Justamente quando dei uma pausa nas
memórias da minha primeira ida para a Europa acontece o histórico incêndio que
praticamente destrói a Catedral de Notre Dame. Quando defini os lugares que
visitaria em Paris durante a curta estadia na cidade, a famosa igreja do
corcunda estava no topo da lista, junto com outros pontos imperdíveis, como
torre Eiffel e Arco do Triunfo. Nunca imaginava, enquanto admirava a parte
externa e interna de uma das catedrais mais famosas do mundo, que aquilo tudo
estaria em cinzas poucos meses depois. Lembro que as obras de restauração já
estavam acontecendo e havia uma fila imensa para subir às torres quando passei
por lá. Como tinha muitos outros lugares para ir, acabei desistindo da fila,
tirando algumas fotos à frente da catedral e outras dentro.
É triste pensar que, mesmo em um
país riquíssimo se comparado com o Brasil, algo assim acontece. Eu,
particularmente, detonei o Brasil quando ocorreu o incêndio no Museu Nacional
do Rio de Janeiro – e continuo detonando -, então, fico imaginando como alguém
que estudou a fundo a basílica e que é apaixonado por ela e toda a sua história
esteja se sentindo agora. Já li de tudo na internet sobre o incêndio, inclusive
teorias da conspiração que devem fazer todo o sentido para o pessoal do Brasil
Paralelo. Mas não vou entrar nesse assunto agora...
Gosto de visitar lugares que
conheço um pouco sobre a história para ficar viajando no tempo enquanto admiro
a paisagem (natural ou urbana). Sobre a Catedral de Notre Dame, li atentamente
o capítulo do livro “Paris”, do Airton Ortiz, em que ele conta de forma contextualizada
a construção da basílica sob o comando do bispo Maurice de Sully em 1160, ou
seja, cerca de 900 anos atrás. A partir de então, ele especifica as medidas, os
estilos e a história da igreja, que não vou repetir aqui (vale a pena ler
direto na fonte, ou seja, no livro de Ortiz). Apenas lembro que, conforme
aponta o jornalista, Notre Dame já foi parcialmente destruída durante a
revolução francesa, sendo restaurada justamente a partir do sucesso do livro de
Victor Hugo que criou o personagem corcunda que vivia por lá. E, assim como eu
olhava toda a catedral pensando nisso tudo e muito mais, quem for até a
catedral daqui a 50, 100 ou 200 anos vai ficar tentando imaginar as chamas que
deixaram o mundo inteiro atônito através de filmagens feitas por telefones
celulares...
Foi com esse clima de “quero
visitar lugares de história” que também sai da catedral indo diretamente para a
livraria Shakespeare & Company, uma das mais famosas e históricas de Paris
e ponto de encontro de monstros da literatura ao longo da história, inclusive
da geração beat, quando Kerouac e
seus amigos passaram pela França. Não é permitido tirar fotos na parte interna (sempre
lotada), mas vi livros de Bukowski, Henry Miller, George Bataille e muitos
outros clássicos do mundo inteiro para vender em francês e inglês e outras
línguas. Fiquei tentado a comprar alguma coisa, mas meus euros eram escassos.
Ainda nesse clima de intelectualidade (odiada por extremistas e ignorantes que gostam
de se informar exclusivamente por vídeos nas redes sociais) passei pelo
Pantheon e pela Sorbonne, por onde passaram centenas e centenas de intelectuais
clássicos no pensamento universal, tais como Michel Foucault e Edgar Morin.
Também andei pelos gramados seculares dos jardins de Luxemburgo, que imaginava
que ficavam afastados da cidade, mas na verdade ficam ali, meio que no centrão
do troço todo. Aquele gramado com bancos e o lago ao centro dão um clima
interiorano surreal para a capital francesa.
Bom, poderia escrever textos e mais
textos sobre Paris (bem como os outros destinos), mas antes de relatar a minha
ida a um jogo do PSG e de contar a visita a Torre Eiffel e Arco do Triunfo,
finalizo esse relato sobre a cidade das luzes dizendo que ainda fui até os
números 113
da Rue Notre-Dame Des Champs, onde morou Hemingway, 58 da Rue Vaugirard, onde
moraram Scott e Zelda Fitzgerald, 36 da Rue Bonaparte, e 6 da Rue du Pot de Fer,
onde morou George Orwell quando viveu as histórias de “Na pior em Londres e
Paris” (foto).
Impossível descrever o que senti ao parar na frente de cada uma
dessas casas, voltando no tempo, imaginando os seus moradores ilustres que
mudaram a história do pensamento universal e da minha vida passando por aquelas
ruas e entrando naquelas residências. Devo a todos eles por me apresentarem o
mundo e a humanidade através de uma perspectiva totalmente gauche e imperfeita,
como todos nós somos, conscientemente ou não.
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