com mais vontade de descer do carro e meter o revólver que eles têm na cintura no rabo deles até eles chamarem a mamãe, e vão pedindo documentos, e fazendo perguntas e perguntas e perguntas, até que eles decidem que você pode passar. Na verdade considero isso tudo um grande circo, mas levaria mais tempo para dizer tudo o que penso sobre isso. É uma questão mais complexa.
A terceira coisa que descobri... bem, a terceira coisa não tem nada a ver com a viagem. A terceira coisa que descobri, ouvindo o DVD do Rappa ali na sala, é que, porra, estou morrendo de saudades de todos os meus colegas da facul! E espero rever todos logo! Porra, acabou a música e estou começando a ficar angustiado... vamos todos cantar Espuma da Cerveja na Pastelaria!
(Para matar a saudades, lá em cima vai uma fotinho da galera do Abraço Coletivo na Patela)

sexta-feira, 18 de abril de 2008

A Extinção do Ovo

Estou a poucos minutos de embarcara para mais uma viagem. Cheguei de madrugada de Porto Alegre, e daqui a pouco estamos indo para Argentina, Paraguai e Foz do Iguaçu. Para variar, minha alergia a ovo continua me perseguindo. Nem para dar uma viajada ela me da um tempo. Graças a ela, não posso fazer a vacina contra a febre amarela. E, como o sistema persegue quem tem alergia a ovo, a carteira de vacinação é documento obrigatório para cruzar a fronteira. Isso quer dizer que, teoricamente, eu não posso sair do país. Estou preso no Brasil!
Mas (sempre tem um mas) consegui um atestado com a minha médica justificando que eu não posso fazer a vacina devido a “alergia cruzada dos componentes da vacina”. Bom, ficou bem mais sutil do que dizer que sou “alérgico a ovo”. Graças a isso, eu espero entrar em solo argentino e paraguaio. Caso contrário, eu terei que pegar um ônibus de volta e deixar o resto do bando seguir viagem sem mim. Maldito ovo. Segue sendo a minha sina, a minha saga. Espero que até eu morrer, as galinhas se tornem mamíferas por algum milagre da natureza ou por algum tipo de mutação, e não ponham mais ovos! E daqui muitos e muitos séculos, nossos descendentes sequer saberão o que era um ovo. Farão reproduções de ovos e colocarão em museus. Então, o seu tatatatareneto perguntará ao pai, de mãozinha com ele: “papai, o que é aquele negócio ali ó?”. E o pai da criança vai olhar, olhar, e não vai saber o que é. Então, chegará uma daquelas garotas que tem um crachá escrito “posso te ajudar?” e explicará que aquilo se chamava “ovo”, igual a esses de chocolate que entregam na páscoa (porque os ovos da páscoa permanecerão). E nesse dia, o mundo será mais feliz!

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Apagamento

Só para explicar que apaguei o último post porque o texto estava muito grande, e, como sempre é dito por todos os teóricos da comunicação na internet, o leitor pós, ultra, mega-moderno que acessa a internet não gosta de ler textos grandes... e como o principal daquela história não estava na história, como expliquei no referido texto, então resolvi deixar para editá-lo ou escrever de novo a história do porre de champanhe na UPF com meu amigo Arion em um momento em que eu esteja mais inspirado e com mais tempo (duas coisas difíceis, ultimamente). Ou, de repente, se eu ganhar na mega-sena ou algo assim, eu posso patrocinar a publicação de um livro completo, mas como isso também não deve acontecer, contetem-se com essa nota explicativa que acho que mais vai confundir do que explicar. Mas enfim, era isso....

sábado, 12 de abril de 2008

O mistério de Ferdinando

Ele olhava a mosca que sobrevoava a cabeça do cachorro que estava deitado próximo aos seus pés, na beira da cama, enquanto pensava na sua merda de vida. Havia cansado de ouvir críticas e desaforos do seu editor. “Você só me traz problemas, problemas, problemas! Não sei porque continuo te pagando, seu animal! Eu preciso de alguém que me traga solução, e não mais problemas do que eu já tenho! Suma daqui, sua ameba!”. Foi assim a última conversa que tivera com o seu chefe, naquele mesmo dia. Isso era jeito de tratar um jornalista experiente como ele? Era o mais antigo da casa, simplesmente 25 anos ininterruptos trabalhando no mesmo jornal, e todo o santo dia ouvindo a mesma choradeira do chefe.
“Acho que você deveria estudar grego...”, certa vez lhe disse em tom sério. Intrigado, ainda se deu ao trabalho de perguntar o motivo daquela sugestão e ouviu a seguinte resposta: “Porque parece que eu falo grego e vocês não entendem nada! Fazem tudo ao contrário do que eu digo! Não é possível! Suma da minha frente!”. É, o cachorro que ali estava deitado, com a cabeça sob as patas tinha mais respeito do que ele.
Outro problema é que, mesmo trabalhando em uma capital, onde ocorrem diariamente grandes acontecimentos, nunca fizera uma grande cobertura, uma grande matéria, uma grande reportagem. Era um mísero repórter da editoria “interior”. Seu trabalho desde que entrara no jornal consistia em selecionar releases enviados por prefeituras, instituições, empresas e outras entidades do interior, para publicar os mais interessantes. A sua preocupação maior era achar uma pauta um pouco melhorzinha para abrir a página. Quando saía de férias, tiravam um estagiário de qualquer editoria para fazer o seu trabalho. O chefe lhe jogava na cara freqüentemente a sua insignificância dentro da redação: “só não te demito porque tenho pena de você. Está entendendo? E porque você não reclama de nada. É um crápula cagalhão”. O sentimento que tinha pelo seu chefe era estranho. Não queria esbofeteá-lo, nem mata-lo, nem nada. Queria apenas provar de que era capaz de fazer uma grande cobertura. Já estava de saco cheio da editoria “interior”. Queria passar para a polícia, para o esporte, para a política, até para a geral já servia. Porém, não tinha coragem de falar isso para o chefe.
Teve a infeliz idéia de fazer o pedido logo que entrou na empresa. Lembra-se bem. Fazia um ano que havia sido efetivado, quando entrou trêmulo na sala do chefe e pediu para ser trocado de editoria. O chefe tirou o charuto da boca, soltou uma baforada, olhou para a nuvem de fumaça que se formou, olhou de novo para o interlocutor e disse: “saia da minha sala antes que você perca o seu maldito emprego”. Ele baixou a cabeça e resmungou um “sim senhor”.

Eram quase nove da noite quando o telefone tocou. Era Rudiero, seu amigo de trago:
- E aí cagalhão! Tenho uma pauta pra ti. Com essa tu vai deixar essa bosta de editoria e vai subir na vida. Finalmente meu irmão!
- Fala sério... hoje não estou com espírito para brincadeiras...
- To falando! Tem uma bruxa que mora na Loureiro da Silva, próximo à Lima e Silva. A velhinha tem uns 100 anos, no mínimo! Ela faz todo o tipo de bruxaria. Cara, você não vai acreditar! Eu também não acreditava, mas vi ela rogando uma praga num cachorro que não parava de latir, e poucos minutos depois o bicho foi atravessar a rua e foi atropelado. Outro dia, um gurizinho estava chamando ela de “bruxa do 71”, e ela falou umas palavras incompreensíveis, e o guri ia olhando para ela e dando risada, quando veio um ciclista a toda a velocidade, bateu de frente com o infeliz, e o guri morreu de traumatismo craniano! Essa é quente! Vai lá! Pede para falar com ela, o número do prédio é... e o apartamento é 709.
Ferdinando ficou pensando por um momento. E se o amigo tivesse razão? Por alguns segundos fez-se um silêncio.
- Alô! Ferdinando, está ai?
Ferdinando desligou o telefone e ficou a pensar. Essa era a chance de fazer um furo inédito.
Imediatamente ele saltou da cama, se vestiu rapidamente e correu para o endereço indicado. Havia três seguranças na porta do prédio. Nenhum interfone. O maior deles questionou-lhe:
- O que deseja?
- Quero falar com a senhora do 709.
- Como é seu nome?
- Ferdinando. Trabalho no Francisco’s Jornal.
Ele pegou seu rádio e discou um número. O que falavam não dava para ouvir.
- Ela não quer falar com você.
Ele baixou a cabeça, murmurou um “ok”, como fizera a vida toda, e saiu andando pela calçada, desanimado. Mas e se ele pegasse ela no flagra, fazendo alguma feitiçaria ou algo assim? Decidiu que deveria entrar naquele prédio. Ou faria isso ou morreria. Fez a volta na quadra e ficou a espiar o trio de seguranças atrás do muro da casa vizinha. Já eram quase três da madrugada, e nada. Eles permaneciam ali, firmes. Até que chegou um carro e o portão da garagem se abriu. Curiosamente os três não se mexeram, nem para olhar o portão. O carro entrou, e enquanto o portão ia fechando ele correu rápido para dentro. Porém, um dos seguranças ainda viu seu vulto entrando prédio adentro. Não sabia onde estava o elevador. Deduziu que o apartamento seria no sétimo andar. Viu uma escada na sua frente e começou a subir correndo. Chegou ao segundo piso ofegante. Ouviu os passos que o seguiam e as vozes que o ameaçavam. “Entregue-se que vai ser melhor para você”. Ele não dava ouvido, decidiu que essa era a hora. Era a sua apoteose. Subia obstinadamente degrau a degrau. Na medida em que chegava em um novo andar via o número de um dos apartamentos. Passou pelo 205, 305, 405, 505. Quando chegou no 605, sentiu que os seguranças estavam muito próximos, mas não quis olhar para trás. Chegou no 705, e havia um corredor para cada lado. Não teve tempo de parar e escolher o lado a seguir, e dobrou sem pensar para a direita. Viu na última porta o número: 709. Começou a dar socos na porta, e ao mesmo tempo em que os seguranças chegaram, a porta se abriu. Uma senhora, que realmente devia ter mais de 100 anos, olhou duramente para os seguranças, que viraram as costas, baixaram a cabeça, e desceram as escadas, como se tivessem recebido uma ordem. A bruxa olhou para Ferdinando, que estava sem palavras, ainda ofegante. Ela pegou ele pelo colarinho e puxou-o para dentro do apartamento. Ele ficou com os olhos arregalados quando ela começou a beijar-lhe a boca. Ele afastou-a com suas mãos, mas sentiu que aquela pele enrugada começou a ficar lisa, e aqueles cabelos brancos estavam ficando pretos, e aquela barriga inflamada começou a ficar reta. De relance, Ferdinando puxou a bruxa fortemente contra o seu corpo e beijou-a sofregamente, aliciando cada centímetro do monumento que se formou instantaneamente na sua frente.
Depois daquela noite Ferdinando nunca mais foi visto. E seu desaparecimento rendeu apenas cinco linhas na editoria de polícia do Francisco’s Jornal. Já seu amigo Rudiero, ficou com o cachorro de Ferdinando, com quem mantém até hoje a mais sólida das amizades.

domingo, 6 de abril de 2008

Acabou o papel – e o dinheiro também!

Estava lendo, dia desses, “Um lugar ao sol” do Erico Verissimo, que é uma espécie de continuação de “Clarissa” e “Música ao longe”, com uma mistura de “Caminhos Cruzados”, como o próprio Erico explica no prefácio. Ele mesmo chama a atenção para o fato de que as dificuldades financeiras enfrentadas pelos personagens provavelmente tenham muito a ver com as que o próprio autor passava na época em que escrevia o romance.

Por motivos óbvios, não preciso nem explicar o motivo pela qual eu me identifiquei com o livro e a história toda. Só que, ao contrário do que fez o Erico na década de 30, eu não produzirei uma ficção e nem um romance (pelo menos por enquanto) para falar sobre isso. Vou contar a vocês, nobres leitorinhos tupiniquins tropicais, tudo o que se passou comigo em duas situações de forma nua e crua. Não sei se essas histórias são trágicas ou cômicas, cabe a cada um fazer seu próprio julgamento. Aliás, como diria o Mário Quintana, com mais ou menos essas palavras: “o escritor pensa em escrever uma coisa, escreve outra, e o leitor lê outra, completamente diferente daquilo que o escritor pensou no primeiro momento”. Pois então, vamos às histórias:

Como eu estava falando com meu irmão esses dias, durante uma discussão muito calorosa, profunda, reflexiva e construtiva para o futuro de toda a espécie, as pessoas defecam em diferentes lugares e de diferentes formas. Alguns “vão aos pés” em qualquer lugar, sem cerimônia nenhuma. Chegam em qualquer ambiente, encontram um banheiro, e vão lá dar uma “cagadinha”, e saem de lá sem remorso algum, assobiando “Carnaval em algum lugar qualquer”. Outros, até vão em qualquer banheiro, desde que não tenha ninguém por perto. Também existem aqueles que só cagam em casa, e um outro grupo, o mais neurótico, formado por pessoas que só cagam em casa, e quando ela está completamente vazia. Quando fomos no Intercom no Rio de Janeiro, no hotel onde meus amigos ficaram era feito um rodízio. Enquanto um cagava, o resto tinha que dar uma circulada pela cidade. Eu não estava hospedado lá, já que fiquei na casa do meu amigo Mário na Ilha do Governador. Mas como sou do grupo que caga em qualquer lugar, um dia resolvi pedir o banheiro emprestado e todo mundo foi para a rua curtir o clima carioca de setembro.

Você deve estar se perguntando: “e o que tem a ver a dificuldade financeira com esse lance de cagar?”. Pois eu lhe explico: antigamente eu não cagava em qualquer lugar, mas a necessidade me levou a mudar a minha mentalidade acerca desse importante assunto.
Tudo começou no verão de 2001/2002. Eu havia deixado Santo Ângelo em dezembro rumo a Balneário Camboriú para trabalhar no Hotel Costa do Marfim como mensageiro (isso já rendem outras histórias, mas vou me ater a questão da merda propriamente dita). Cheguei lá sem grana (pra variar) e minha mãe me orientou a passar no nosso antigo apartamento em Meia Praia para pegar uns pilas que havíamos ganho com o aluguel do dito cujo. Peguei a grana, que deu para pagar a pensão, que ficava do lado do hotel. Com o dinheiro que ganhava de gorjeta (variava de 10 a 20 reais por dia) eu pagava as despesas diárias, que era basicamente a comida que eu consumia depois das três da tarde, já que eu trabalhava das 7h às 15h, e nesse período eu ganhava café da manhã e almoço. Muitos desses cafés eu tomei sem dormir, mas enfim, com as gorjetas eu comprava o lanche da tarde, janta, e o que sobrava ia para o trago. Obviamente que não sobrava muito, mas o trago geralmente era bancado por alguém que ganhasse melhor na pensão, por algum colega do hotel, e, na maioria dos casos, por hóspedes, que nessa época do ano eram formados majoritariamente por excursões de estudantes do segundo grau. E o melhor: eram grupos de todo o país. Tinha paulistas, mineiros, paranaenses, mato-grossenses, sul-matogrosenses, gaúchos, e por ai vai.
Como se pode perceber, levando em conta que eu gastava mais ou menos o seguinte: 10 reais em comida e 10 reais em trago por dia, não sobrava nada para outras despesas, como por exemplo, papel higiênico. Mas logo nos primeiros dias eu achei uma solução. Quando saía do hotel, geralmente a vontade de cagar dava lá pelas seis da tarde, no intervalo entre o futebol na praia e a saída da noite. Eu chegava na pensão, tomava um banho, colocava uma bermuda e um chinelo, e ia rumo ao Shoping Center para usufruir do seu luxuoso sistema sanitário. Ia lá, cagava com toda a tranqüilidade do mundo, e saía do banheiro olhando as vitrines, assobiando “Carnaval de Veneza”.
Com o passar dos dias passei a revezar as cagadas no shoping com as cagadas no hotel. Quando não estava muito legal, falava para o outro mensageiro: “segura as pontas ai que surgiu uma emergência”, e ia para o banheiro onde passava vários minutos sentado na privada e filosofando mentalmente sobre a vida. E o mais importante: sem gastar com papel higiênico.
Mas minha situação melhorou quando recebi, e ai sim, pude ir ao supermercado e encher o carrinho com muito papel higiênico. Foi com muito gosto e orgulho que eu ia alcançando cada pacote de papel higiênico para a mulher que estava no caixa.

A segunda história, tentarei contar de forma mais resumida. Foi na minha estada de quatro meses em Porto Alegre no ano passado. O dinheiro estava acabando, assim como o papel higiênico. Meu tio, percebendo que eu estava usando o papel higiênico dele, tratou de deixar somente um rolo, e quando acabava, me deixava na mão, ou melhor, no jornal. Desconfio que ele passou a deixar o seu papel no quarto, e levava até o banheiro quando fosse dar uma cagada. Mas não achem isso estranho, nós dois somos Ritter, e como todos na nossa família, temos algumas atitudes estranhas...
Mas enfim, como ia dizendo, o dinheiro e o papel higiênico, que havia comprado na promoção leve 8 e pague 6, estavam acabando. A solução foi apelar para os banheiros de outras edificações. Primeiro fui até o Praia de Belas. Era longe pacas para uma simples cagada. Não valia a pena o esforço. Chegava lá exausto, às vezes até já tinha perdido a vontade de cagar. Depois, passei a usar o banheiro da rádio mesmo. Mas foi só umas três ou quatro vezes. Foi então que entrei para os panfletos, e com o dinheiro que economizava indo a pé ao invés de pegar o busão, já deu para comprar um pacote da promoção leve 4 e pague 3. Depois, quando recebi o salário da semana, fui orgulhosamente comprar o pacote da promoção leve 8 e pague 6. Infelizmente nunca mais encontrei essa promoção.
Para encerrar, foi assim que perdi o preconceito com os banheiros desconhecidos. Hoje posso estar em qualquer lugar do mundo, que se a vontade bater, lá vou eu rumo a privada sem constrangimento nenhum, assobiando “O céu é só uma promesa”, dos Engenheiros.