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domingo, 19 de abril de 2009

Estranho no ninho

Sexta passada, estava eu, deitado no sofá da sala, esperando vir a inspiração para escrever, que teimosamente não vinha. Fui para a aula de Sociologia da Comunicação, com o Juremir Machado da Silva, e eis que lá pelas tantas ele falou justamente sobre isso e deu a fórmula da inspiração para quem escreve (não necessariamente escreve bem, mas escreve), que é o meu caso. Ele disse que, quando não está inspirado para escrever as suas colunas diárias no Correio do Povo, ele expõe o seu cérebro e as suas idéias ao maior número de estímulos possíveis, e esses estímulos são o combustível para as idéias e para a inspiração. É aquela velha história que comentei aqui outra vez: quanto mais tenho coisas para fazer, mais tenho vontade de escrever e mais produzo. Quanto menos tenho coisa para fazer, menos inspiração tenho para escrever e menos produzo.
Pensando nisso tudo, como já se passa quase uma semana desde o meu último post, resolvi fazer um tratamento de choque: eu, gremista de nascença, que chorei vendo o Grêmio ganhar do Náutico na Batalha dos Aflitos, que pirei quando o Aílton pegou na veia aquele chute na final do Brasileirão de 96 contra a Portuguesa, enfim, que viajava de Santo Ângelo a Porto Alegre para ver jogos no Olímpico, fui até o estádio Beira-Rio hoje assistir a final do Gauchão entre Inter e Caxias. Claro que, além da vontade de expor meu cérebro a vários estímulos e contradições, eu também tinha ficado de mandar uma crônica sobre o jogo para o Jornal das Missões de Santo Ângelo. Mas aqui, o que importa é a exposição não só do meu cérebro, mas do meu corpo, que por pouco não foi espedaçado.
Saí de casa ao meio-dia. Após almoçar do lado da Redenção, estava procurando um ponto de ônibus para ir até o Beira-Rio, quando me deparei com um casal e um cara que estavam em uma parada, todos com camisetas do Inter. Aproximei-me do grupo e fiz uma pergunta idiota: “aqui passa ônibus para o Beira-Rio?”. E a resposta foi óbvia: “sim”. Os caras puxaram conversa comigo, lembraram dos três grenais que venceram nesse ano, falavam: “esses gremistas merecem perder mesmo, são todos uns miseráveis filhos da puta”, e eu, com um sorriso amarelo no rosto, suando as mãos, os pés, o sovado, respondia “pois é, não é fácil”. Para me enturmar, contei do jogo da Seleção que fui, a história do ingresso por 20 pila e tudo o mais. Entramos no ônibus, cheio de colorados. Parecia que estava escrito na minha testa “gremista”. Ou eu estava ficando paranóico, ou estavam todos me olhando atravessado. E eu, suava. Chegamos no Beira-Rio, e eu me separei desse grupo o mais rápido possível. Só então que me dei conta que o meu moletom verde destonava das camisetas exclusivamente vermelhas e brancas. No máximo, se via uma jaqueta preta ou bege. Mas nada verde, nem grená, muitos menos azul. Logo lembrei da toca do Inter: o Juventude. Pronto. E não adianta vir com o papo dos 8 a 1 do ano passado, porque a gana dos colorados pelo Ju é explícita. Tentei me consolar: pelo menos meu moletom não é azul.
Rondei o Beira-Rio, achei o portão de acesso à imprensa, e me encaminharam até as sociais. No entanto, como era só eu e eu, sem microfone, sem câmera profissional, sem filmadora nem nada, não fiquei no local destinado às emissoras de rádio e TV. Fiquei no meio da torcida mesmo. Manjam aqueles filmes sobre nazismo onde o cidadão judeu está no meio dos nazistas, que falam “vamos matar todos os judeus do mundo” e o judeu tem que fingir que é alemão, ou pelo menos, não-judeu? É mais ou menos assim que eu me sentia. Se descobrissem que eu era gremista ali... era uma vez um Dudu...
A torcida cantava, e eu nada. O jogo começou, e eu nada. O Inter fez um, e eu nada. O Inter fez dois, e eu nada. Mexia na máquina, tirava fotos e mexia no radinho para disfarçar. Pior que a porra do time não parava de fazer gols. Melhor comemorar, antes que desconfiem. Ergui timidamente o braço quando o Inter fez o quarto ou o quinto, não lembro. Perdi as contas. E eu, que vendo a pequena torcida do Caxias fazer mais barulho do que a do Inter minutos antes do jogo, achei que os jogadores poderiam se comover com aquilo e dar sangue e vencer o Inter no Beira-Rio. Que nada. Doce ilusão. O Inter fez o sexto, o sétimo, e o cara do meu lado me abraçava, emocionado. Eu falei o óbvio: “desse jeito vai ser no mínimo dez”. Tentei dar empolgação a minha fala, mas não sei porquê, tudo o que eu dizia soava falso para mim mesmo. Sou péssimo ator.
No intervalo, um cara puxou papo comigo. Perguntou se eu torcia para o Juventude. Eu disse que não, que simplesmente não tinha me ligado na cor do moletom antes de sair de casa. Então, ele perguntou se eu era acostumado a ir os jogos do Inter. Eu respondi que não era de Porto Alegre, mas sim de Santo Ângelo, que até então só tinha ido no Beira-Rio no jogo da Seleção. Ele me olhou e disse, e com ar compreensivo, murmurou: “percebe-se”. Naquela altura, era melhor passar por alguém que vive fora do mundo do futebol do que saberem a verdade.
No meio disso tudo, veio um cara entregar um jornal do Sindicato dos Árbitros do Rio Grande do Sul. Tem uma briga que está ocorrendo aqui entre o Eduardo Bueno (o Peninha, historiador e jornalista) e o árbitro Carlos Eugênio Simon. Em outro post quero falar sobre isso, mas, resumidamente, o Simon ganhou R$15 mil em um processo contra o Peninha que escreveu o livro “Grêmio, nada pode ser maior”. E eu, querendo tirar com o cara que entregava o jornal, acabei corneteando: “não tem uma coluna do Peninha aí não?”. O cara deu risada, mas foi então que vi que uns dois ou três torcedores me olhavam atravessado. Cheguei a pensar ter ouvido alguém me sussurrando no ouvido: “já ouviu aquela famosa frase: a casa caiu”. Mas foi só fruto da minha imaginação.
Começou o segundo tempo, e o Caxias reagiu. Ou o Inter recuou. Sei lá. Mas o fato do Tite ter tirado o D’Alessandro e o Nilmar mostra que o treinador ainda tem muita consideração pelo seu ex-clube da Serra. Senão, a minha previsão feita no intervalo de 14 a 0 teria se confirmado.
O jogo acabou, entre cantos colorados e xingamentos aos gremistas, e eu fui pegar o ônibus de volta para casa. No caminho até a parada, uma guria ainda comentou com o namorado: “olha só, aquele ali é palmeirense. Eu heim”. Segui de cabeça baixa e peguei o T-4, que veio lotado de torcedores, que cantavam e xingavam ainda mais os gremistas. Numa dessas, eles começaram a cantar aquela música, que por sinal, copiaram da torcida do Grêmio: “atirei o pau no....”. Eu, tentando disfarçar, fui cantar junto mas, por força do hábito, acabei saindo com “atirei o pau no... e mandei toma no .... macac....”. O que eu senti então, ao ver uns três torcedores me olhando atravessado de novo, é indescritível. Como diz uma amiga da minha mãe: não passava nem um alfinete naquele lugar. Comecei a suar. Fez-se um silêncio de velório dentro daquele ônibus lotado de colorados. Alguns cochichavam. Estariam discutindo se me degolariam ou enforcariam? Meu estômago começou a doer. Queria que voltassem a cantar, que parassem de me olhar, que quebrassem aquele angustiante silêncio! Afinal, eram campeões! Foi então que vi a passarela em frente a PUC. Pra minha sorte, estava sentado ao lado da porta de saída do ônibus. Desci atarantado. Entrei esbaforido na PUC, e duas gurias, também ofegantes, diziam “quase mandei tomarem no cu esses colorados”. Então, ainda trêmulo, olhei para elas e perguntei:
- Vocês também são gremistas?
- Somos.
- Eu também.
E rimos juntos, como loucos. E assim, eu expus o meu cérebro a inúmeros estímulos em uma tarde nublada de domingo e cheguei a uma conclusão: jogo do Inter no Beira-Rio, nunca mais!
Abaixo, a foto tirada do Clicrbs, do você no estádio. Quem me achar ganha um brinde das lojas Dudu Mania:

6 Comentários:

  • Essa é uma experiência que eu faço questão de não ter.

    Por Anonymous Anônimo, às 19 de abril de 2009 às 19:45  

  • Falou falou mas nao disse o resultado do jogo po!

    Eu nao iria pra la nem com seguro de vida

    Por Blogger Zaratustra, às 20 de abril de 2009 às 09:05  

  • Bah, essa é uma pauta que eu não gostaria de cumprir. Ainda mais quando uma amiga/colega Lara Nasi resolve mandar um e-mail para todos os colegas com uma certa foto denunciando... Isso merece um novo post no blog, vc não acha!
    Mas a tua próxima aventura em estádios vai ser na final da libertadores e no Olímpico!!! Abraço!

    Por Blogger Dilea Pase, às 21 de abril de 2009 às 17:12  

  • tem coisa mais linda do que ver meu amor na maior torcida do campeao do mundo? lindo amore adorei ,bjos te amo muito.

    Por Blogger cris aguiar, às 23 de abril de 2009 às 15:12  

  • Duduuu! Eu não li o texto até ao final. mas.... achei um errooooooooo. Tu colocou crase antes de Porto Alegre. Meeeee. Estou chocada! Buáááá.
    kkkkkk. Beijo. PS- não vai crase pq se você substituir por Voltei, ocorre DE e não DA. Aiaiaia.

    Por Blogger Marcinha, às 24 de abril de 2009 às 16:47  

  • Dudu, já tive uma experiência ao inverso, por ser colorado. A sensação de perigo iminente é assustadora, principalmente se você está na arquibancada no meio da torcida. Nunca mais!
    Abraço do Marcos!

    Por Blogger Marcos, às 9 de maio de 2009 às 15:40  

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