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terça-feira, 12 de dezembro de 2017

My my neighbor, Ralph Ellison

Antes de morar em Nova York, entre 2013-2014, eu já tinha lido Trópico de Câncer, de Henry Miller. Porém, na época em que realizei tal leitura, eu nem sonhava em pisar nos Estados Unidos, nem ligava para a origem de Miller. Anos depois, para ser mais precisamente, neste final de 2017, comprei Sexus, do autor norte-americano e me dei conta de que o cara era nova-iorquino da gema (como dizem os cariocas). Na real, ainda faltam 182 das 582 páginas para concluir o livro. No entanto, hoje aconteceu algo que me fez interromper a leitura e escrever esse texto (e não foi o jogo do Grêmio).
Inicialmente, pensei em sentar na frente do computador para escrever sobre as referências que Miller faz a Riverside Drive, a rua em que ele morou com a sua namorada nos anos 1920 ou 30 (sou ruim de matemática para subtrair a idade dele pelo ano em que ele lá morou). Em resumo, eu também morei na mesma rua: mais exatamente, na 725 Riverside Drive, cruzamento com a 150 Street. Marquei até algumas citações, das quais coloco a seguinte, escrita em reflexões feitas ao observar New Jersey, do outro lado do Rio Hudson, local por onde eu também gostava de caminhar e que é palco de várias cenas cinematográficas e literárias: “Olhei para a margem de Jersey do outro lado do rio. A mim parecia desoladora, mais desoladora ainda que o leito empedrado de um rio seco. Nada que tivesse alguma importância para a raça humana jamais aconteceria ali. E nada haveria talvez de acontecer pelos próximos mil anos”. A graça, é que Miller descreve a vida em Riverside Drive, mesma rua em que morei, e fico viajando no tempo, imaginando ele naquelas ruas, andando pela beira do Hudson com a sua namorada. Aliás, Mona, a sua namorada é uma puta história... (uma puta história sobre uma prostituta, literalmente falando, sem degradar a profissão).
A síntese da síntese é a seguinte: Miller era casado com Maude (a mulher que transformou o seu quarto em um necrotério, simbolicamente falando) e tinha uma filha. Ele se apaixona por uma prostituta de Manhattan e larga a mulher para ficar com a dita cuja – e, assim, eles vão morar em Riverside Drive. Namorando a prostituta, ele se torna amante de sua ex-mulher. E, lendo essa porra toda, lembrei que eu tinha fotografado uma placa dedicada a um escritor que, até então, eu não conhecia, mas que sabia que não era Henry Miller. E, então, agora, há poucos minutos atrás, quando vou procurar a foto da tal placa, deparo-me com a imagem da homenagem feita a nada mais nada menos do que Ralph Ellison.
Quase desfaleço diante do computador (isso que hoje à tarde sofri e quase enfartei assistindo ao Grêmio ganhar do Pachuca pelo Mundial de cubes). Explico-me sobre tal sentimento.
Voltei de Nova York na metade de 2014. Lá por meados de 2015, postei no Facebook algo como: “estou procurando dicas de livros para ler nas férias”, ao que meu amigo Luiz Maurício Azevedo indicou “O homem invisível”. De quem? De nada mais nada menos do que Ralph Ellison. Tudo bem, o livro poderia ser um abacaxi, só que não. Eu encomendei o livro e o devorei em poucos dias. Sem exageros, é um dos melhores que já li: uma puta narrativa, dramática, histórica, com um senso de humor refinado e envolvente. Um daqueles livros que dá uma preguiça de ler quando você o pega nas mãos, mas que quando você começa a ler, torce para que nunca termine.
Um daqueles livros em que é impossível o sujeito terminar de ler e continuar sendo a mesma pessoa. Quando finalizei a leitura, fiquei com ele na mente por muito tempo (na verdade, até hoje), pensando sobre tudo: a ida do personagem do sul para o norte, a vida no Harlem, a cena do despejo, a vergonha de não ter dinheiro para pagar o aluguel do quarto, as cartas vergonhosas indicando o sujeito para emprego.. enfim, tudo. É um livro para não ser esquecido e ser relido ao longo da vida. Mas, lendo agora Henry Miller, é que fui nos meus arquivos fotográficos checar quem era o escritor que tinha uma placa na frente do prédio em que eu morava em Nova York e constato que esse autor era simplesmente Ralph Ellison. Eu morava em 725 e ele em 730 Riverside Drive. A placa em homenagem a ele está numa pracinha, localizada na frente dos dois prédios (o que eu e o que ele morava). Só quem ama literatura sabe o que isso significa.
Só quem leu “O homem invisível” tem noção da emoção de descobrir, mesmo que anos depois, o que foi ter sido vizinho espiritual de Ralph Ellison por poucos meses. E, independentemente de você ter morado em Riverside Drive ou não, no Harlem ou não, em Nova York ou não, eu indico do fundo do coração a leitura de “O homem invisível”. Vale a pena ficar uns dias entrando menos na internet, vendo menos TV , lendo esse livro. Tenho certeza que você não será mais o mesmo (a mesma) depois de tal leitura.
Hasta!



PS - Na época em que li "O homem invisível" escrevi sobre ele no blog, vai lá nos arquivos e procura ;)

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