Questões
Li o Estação Carandiru, do Drauzio Varela, provavelmente em 2003 ou 2004. Recordo-me que estava na graduação, e que pensei muito sobre aquele livro na época. Inclusive, escolhi para apresentá-lo na aula de Redação e Expressão Oral. De cara, considerei essa obra um livro-reportagem, tema que pesquiso desde os tempos da graduação, e que tem uma matéria super-interessante na Revista da Livraria Cultura, revista na qual mencionei no post anterior.
Enfim, li o livro, e de lá para cá frequentemente penso sobre tudo o que aconteceu. Além disso, também acompanhei por alto a trajetória do Drauzio Varela, que na verdade, pelo papel que ele exerce hoje na Globo, me põe a questionar sobre a rigidez na obrigatoriedade do diploma para exercer funções que, a priori, são de jornalistas. Ele tem comandado bons trabalhos dentro da Globo, e o próprio livro-reportagem escrito por ele só foi possível graças a sua profissão de médico. E mais: nenhum jornalista conseguiria ter a confiança dos presos como ele teve. E mais ainda: ele mesmo conta no livro que os presos detestavam a imprensa.
Mas tudo isso me veio à mente novamente porque ontem de madrugada passou na própria Globo o filme Estação Carandiru. Lembro-me que até assistir a esse filme, eu tinha um imenso preconceito contra as adaptações de bons livros para o cinema. Pergunte ao Pó, de John Fante, é um ótimo exemplo de como se estragar um bom livro. Enfim, vendo o filme e me lembrando do livro, foi que fiquei me questionando: mas e se a polícia não tivesse invadido? Uma, a imprensa provavelmente cairia em cima, dizendo que “correram” dos presos. Outra, a população reprovaria a atitude do governador, já que, como um preso fala no fim (do livro e do filme), era véspera de eleições. Enfim, seria uma espécie de “desmoralização” pública da Tropa de Choque da polícia paulista e do próprio governo. E, agora a pouco, lendo o livro “Metamorfoses da cultura liberal”, do francês Gilles Lipovetsky, deparei-me com o seguinte trecho, onde ele está refletindo sobre esse crescente liberalismo pós-moderno que coincide com uma vontade cada vez maior de querer “doar”, “ajudar ao próximo” e “fazer ações comunitárias”: “vemos bem os limites da ação humanitária, que não elimina os massacres e que, com freqüência, serve de álibi à nossa impotência política”. O cara é francês, mas ele, no meu entendimento, explicou exatamente o que ocorreu no episódio do Carandiru. Uma ação política, em uma situação dificílima, pois se não invadissem, haveria a execração da época. E invadindo, houve a condenação histórica, registrada por Drauzio Verela no livro, e massificada pelo cinema e pela Globo.
1 Comentários:
A postura do Drauzio é a de educador, disseminador de informações, na tentativa de construir conhecimento com a população/pacientes. Essa postura é um objetivo da formação médica, mas a grande verdade é que os médicos, muitas vezes, não passam de receitadores de remédios, falsos moralistas e intrusos da vida alheia...
Gostei do texto, gosto do seu blog!
Juliany Luz - O Rebate
Por Juliany, às 19 de maio de 2009 às 21:28
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