Fama e Anonimato
Confesso pra vocês que, mesmo pesquisando New Journalism por alguns anos, eu nunca havia lido “Fama e anonimato”, do Gay Talese, na íntegra. Quando estava no mestrado até tinha retirado essa obra na biblioteca da PUCRS para ler “Frank Sinatra has a cold”, mas não tinha lido mais nenhum dos outros textos que compõe essa coletânea de grandes reportagens literárias do auge da carreira de Talese. No final de 2020, quando o Papai Noel materno perguntou o que eu iria pedir, bati o martelo: “Fama e anonimato”, de Talese.
E eis que, nesse
primeiro mês de 2021, na maior do parte enquanto me balançava na rede da casa
de meus pais, li esse livro publicado em português pela Companhia das Letras.
Aliás, li e curti. O livro é dividido em três partes. A primeira é a que mais
gostei: são cinco textos sobre Nova York que formam praticamente um perfil da
cidade. Lamentei, apenas, não ter lido esses textos antes de morar lá por um
ano, entre 2013 e 2014, ou enquanto eu estava lá. Porém, também é muito prazeroso
ler essas reportagens/crônicas conhecendo a cidade e vendo que diversas das
referências feitas por Talese nos anos 1950/60 seguem as mesmos, como Madison
Square Garden, Time Square, Central Park, etc. Muita coisa mudou nesse meio século,
no entanto, a personalidade da cidade eu diria que continua exatamente a mesma.
Portanto, esses textos são simplesmente obrigatórios para qualquer pessoa
apaixonada por Nova York. Pena que fui descobrir isso apenas agora.
A segunda parte
são reportagens que Talese escreveu sobre a construção da ponte Verrazano-Narrows,
que liga os bairros do Brooklyn a Long Island, em Nova York. Confesso que,
enquanto estive lá, não dei muita bola para essa ponte. Agora descubro que, na
época, era uma das mais longas do mundo. Mesmo tendo alguns trechos
relativamente longos que são um tanto quanto chatos (quando, por exemplo, ele
tenta explicar as questões técnicas da construção), a parte humana é uma aula
de jornalismo. Ele apresenta diversos dos construtores, conta sobre acidentes e
mortes, sobre o drama das famílias que foram expulsas das casas onde nasceram
pra construírem a ponte, e ainda aponta o antagonismo na relação entre os
trabalhadores com a obra de concreto e os políticos e empresários engravatados
que não botaram a mão na massa mas que apareceram nas fotos e na TV na hora da
inauguração. Também relata de maneira muito foda o perfil dos “boomers”, que
são os trabalhadores que viajam o país (e até o mundo) para trabalhar na
próxima grande obra da humanidade (diversos que trabalharam nessa ponte, depois
trabalharam na construção do World Trade Center, por exemplo). Também é curioso
como ele apresenta a grande utilização e exploração da mão de obra indígena
utilizada nessas obras. Enfim, como disse, afora as páginas meio “boring” sobre
questões técnicas, é um puta texto.
Por fim, na terceira parte, aparecem biografias de famosos ou veículos badalados. Nesse trecho está “Frank Sinatra has a cold” (traduzido como “Frank Sinatra está resfriado”), bem como perfis dos pugilistas campeões mundiais em seus tempos Flory Patterson e Joe Louis (dois negros com histórias parecidas, mas com personalidades completamente distintas), a biografia do cineasta Joshua Logan, do jogador de baseball Di Maggio (que foi casado com Marly Moore) e assim por diante. Ao final do livro, a Companhia das Letras ainda colocou outros dois textos “making of” escritos por Talese anos depois sobre as reportagens de Frank Sinatra e da ponte. As duas baixas, não só da última parte, como de toda a obra, na minha opinião, são dois textos sobre veículos de comunicação que eram badaladíssimos na época: um sobre a Voge e outro sobre a Paris Review. Afora isso, é uma obra – sob o ponto de vista do jornalismo literário – quase perfeita.