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segunda-feira, 19 de abril de 2010

Milicada pererecada

Tem uma perereca na minha janela. Aqui do lado. Enquanto abria o Word para escrever esse texto, ela começou a passear pela janela de vidro (só que ela está do lado de fora) e fiquei observando a sua barriga branca, com as patas verde claras, enquanto ela caçava alguns mosquitinhos, pernilongos, e afins. Tentei ver se era uma perereca ou um perereco, mas não sei. O que diferencia as pererecas dos pererecos? Aliás, existem pererecos? Não me venham com essa de perereca macho e perereca fêmea. Para mim, são pererecas e prerecos. Agora está ali, quietinha, com o papo pulsando, provavelmente fazendo a digestão. Pensei até em bater na janela e dar um susto na dita, mas estou numa fase meio Jack Kerouac pós-viagens, de paz e amor com os seres vivos e o planeta. Portanto, é mais provável que eu pegue-a no colo e faça uns cafunés, do que assustá-la. Pobre perereca. Acho que é o espírito paterno se desenvolvendo no meu ser.

Mas enfim, antes da perereca aparecer, eu ia escrever sobre o alistamento militar. Já que as mulheres falam tanto que nós, homens, não sabemos como é estar grávido, elas não tem essa vivência do ano em que o miserável ser do sexo masculino brasileiro passa pelo alistamento militar. A conversa veio à tona no domingo, quando uns amigos de meus pais estavam almoçando aqui, e nós lembramos que quando eu tinha 18 anos, pouco depois de ter sido dispensado pelo “excesso de contingente”, veio um caminhão cheio de milicos aqui em casa me buscar. Para a minha sorte eu estava em Porto Alegre procurando emprego. Até consegui um, como vendedor ambulante de radinho de pilha do Paraguai. Caso alguém, algum dia, por falta do que fazer, resolver escrever uma biografia minha, não pode esquecer disso: já fui vendedor ambulante de radinho pirata do Paraguai no centro de Porto Alegre. Inclusive, uma tarde percorri toda a Farrapos tentando vender os malditos radinhos, sem êxito. Em uma semana vendi só um, e não fiquei no emprego. No entanto, também escapei do quartel graças aos radinhos de pilha. Talvez por isso volta e meia eu trabalho em alguma rádio desse mundo.

Voltando ao quartel, lembro-me que nos exames físicos eu fui o penúltimo a chegar na corrida (não teve como ser mais lerdo que um gordinho) e que derrubei uma barrinha no salto em altura, que estava a mais ou menos uns 50 centímetros do chão. Quando a barra caiu, o milico me olhou, deu uma risadinha e disse: “não quer servir, né?”. E eu apenas sorri de volta, confirmando a hipótese.

Lembro ainda que a gente planejava diversas formas de escapar do quartel. Eu cheguei a pensar em tentar encaixar o triângulo no quadrado, naquele teste psicotécnico, que aplicaram da mesma forma que fazem com os macacos que tomam Pepsi e Coca. Mas fiquei com medo de ser encaminhado dali para um hospício. Agora, uma cena clássica aqui no Sul, que todo mundo passa, é o maldito dia em que a gurizada fica em uma fileira formada por mais ou menos uns dez pobres-diabos, e ficam todos pelados na frente de uma mesa com meia dúzia de sargentos, tenentes, e a bosta que o valha, e aqui no sul, sempre (mas sempre mesmo) eles marcam esse exame para o dia mais frio do ano. A gurizada fica de braços cruzados, tremendo, com os seus membros mais encolhidos que uma lesma que recebeu uma pitada de sal em suas costas, enquanto os “poderosos” desse país, ficam lendo jornal, comentando as contratações da dupla Gre-Nal, sem a menor pressa nem boa vontade. Alguns amigos meus, para escapar do quartel, usaram as mais diversas estratégias na entrevista:

- Você bebe? – pergunta algum lunático, que ainda pensa que o Médici está no poder.
- Bebo.
- Com que freqüência?
- Todos os dias.
- Que quantidade?
- Muita.
- Já usou droga?
- Sim.
- Qual.
- Maconha.
- É casado?
- Não, sou homossexual. E você, está livre hoje?

E assim, a gurizada ia bolando formas e mais formas para escapar do quartel. A minha única birra nessa história toda é: por que não pegam jovens que têm saúde, têm capacidade, que querem servir a porra do quartel e são de famílias de baixa renda? Já vi casos onde um jovem saudável, sem perspectiva de emprego na cidade, que queria muito servir, ficou de fora, enquanto outro, que queria estudar, foi obrigado a servir, provavelmente por implicância da milicada. Vá entender. Esse Brasil é mesmo muito foda. E a perereca sumiu da janela.

6 Comentários:

  • Sério Ritter, só na tua janela tem perereca! Você atrai pornografia e afins!
    hauhauahuahua

    Por Blogger Juliany, às 19 de abril de 2010 às 22:13  

  • Cara, ri demais com a cena dos piá pelados... comigo, pq lembrei direitinho disso... hahaha...

    foda mesmo esse quartel...eu lembro que tinha recem entrado na facul... e nem mesmo com minha testa de titanio, recém reconstituida, eles queriam me liberar... malditos!

    Fiquei uma semana indo lá, olhando aqueles videos idiotas... ateh q se convenceram que eu nao queria e eu fui liberado...


    mas que nada... no meio do ano, perdi uma semana de aulas e estagio pra ir passa mais uma semana no quartel... ~e gente insistente... novamente usei a testa, a asma ateh que me liberaram... espero que pra sempre...


    hahaha... massa o texto... que bom neh, pq o de baixo ali tah foda ritter... com todo respeito de alguem que admira teus textos... hehe...

    abraço!

    Por Blogger Mr. Gomelli, às 19 de abril de 2010 às 22:18  

  • Porra alemao! Ja em Londrina o negocio è mais light. Me apresentei em um dia e fui dispensado no mesmo, sem teste fisico nem nada. E chegou uma hora em que o capitao ou coronel (sei là) perguntou quem queria servir, e como bem observado no texto, muita gente desempregada opta por ser militar pra pelo menos garantir um salario, uma renda mesmo que seja pequena. E tb fui dispensado pelo excesso de contigente.

    Por Blogger Zaratustra, às 20 de abril de 2010 às 04:56  

  • ai ai

    Falando em quartel, meu pai que recrutava os meninos aqui! Mas ao contrário do que vocês contam, aqui os moleques todos querem servir! Vinham aqui em casa encher a paciência pedindo pro pai colocar eles na lista!!
    Vê se pode!

    =))

    Por Blogger Juliany, às 20 de abril de 2010 às 10:03  

  • quartel eh a coisa mais inútil que já inventaram... e não compare com gravidez, afinal foi só um dia, e gravidez são meses... tah filhote! bjus

    Por Blogger Carolina, às 22 de abril de 2010 às 10:24  

  • Pode ser engraçado ou não, depende do ponto de vista. Não podemos esquecer que não podemos generalizar, e confundir a pessoa (militar) com a instituição. Devemos lembrar, também, que não podemos permitir que seja um exercito de pessoas humildes de classe baixa, servindo e morrendo para que os filhos de ricos fiquem tranquilos em suas casas. Pense numa empresa, que naum contrata quem nao va somar. Não adianta pedir emprego, tem que mostrar que pode contribuir. O Exercito tem que ser da mesma forma. Não pode chamar para servir so porque o jovem quer servir, atras de um pequeno salario. E olha que e pouco. Devem ser chamaod quem pode trazer beneficios para o exercito, e quem tem chance de, caso queira,continuar na Força. Convocar para servir os pobres e liberar os ricos é hipocrisia. Historicamente, os principes lideravam exercitos. Hoje ainda vemos principe servindo. Rico ou pobre deve servir e defender a patria mãe, e suas terras e sua familia, como irmaos. Se nao for pra ser assim, cria-se uma legiçao estrangeira, onde homens lutam por dinheiro, e desertam facilmente, pois nao tem amor pelo país.

    Por Blogger Unknown, às 25 de julho de 2010 às 07:24  

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