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terça-feira, 22 de abril de 2014

Chicago Tribune – Beijinho no ombro

Ao contrário de Washington DC, aonde devido ao pouco tempo em que fiquei na cidade acabei não marcando uma visita no Washington Post, dessa vez eu teria tempo suficiente para tentar agendar uma visita no maior jornal de Chicago: o Chicago Tribune. O processo foi simples: eu entrei no site do jornal e enviei um email para alguém de lá, que imaginei que pudesse me ajudar. Então, encaminharam-me para uma das editoras, Margaret Holt. Ela disse que não havia nada específico para visitantes de fora, mas como eu expliquei que era um jornalista brasileiro que estava na New York University (NYU), todas as portas se abriram e ela me convidou para ir numa quinta-feira de manhã.
Quinta-feira cheguei uma hora antes do combinado.
Dei uma volta nos arredores, aonde tem uma estátua de um locutor (pois, assim como no Brasil tem grupos com emissoras de rádio e jornal – como o Grupo RBS - o Chicago Tribune pertence a Tribune Company, que também tem uma rádio, que fica no mesmo prédio). Quando entrei na recepção, percebi que guardinhas e porteiros que te olham desconfiados, que tentam te intimidar e se acham a última bolacha do pacote não são exclusividades brasileiras. Pedi para falar com a Margaret, então a mulher com cara de bunda ligou para ela e disse para eu aguardar. Preenchi uma “mini-ficha” aonde tinha que colocar meu nome e organização. Pensei em botar Farc, Al-Qaeda, Grêmio ou coisa assim, mas coloquei “Brazilian Government”. Sei lá, de repente aqueles gorilas gigantes poderiam pensar que eu era o presidente desse país bizarro que se chama Brasil. Mandaram-me para o quinto andar.


No corredor até o elevador, você já vê um monte de quadros, com matérias, fotos, etc. Chegando no quinto andar, você entra num Hall aonde há várias placas de jornalistas do Chicago Tribune que venceram o prêmio Pulitzer.
Apenas para contextualizar, o jornal é o maior de Chicago e o oitavo de maior circulação nos Estados Unidos e foi fundado em 1847, ou seja, cobriu diversos temas históricos, que estão estampados nas capas postas em quadros pelos corredores, como o anuncio do fim das duas grandes guerras, os conflitos sociais de 1968, títulos de baseball, futebol americano e basquete, posse do Obama e coisas do gênero.
Enfim, no quinto andar encontrei a Margaret, uma senhorazinha que não quis tirar fotos. “Tire a vontade, menos de mim”. Ela me tratou muito bem e me mostrou as salas de redação do quinto e do sexto andar (as duas são gigantes).
Há várias salinhas com paredes de vidro, aonde acontecem umas reuniões misteriosas e as salas dos editores. O editor, que agora me fugiu o nome e estou com preguiça de olhar na internet, é o típico estereotipo de editor antigo de jornal americano: cabelos brancos, ar pensativo – como se as principais decisões do mundo estivessem em suas mãos – olhar sério, uma semi-carranca na testa (creio que para intimidar os jornalistas mais novos), etc.
De início, achei que a minha visita ficaria só nesse “aqui é isso, aqui é aquilo, aquele é Fulano, aquele outro é Beltrano”. Mas não. De repente fomos para uma sala de reuniões e a Margaret disse “aqui é aonde acontecem as reuniões dos editores, que define a capa do jornal”. Então, começou a chegar gente que, pela postura, deviam ser os editores. Ela me apresentou a todos eles individualmente, e depois, antes da reunião começar, disse que havia um visitante, e falou brevemente sobre o que eu estava fazendo nos Estados Unidos. Eles me olharam com curiosidade, e o editor de Mundo falava um português meio precário – morou dois anos no Rio de Janeiro como correspondente.
A reunião na verdade não é muito diferente do que todas as reuniões de pauta dos jornais de Santo Ângelo, Ijuí, Porto Alegre ou Rio. Na verdade, é tudo padronizado. Mas, não tive como não lembrar das reuniões de pauta do Jornal da Manhã, aonde você apresentava uma lista de pautas (havia um mínimo para cada um) e tinha que defender a sua ideia (às vezes elas eram simplesmente cortadas sem dó nem piedade nem explicação). Claro que, em Chicago, você tem muito mais coisa acontecendo. Então, cada editor falou as matérias que tinha para aquele dia, tentando vender seu peixe – afinal, é sempre bom estar na capa. Alguns até usaram apresentações de Power Point e foi muito legal ver o editor de política mostrando uma foto do Obama tirada há poucos minutos... Durante a reunião, também houve a participação do correspondente em Washington. Parecia uma reunião da Liga da Justiça, pois o editor chefe apertava um botão e a voz dele vinha de algum lugar. Ele também falou sobre o que tinha para o dia e defendeu suas matérias. Ah, e o diretor de arte e fotografia também mostrou vários power points mostrando o que estava fazendo. No caso, era quase tudo relacionado ao sumiço do avião da Malásia, pois ele ainda estava sumido e aquele era o principal assunto de momento.
Óbvio que também há piadinhas, risadas e contação de história. Você também consegue identificar os perfis: tem o novinho metido a intelectual, com gel no cabelo e óculos com armação preta e grossa, o velho experiente que está com cara de que está cagando e andando pra todo mundo, o editor-chefe com ar de “vou te demitir”, a mulher ousada, a gordinha assustada, o brincalhão, o irônico que na sua fala a cada três palavras da uma alfinetada em alguém, etc. Pena que não pude tirar fotos da reunião, pois era tudo “confidencial”
Logo após a reunião, eu troquei umas palavras com o editor de mundo. Ele perguntou de que estado eu era, e quando eu falei Rio Grande do Sul, ele sorriu e disse: “Grêmio?”. E eu, “yessssss!”. Então, ele disse no “soccer” torce para o Flamengo. E, antes de eu ir embora, a Margaret me deu um monte de livretos que eles publicam nas edições de domingo (incentivando a literatura). Pelo que vi, são livrinhos escritos por autores locais. Também ganhei diversos cadernos de cultura, aonde tem matérias sobre livros, literatura, etc. E, ao se despedir, ela se dispôs a me ajudar no que eu precisasse na minha pesquisa.
Ao descer novamente para o primeiro andar, acabei indo para o lado errado e fiquei alguns minutos perdido. Enquanto andava e suava frio, imaginava os seguranças me vendo nas câmeras, prontos para atacar. Então, quando finalmente achei a saída, despedi-me da galera da portaria e segui rumo a minha limosine presidencial que me aguardava do outro lado da rua... Olhei novamente para a turma da portaria e mandei um beijinho no ombro – honrando a tradição brasileira em solo americano.

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