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terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Cale a boca, jornalista!

Quem tem alguma dúvida de que o regime militar que comandou o Brasil entre 1964 e 1984 foi um regime com princípios nazistas e fascistas está CONVOCADO a ler “Cale a boca, jornalista”, livro do escritor e jornalista Fernando Jorge. Aliás, eu “conheci” Fernando Jorge através de suas colunas na Revista Imprensa e já gostava de seus textos. Agora passo a ser um de seus grandes admiradores, pois a história do Brasil lhe deve muito pelo levantamento feito sobre o absurdo regime. O livro também traz histórias de outras ditaduras, como a de Getúlio, ou ainda, do período de transição da independência, etc, mas o que mais chama a atenção é o período em que a milicada tornou o Brasil uma terra de malucos raivosos que escolhiam sem muitas justificativas pessoas para torturar a matar. Se um milico olhasse para a sua cara e te achasse com cara de subversivo, ou se ele pensasse que você conhecesse um subversivo, você poderia ser preso, ficando dias e dias sendo torturado até 18 horas e, se tivesse sorte, você morreria para não precisar mais sentir tanta dor. É essa a impressão que deixam os relatos que estão no livro. Aliás, a caçada aos “subversivos” era uma legítima caça as bruxas, pois o conceito de subversivo era completamente subjetivo. Você poderia ser preso como subversivo, por exemplo, se estivesse andando pela rua com um livro na mão de algum autor de esquerda. Pior ainda se fosse algum livro de Marx, que hoje é praticamente uma bíblia nas universidades.
E o pior é que eu, ingenuamente, achava que no período que antecedeu as Diretas Já, lá por 1980, não aconteciam mais tantos absurdos. Ledo engano, pois os assassinatos e torturas seguiram até o último minuto do governo Figueiredo. Aliás, eu como brasileiro me sinto no direito de emitir a seguinte definição sobre esse traste: ele foi um grandíssimo dum filho de uma puta.
Eis um resumo do que aconteceu, colocado em um trecho sintetizador da página 162:
“Ali, ‘em defesa do movimento de 1964’, era praticada a arte de flagelar o corpo humano. Elementos do Exército, desferindo murros, arrancaram dentes do jornalista Milton Coelho da Graça. Os testículos de um agitador camponês, cujo apelido era Índio, foram amassados com tenazes. Dos canais auditivos do cidadão Gildo Rios saía o pus, em conseqüência da ruptura dos seus tímpanos, dos golpes que recebera nas orelhas. E o próprio coronel Hélio Ibiapina viu o suplício infligido ao professor Assis Lemos, da Paraíba: enfiaram, no ânus deste homem, um papel molhado em álcool e depois o ascenderam, puseram-lhe fogo... Churrasquinho, eis o nome dessa tortura, uma variante do clister elétrico”.
Os relatos são absurdos. Eis, na sequência, a partir da página 163, o seguinte relato de uma das perseguições impostas pelos militares:
“[...] Havia fundamento nesse terror do jornalista, pois o coronel Darcy Villocq Viana espancara selvagemente o líder comunista Gregório Bezerra. Este foi acolhido, no quartel do Batalhão Motomecanizado, com golpes de cano de ferro na cabeça, pontapés e coronhadas por todo o corpo, sobretudo no estômago, no abdômen e nos testículos. Após a recepção, Gregório ficou estendido no cimento de um xadrez, mas Villocq continuou a surrá-lo, exibindo baba pelos cantos da boca e vomitando ‘termos pornográficos que nem as mulheres mais decaídas do baixo meretrício seriam capazes de pronunciar’. Depois a fera quis introduzir a barra de ferro no ânus da vítima, porém não conseguiu [...].
Colocaram o líder comunista de bruços e embora ele estivesse encharcado de sangue, com os dentes todos partidos, VIllocq pisou na sua nuca, enquanto os demais algozes sapateavam naquele pobre corpo moído. Terminado este trabalho, ergueram o homem e o obrigaram a pisar numa poça de ácido. Logo, em poucos segundos, o ácido deixou a sola dos pés em carne viva. Imaginemos os urros lancinantes de Gregório Bezerra, como isto deve ter sido atroz. [...].
O coronel, após se deter em frente do edifício do CPOR, concitou os alunos, os oficiais e os soldados a lincharem o rebelde. Ninguém atendeu, o que aumentou a sua fúria. Mais adiante, num cruzamento, Villocq impediu o fluxo do trânsito e voltou a bater em Gregório, enquanto alçava a voz:
- Linchem este bandido! É um monstro! É um incendiário! Queria fazer a revolução comunista, a serviço de Moscou! Queria entregar o Brasil à Rússia soviética! Tinha um plano para incendiar o bairro da Casa Forte e matar todas as crianças queimadas! Matemos este Bandido! Venham, batam, até ele morrer. Vinguemos os crimes que ele cometeu, agora está amarrado, não pode reagir!
Tudo inútil, ninguém aceitou o convite. A espumar de ódio, cada vez mais raivoso, VIllocq pulava e surrava o prisioneiro, querendo que o povo apreciasse aquela sordidez. Chocadas, as pessoas viravam o rosto [...]”.
E segue a história. Mais adiante, o coronel leva Gregório para a sua casa, mas a própria esposa pede, chorando, para que ele pare com aquela loucura psicótica.
O pior é que histórias como essas, no regime de 1964, não foram exceção: foram regra. E muitos foram torturados e até mortos sem sequer serem o que os milicos chamavam de “subversivo”. Tem gente que, para causar mal para um desafeto, denunciava-o como “subversivo”, e o pobre diabo ia para a cadeia ser torturado por dias a fio, ouvindo perguntas sem ter idéia de quais eram as respostas.
E para aqueles que pensam que Vladimir Herzog (foto) foi o único jornalista morto sob tortura nesse período, enganam-se. Fernando Jorge identificou pelo menos outros 19 jornalistas que foram mortos pelos militares sob tortura, todos identificados, inclusive com as fotos deles mortos com os rostos desfigurados. Isso em um período de 20 anos (e fora os que não foram identificados pelo jornalista, que se restringe, principalmente ao eixo Rio-São Paulo). Só com os números de Fernando Jorge, é um jornalista morto e torturado por ano. Fora os “não-jornalistas” e mais aqueles que desapareceram e nunca mais foram vistos. Todos caçados, presos, torturados e mortos.
Teve ainda o caso de uma cidadezinha, contado no livro, onde foram presas pessoas comuns, sendo colocadas em caminhões sem comida, sem poder dormir, e levando porrada dias a fio. Mortas de sede e fome, quando os milicos lavavam os caminhões com substâncias químicas, essas pessoas brigavam para beber aquela água podre, misturada às fezes. Teve ainda um depoimento que aponta que um sujeito falou para o outro e disse: “fulano, me avise quando for urinar, porque não agüento mais de sede”. Isso não é tão cruel quanto foi o nazismo?
Agora, depois de ler esse livro (que tem muitos outros casos de psicose aguda), fico me perguntando, por que os livros das escolas, e a cultura brasileira em geral, apresenta o nazismo e o fascismo como algo completamente diabólico e o período de 20 anos de regime militar não recebe o mesmo tratamento?????? Porra, as maluquices e o sadismo eram simplesmente idênticos!!! Os dois eram malucos. Os dois queriam eliminar o diferente através da morte (e quanto mais cruel, melhor). Ou seja, eu passei pelo colégio sem conhecer essa maluquice que aconteceu em nossa história, mas terminei o segundo grau sabendo muito bem a maluquice que foi o nazismo e o fascismo!!!
E, para os mais novos (como eu) que não eram nascidos na época ou eram muito pequenos, e para os mais velhos que têm memória curta, aí vai uma entrevista que foi publicada na época no Jornal Nacional, e que está contada no livro, envolvendo o sanguinário e psicopata general Nilton Cruz. Vejam como alguns milicos de merda se achavam Jesus Cristo em terra brasuca:

http://www.youtube.com/watch?v=IWuggz3aWhw

O pior é que esse retardado mental facínora, pelo visto (ele deu entrevista a um dossiê sobre a ditadura da Globo News – que também está no youtube) parece que está vivo. E o pior: solto!!!! Esse é o nosso Brasil!!!!!! Pior que ao ouvir ele falando na Globonews todo velhinho, quem não conhece suas histórias, até pode se iludir, e pensar que ele é bonzinho. Mas a verdade é outra e diversa, como diria meu primo Alemão: generalécos também envelhecem. E aqueles que ele mandou para o além, estão o esperando na porta de lá!
Sem nada mais a declarar. Fim.

1 Comentários:

  • Minha adolescência e juventude foi toda vivida durante o regime militar. A verdade é que as pessoas tinham medo, muito, então todo mundo baixava a cabeça e fechava a boca!
    Tive um vizinho que era comunista, volta e meia os milicos buscavam o cara e levavam pro quartel, onde era torturado, choques elétricos, afogamento, essas coisas, depois de uns dias ele aparecia....moído, ficava uns meses se recuperando.
    Depois o cara foi pro Mato Grosso, onde foi devidamente assassinado.
    Pra quem obedecia não complicava, mas vá se reunir com um grupo qualquer, possuir livros ditos proibidos, emitir opiniões contrárias ao regime em público você era sério candidato a sumir misteriosamente.
    Ah, você não falou dos caras que eram jogados ao mar de uns 2000m de altitude.

    Por Blogger Marcos, às 1 de fevereiro de 2012 às 10:22  

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