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sábado, 15 de fevereiro de 2014

Rito de acasalamento

Nos dividimos em nações, países, continentes, estados, cidades, bairros, etc. Acreditamos, baseados na nossa própria lógica, que somos superiores aos outros animais. Falamos inúmeras línguas diferentes ao redor do globo. Habitamos o planeta há milênios, mas certas coisas nos colocam praticamente lado a lado dos outros animais. Pensei nisso ao ver uma cena em Miami que me fez lembrar de um documentário que vi certa vez na National Geographic e que tratava do rito de acasalamento do mundo animal.
Em várias espécies de pássaros, por exemplo, quando a fêmea está na época do acasalamento faz com que os machos entrem em uma competição para ver qual canta melhor. Já em algumas espécies de macacos, o macho dança e faz palhaçadas tentando mostrar que é melhor do que os outros. E, a partir de quem impressiona mais, a fêmea escolhe o seu príncipe encantado do mundo primata.
Pois bem, e aqui estamos nós, fazendo metaforicamente o mesmo ritual no século XXI, independente de nacionalidade, cor ou classe social. A cena que vou narrar agora é comum na raça humana, e aposto que todos os leitores já estão carecas de ver. No entanto, a forma como tudo aconteceu foi tão clara e direta que, mesmo sabendo que “os animal tem uns bicho interessante” – como cantaram os Mamonas Assassinas -, fiquei embasbacado. Enfim, vamos à cena, sem julgamentos, conforme nos ensinaram os papas do jornalismo objetivo.
Saio do shopping Dolphin Mall, em Miami, Flórida, Estados Unidos. Estou caminhando pela calçada. Uma loira vistosa caminha poucos metros a minha frente. Veste calças brancas justas, blusa verde e tem cabelos dourados que vão até a cintura, que balançam no mesmo ritmo de suas ancas e nádegas, de um lado para o outro. Poucos carros passam pelo local, pois há faixas de segurança, quebra-molas, etc, afinal, é o pátio do shopping. Um cara comum, que não chega a ser um galã de novela da Globo, passa em um conversível branco. Cena normal em Miami, pois aqui parece que todo mundo tem conversível, afinal, é verão o ano inteiro (em fevereiro, inverno nos Estados Unidos, a média é de 25ºC). Ela, que está na fase de acasalamento, em meio a outros carros e outros motoristas, escolhe esse. Pede para ele parar para tirar uma foto. Ele fica todo animado. Ela tira a foto com o motorista e o carro. Conversam alguma coisa que não posso ouvir, e o carro segue adiante. O motorista de trás, em um BMW conversível, assistiu toda a cena. Ele vai dirigindo vagarosamente ao lado da loira, roncando o motor forte, como se fosse um lobo uivando para a loba no cio.
Ela atende ao chamado, afinal, ele é o principal macho em potencial ao redor, e, na competição por atrair à fêmea, o carro equivale ao canto do passarinho ou a dança do macaco (pelo menos nessa cena, não estou dizendo que é sempre assim na raça humana – às vezes é o melhor carro, noutras o melhor dançarino, o melhor conversador, o mais bonito, o mais rico, o mais isso, o mais aquilo).
Bom, voltando à cena do carro em Miami, após essa breve competição pela fêmea, ela escolhe o seu macho. Tira uma foto e depois entra no conversível, onde vão fazer o restante do ritual de acasalamento, que no caso do ser humano, não tem como objetivo final a reprodução. Porém, assim como no caso dos animais, depois que o macho cobrir a fêmea, ele vai se retirar e guardar as suas habilidades de conquista para a próxima no cio... Afinal, como os outros bichos dessa imensa floresta, somos todos animais, não? E eu?
Eu também. Mas de momento, só observo.
Um bom resto de semana a todos.
*Texto a ser publicado no JMissões.

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