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domingo, 1 de junho de 2008

Deixa comemorar, pô!


Outro dia estava escrevendo a minha coluna para o jornal Gazeta do Povo, de Cândido Godói, e tratei do tema da entrevista que fiz com o José Aldo Pinheiro, que falou sobre o distanciamento entre a imprensa e dirigentes, comissão técnica, técnicos e jogadores da dupla grenal, que importaram um modelo europeu permitindo apenas que os treinadores falem em entrevistas coletivas e escolhendo um ou dois jogadores para falarem com as rádios e jornais após os jogos. Enfim, é o incansável esforço que há alguns anos estão fazendo para acabar com o futebol.
Afinal, afastando esse pessoal todo da imprensa, os clubes estão distanciando os jogadores da torcida, que é a razão de existir do futebol. Concordo com aquela idéia do David Coimbra, de que o futebol veio para substituir esportes e guerras mais violentas, como no tempo dos gladiadores. O futebol serve para que durante aqueles 90 minutos o torcedor extravase a sua necessidade de xingar e ofender alguém, que ele tem que reprimir na sua convivência em sociedade. Os jogadores também. E a partir do momento em que você proíbe o torcedor de assistir o jogo pulando nas arquibancadas, cantando, xingando o árbitro, o jogador adversário, de tomar umas e outras durante o jogo (se não tomam durante, tomam antes ou depois, e o resultado é ainda mais grave), o torcedor acaba fazendo coisas muito piores, como por exemplo, marcar lugar para brigar, ou matar uma pessoa que está andando na rua com a camiseta do time rival.
O mesmo acontece com os jogadores. Eles não podem mais comemorar, não podem fazer sinais para ninguém, não podem mais nem dar “alô” para a mamãe no orelhão atrás da goleira (aliás, alguém pode me responder porque tem orelhão em alguns estádios atrás da goleira? Desconfio que tenha a ver justamente com a imprensa...), não pode mais sair de noite (imagina o Garrincha se estivesse jogando hoje em dia. O segundo maior jogador da história do futebol simplesmente não seria jogador de futebol, porque seria barrado pelo técnico), entre outros “não pode”.
Por ironia do destino, os técnicos entraram na dança! Eles não podem mais criticar a arbitragem, caso contrário são punidos, não podem mais criticar o técnico do outro time, e em algumas competições já não podem mais nem ficar de pé na beira do campo! Mas onde andamos? Não se pode mais fazer nada nessa porra?! Então terminem com o futebol de uma vez. Ah, sem contar na bobagem de punir o clube fazendo jogo com portões fechados! Mas que falta de criatividade! Então recolham a renda, encaminhem para alguma entidade séria (acreditem, mas ainda existem entidades sérias no Brasil, mas que com certeza não é a CBF), ou senão, que multem os clubes, que tirem o mando de campo, que façam jogar em outro estádio, mas assim não dá!

Fico imaginando o dia em que teremos o seguinte jogo:

**** Clássico grenal. Final do Campeonato Gaúcho de 2013, véspera de Copa do Mundo no Brasil. O jogo é no estádio Beira-Rio (até porque ninguém sabe se o Olímpico vai estar em pé até lá), mas o Inter foi punido porque um torcedor jogou uma laranja no árbitro que não marcou um pênalti claríssimo na semifinal contra o Juventude, e validou um gol da equipe da Serra em impedimento, e isso quase eliminou o colorado. Com isso, o jogo está ocorrendo com portões fechados. Esse é o jogo da volta, no jogo da ida houve empate em 0 a 0, com o mando de campo do Grêmio. Mas, devido aos pedidos dos presidentes da dupla grenal, apenas repórteres fotográficos e da RBS podem ficar na beira do campo, então, os repórteres de rádio e demais profissionais da imprensa ganharam um número limitado nas cabines, que aliás, ficam bem longe do campo. Com isso, dá para se ouvir claramente o que os jogadores falam dentro de campo. Em certo momento, Marcos Manuel (outra moda é chamar o jogador pelo nome duplo), revelação do Grêmio, faz uma falta em Rodolfo Alfredo, do Internacional. O gremista acode o colorado:
- Tudo bem com você, amiguinho?
- Sim, e com você?
- Também.
E os dois saem, cada um para o seu lado.
No final do primeiro tempo o técnico do Grêmio chama o árbitro de “bobo” e é expulso. O do Inter da risada, mas o segundo árbitro vê, e também o expulsa. Já o zagueiro Alex Pereira, do Grêmio, solta um peido e o fiscal da federação também vê, e chama o árbitro, que faz sinal para que isso não se repita. Do outro lado, Anselmo, goleiro reserva do Internacional boceja, e como isso também está contra os princípios previstos no regulamento, leva cartão amarelo.
O jogo é chato, e o resultado se encaminha para um zero a zero, quando aos 44 minutos do segundo tempo, Marcos Manuel faz o gol da vitória do Grêmio. Ele volta para o seu campo caminhando, de cabeça baixa. O juiz apita o final do jogo, todos se abraçam, e todo mundo dentro de campo está feliz e unido, vencedores e perdedores, árbitros, dirigentes e comissão técnica, a Paz teria reinado por absoluto...
Teria reinado por absoluto caso as duas torcidas organizadas de Grêmio e Internacional não tivessem marcado um confronto para as proximidades da Praça Garibaldi, que acabou resultando na morte de 55 torcedores, três cachorros, um gato e um pássaro, que foi atingido por uma pedra.
No outro dia, todos os jornais apresentaram a mesma manchete:
PAZ E MORTE NO FUTEBOL GAÚCHO

Pobre Charles, pobre Müller...

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