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quarta-feira, 9 de abril de 2014

Segunda parada: Pittsburgh (medo e delírio na madrugada)

Sábado, hora de partir. Fiz o check out do hostel as onze da manhã e segui, a pé, com as duas malas para a rodoviária de Washington DC. Fui a pé porque tinha tempo sobrando. Pude parar, comer no caminho, e seguir com os dois trambolhos gigantes e a mochila nas costas. Mas dessa vez eu tinha elaborado um plano infalível para não pagar excesso de bagagem. Tão infalível quanto os planos do Cebolinha para roubar o Sansão.
Sempre nas filas da Megabus tem gente sem bagagem de despacho. Então, faria o seguinte: acharia alguém com cara de gente boa e pediria esse favor – colocar para mim a mala de despacho no busão. Como cheguei um pouco cedo, acabei conhecendo um médico árabe que pegaria o mesmo ônibus, porém, ele desceria antes do que eu. Como eles separam as malas por destino, teria que achar alguém que também fosse para Pittsburgh. Pelo menos fiquei mais tranquilo de ter um médico no ônibus, agora eu poderia ter um troço que teria alguém para acudir...
A fila foi se formando e então pedi o tal favor para um guri chinês, que estava com os pais. Eles ficaram me olhando, como se eu fosse um maníaco e não toparam. Filhos da puta. Tentei um pai e um filho americanos, nada. Saudades do Brasil. Ninguém se comoveu. Eu mostrava a mala e dizia “é que senão eu vou ter que pagar 25 dólares de excesso de bagagem!”. Mas a desconfiança era maior que a compaixão. Eles provavelmente pensavam que se tivesse armas ou drogas na minha mala, eles se ferrariam ao assumir a paternidade do troço... Cagões filhos da puta. A fila foi andando e o cara gordo que olhava os tickets e encaminhava o pessoal para o ônibus não tinha uma cara muito amigável. Chegou a minha vez.
- How many people?
- Just me.
- Too many bags, man.
Filho da puta. Tava me enchendo o saco essa porra de “too many bags, man”! Que merda! De novo:
- What can I do?
- I don’t know. Talk with that man” – e apontou para o cara que estava botando as malas no bagageiro. Então tive uma ideia tipicamente brasileira. Deixei uma mala de canto e entrei na fila só com uma. O novo plano infalível era simples: como o cara pegava as malas e nem olhava para a cara das pessoas, eu largava uma, voltava para o fim da fila, e despachava a outra! Genial! E foi o que fiz: despachei a primeira e peguei a outra e voltei para o fim da fila.. Mas o gordo filho da puta me reconheceu e, vendo a minha tentativa de malandragem, interrompeu meu plano infalível. “You need to pay for the extra bag, man”. Filho da puta. Então porque não disse isso antes, cacete?? Por que eles não dizem de cara “vai ter que pagar?”. Por que fazem todo esse drama antes de cobrar?? Filho da puta do caralho. Acabei pagando de novo. Mas isso não podia continuar assim, senão todos os descontos que consegui iriam para o espaço!
Fiz a viagem preocupado com isso. Saí logo depois do meio-dia. A minha chegada em Pittsburgh era as dez da noite e eu partiria as cinco da manhã para Detroit. Por isso, nem peguei hotel, nem hostel nem porra nenhuma. O plano era catar um lugar para ficar nesse tempo, um McDonalds ou algo assim. Então, às dez em ponto, chegamos em Pittsburgh. A cidade parecia bonita, bem arrumada e tal. Estava frio pra caralho. Menos cinco graus. Não sei se já falei isso, mas nem sempre os ônibus da Megabus saem ou chegam de rodoviárias, às vezes o troço todo é na rua mesmo.
E esse era o caso de Pittsburgh. Ele parava em diagonal à rodoviária, do outro lado da rua. Mas fiquei feliz de ver a rodoviária, pois logo de cara vi que a cidade era absolutamente deserta e não tinha nada aberto, então, teria aonde passar a noite.
Entrei na tal rodoviária. Foi então que me caiu a ficha e fiz o cálculo: se eu continuar pagando 25 dólares por bagagem extra, até chegar em Louisville vou pagar 75 dólares. E a minha mala nova da Wisdom, dura, grande (sem piadas), custou 55 dólares. Olhei para a mala velha e que já estava arrebentando que trouxe do Brasil e concluí: vou despachar essa merda e botar tudo na mala nova. Bom, não tinha certeza se caberia tudo na nova, mas fui para o banheiro tentar.
Fiquei mais de meia hora no banheiro. O policial que estava no plantão entrou umas três vezes para espiar o que eu estava fazendo. Ele entrava e me via lá, com as duas malas escancaradas, cuecas, meias, camisetas, livros e o meu boneco Gonzo esparramados por tudo. Quase uma hora depois, saí do banheiro com uma mala lotada e a outra vazia. Mas pensei: “se eu largar essa porra aqui, podem pensar que é um atentado. Sei lá, melhor não arriscar”... e fui lá falar com o policial, que sei lá porque, tinha cara de argentino. Ele disse para falar com o pessoal da empresa Greyhound. Falei com um funcionário que disse “apenas largue na lixeira”. E foi o que fiz.
Aliviado, com uma mala a menos, tinha umas seis hora ainda para esperar. Havia Wi Fi livre e tomadas por todos os cantos. Isso é Estados Unidos, porra! País desenvolvido é outro nível!
Fiquei lá um tempo, mosqueando na internet, até que já era mais de uma hora da manhã e resolvi abrir o Word e escrever um texto para o blog. Estava eu lá, concentrado, quando o relógio apitou duas horas da manhã. O texto estava fluindo. De repente, vi um policial gordo, negro, com um vozeirão pedindo o ticket pra todo mundo. Quem não tinha ele mandava embora. Mas ele falava como se estivesse lidando com um cachorro, não com um ser humano. Fiquei tranquilo, estava com o meu ticket ali. Continuei escrevendo até que ele parou na minha frente:
- Do you have a ticket?
Mostrei meu ticket. Ele olhou e perguntou se era da Megabus. Eu disse que sim. Aí ele disse que a Megabus era na rua. E não deixou eu falar. Eu abri a boca e ele disse “você entendeu, é do outro lado da rua, não aqui!”. Eu queria dizer que faltavam três horas para o ônibus sair, mas ele não deixou! E simplesmente começou a gritar “leave!” apontando o seu dedo gordo para a rua.
Tchê, se eu fosse um mendigo, tivesse pinta de traficante, de sei lá o quê, ainda haveria uma mínima justificativa, mas porra, eu estava relativamente bem vestido, com meus oclinhos e tudo, trabalhando no computador, e com um ticket – só que um ticket de outra empresa! E a porra da rodoviária estava praticamente vazia!!! Mas não tinha como discutir porque ele simplesmente não deixava eu falar! Então, fui para a porra da rua. Dei uma volta mas não achei nada aberto para entrar. Voltei para lá e entrei num espaço fechado que há entre a rua e a rodoviária, apenas para não ficar congelando no frio de quase menos dez negativos que faziam naquela hora. Deu uns dez minutos até o filho da puta voltar e dizer:
- O senhor não entendeu o que eu disse?
Eu abri a boca mas o filho da puta fardado não deixou eu terminar de falar:
- A megabus é ali – e apontou para o outro lado da rua. – Vá para lá. Você não pagou para estar aqui. E não volte aqui se não quiser problemas.... – e ainda foi falar com o segurança, apontando para mim, provavelmente dizendo para ele não deixar eu entrar novamente.
Filho da puta. Desgraçado. Policial do caralho! Vou te encontrar no inferno e vou comer teu cu, seu filho da puta de merda!
Não tive opção. Mas ainda faltavam mais ou menos duas horas para o ônibus! Saí andando para o outro lado. Nada, tudo fechado. Tirei umas fotos e tal, até que decidi ficar no lugar de onde saem os ônibus da Megabus. Tive que botar de novo uma calça jeans por cima da outra e mais uma meia. Pulava na calçada pra tentar me esquentar. E xingava o filho da puta do policial de todos os palavrões possíveis e imagináveis. Desgraçado. Isso é desumano, porra. E ele realmente tinha o jeito de que se estivessem ali uma mulher grávida ou um senhor idoso ele mandaria para a rua do mesmo jeito. “Você não pagou para estar aqui”. Nunca vou esquecer essa frase. Essa é a frase imperativa desse país. Para tudo tem que se pagar. Se você não pagar, ninguém vai ligar para você. Você será um zé ninguém, um filho da puta desprezível, um ser do mesmo nível de um rato ou de uma barata. Eu deveria ter comprado um ticket ali, na hora, e ter enfiado naquele cu gordo dele. Por um momento odiei até a raiz esse país e, principalmente, Pittsburgh. Prometi nunca mais voltar para essa cidade, apesar de que, de resto, até era mais ajeitadinha do que as outras...
Antes das cinco chegou a porra do ônibus. Mas você conhece a lei de Murphy. Pois é. Ela se aplicou novamente. Eu era o primeiro da fila e não acreditei quando o motorista do ônibus chegou na minha mala com uma trena e uma balança. Filho da puta ao cubo! Que porra de país é esse???? A vontade que tinha naquela hora era de voltar para o Brasil e nunca mais pisar nessa porra de país. Queria rasgar o cu do Tio Sam e enfiar ali todo o ouro do mundo, se é isso que ele quer! E, se pá, me juntaria à turma de Fidel e contra-atacaria essa porra.
O desgraçado, que era fisicamente parecido com o policial gordo da rodoviária, mediu a mala e disse, frustrado: “It’s ok”. Mas na hora de pesar disse que acima do permitido. Eu perguntei de novo:
- What can I do?
E ele:
- Leave something.
Como assim, “deixe alguma coisa?”. Deixar no cu dele! Desgraçado filho da puta. Eu sem dormir, com frio, e esse filho da puta me diz isso. Mas aê uma criatura divina mudou um pouco a imagem que eu estava formando de Pittsburgh. Uma senhora idosa disse “vou largar minhas coisas e venho pegar alguns pertences que você tirar da mala”. Obviamente, tirei meus livros. Aí a porra da mala passou no teste do peso e eu botei uns 10 livros na sacola de plástico que a velinha trouxe. Ela ainda guardou um lugar na parte da frente do ônibus e me contou que era de Pittsburgh. Assim, finalmente, o pesadelo acabou e, até que enfim, embarquei rumo a Detroit, a terceira parada dessa porra.
Agora fica a pergunta: que porra de diferença faz para a merda do ônibus se os meus livros ficam comigo lá em cima ou no bagageiro, cacete??? Será que o Obama pode me responder????

3 Comentários:

  • Rindo aos litros! Hahahahahahaaaaa!

    Por Blogger Marcos, às 10 de abril de 2014 às 03:31  

  • German!
    Fuck man! Na verdae toda essa porra é normal quando falamos de low cost. Na Europa tu conseguia passagem de aviao por 5 euros, mas só podia levar bagagem de mão, com medidas exatas e peso máximo. É o mesmo esquema. O negócio é dosar as bagagens, deixar coisas em bagageiros e viajar com o essencial.

    fucking policeman!

    Por Blogger Zaratustra, às 10 de abril de 2014 às 18:58  

  • Eu ri tanto que veio um policial norte-americano me cobrar 5 dólares pelo "excesso de risadas"

    AHUSHUASHUAHUSHU

    Por Blogger Pedro Henrique Krüger, às 11 de abril de 2014 às 14:43  

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