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quarta-feira, 15 de março de 2017

Fim

Fuçando na mini biblioteca da minha ermã, encontrei o livro Fim, da Fernanda Torres. Sempre fui fã dela enquanto atriz e, como estava procurando algo mais light para ler nos horários de folga, surrupiei temporariamente esse romance que mistura comicidade, tragédia e reflexões filosóficas sobre a vida. Acabei de ler há pouco. Para ser sincero, há exatamente dois minutos e 46 segundos. Confesso que foi uma grata surpresa a obra de Nanda (sou íntimo dela, ok?). Pela temática, achei que pudesse ser uma narrativa forçada, com humor previsível, etc, só que não foi. O foco principal da história é a vida de cinco amigos, já mortos: Álvaro, Sílvio, Ribeiro, Neto e Ciro. Os cinco narram, em primeira pessoa, alguns dos principais momentos vividos enquanto habitavam esse planeta (principalmente no que se refere a romance e à relação entre eles). Cada capítulo leva o nome do personagem em questão. Alguns secundários aparecem com textos escritos em terceira pessoa. E a autora se vale de um jogo temporal interessante (uau, que acadêmico!). Que merda, tenho pavor quando começo a escrever aqui como se estivesse escrevendo um artigo... Um, dois, três, resentado...!
O fato é que me senti inspirado para escrever justamente para tentar escolher com qual dos cinco me identifiquei mais. Portanto, listo e apresento brevemente abaixo os cinco personagens para, ao final, tentar escolher qual eu seria, caso tivesse que escolher uma das cinco vidas para representar a minha (ou para viver). Coisa de criança, sei, mas o que é a vida senão um monte de brincadeira de criança? (algumas de mal gosto, admito).

Álvaro (1929-2014): É o último a morrer do quinteto. Uma palavra define ele: brocha. Não apenas na cama, mas na vida. É o que dá a pincelada mais geral dos outros, inclusive, conforme Fernanda explica em uma entrevista, porque foi do conto sobre Álvaro que nasceram os demais e o livro como um todo. Entra na monotonia do casamento até que a sua mulher, Irene, termina por traí-lo com um instrutor de academia. Mesmo se sentindo indiferente a ela, opta por se separar. Age com frieza e não tem ânimo para começar a tudo novamente. Sinteticamente, acaba brochando na vida.
Sílvio (1933-2009): É o porra louca da turma. O Stifler do quinteto. O cara que bebe, cheira, fuma, faz bagunça, quer comer todo mundo – por pouco não quer comer os amigos. Acha os outros quatro uns babacas acomodados em suas vidinhas domésticas. Também se casa, mas quando a mulher descobre uma de suas amantes, pensa que foi uma dádiva de Deus, pois assim passa a se dedicar apenas às orgias. Trabalha num banco, de onde não espera nada e não quer promoção, amizade, porra nenhuma, apenas quer tirar o salário para curtir a vida. Acaba pegando uma ex-namorada hippie e gaúcha do Ribeiro e, juntamente com outra gaúcha, forma um relacionamento tríplex. Mente para os amigos que se mudou para o Rio Grande do Sul, mas na verdade se transferiu para Niterói, aonde vive uma vida desregrada e cheia de libertinagem (como diriam os adolescentes contemporâneos, uau, que forte!). Morre completamente bêbado e chapado em um carnaval carioca.
Ribeiro (1993-2013): é um chato ao quadrado. Todo certinho, acaba se apaixonando por Raquel, a hippie que depois fica com o Sílvio. Mesmo tendo namorado pouco tempo com ela, a vida dele acaba ali. Fica simplesmente obcecado pela ex e a dúvida sobre se ela estava dando para o Sílvio ou não o corrói por dentro. Depois que separam, descobre o viagra e só quer pegar virgens. Obviamente, acaba morrendo do coração.
Neto (1929-1992): se o Ribeiro é um chato ao quadrado, o Neto é um chato ao cubo. Todo metódico, é feliz com a sua vida doméstica ao lado de Célia, que casou virgem com ele. Dorme cedo, de pijamas, e acorda cedo. Célia, é lógico, odeia os outros quatro. Totalmente fiel, não gosta de festas e bebedeiras. Mesmo com o casamento entrando em crise – pois a Célia também é uma chata de galoche – ele entra em depressão profunda quando a parceira morre. Acaba com a própria vida em 1992.
Ciro (1940-1990): É o primeiro a morrer, com 50 anos. É o ídolo dos outros. Garanhão, bom papo, come quem quiser. Assim, ele se casa com Ruth, que é a deusa dos olhos de todo mundo. Os dois formam o casal perfeito. Porém, nem a beleza e o encanto dos dois superam a monotonia do casamento. Ruth sofre com as primeiras traições até que se deprime e o larga de mão. Ele arranja uma amante e, aos poucos, vai levando as suas coisas para outro apartamento, até que, quando vê, está morando lá. Oficializa o divórcio e dispensa a amante quando percebe que a vida doméstica a dois está tendo início de novo. Fica solteiro, comendo de geral (como diria a letra de um funk carioca), faz algumas loucuras com o Sílvio mas, sua vida acaba com um câncer fulminante em meio a tudo isso. A definição que a Nanda usa, na boca do personagem, para definir a doença é cruel e real: “é uma roleta russa. Puxei o gatilho e tinha a bala”. No seu leito de morte, ainda come uma enfermeira gostosa mas frustrada com a própria vida e com o seu noivado.

Bom, de maneira muito resumida, esses são os cinco personagens do livro. Nas minhas palavras ficou parecendo bem clichê e sem graça, mas a Fernanda Torres transforma essa trama em um texto atrativo e com algumas reviravoltas e surpresas (induz o leitor a pensar que vai acontecer X e acontece Y). O único defeito que eu apontaria é o uso excessivo de personagens – alguns sem importância – que acabam fazendo com que a gente se confunda entre o que aconteceu com quem. Bom, então voltemos à pergunta: com qual dos cinco eu mais pareço? Caralho, o Álvaro, o Neto e o Ribeiro são muito chatos. Até posso ser chato, mas não como eles. Na verdade, suas vidas são monótonas demais. São mortos vivos. Até o Ribeiro, que fica solteiro, joga tudo fora pela sua chatice (e destaco aqui o realismo com muito humor e ironia de Torres, pois conheço muita gente com personalidade parecida com os cinco). Sobram, então, o Sílvio e o Ciro. Acho que não sou tão porra louca quanto o Sílvio. Penso que só faria as coisas que ele fez se eu realmente perdesse tudo e não tivesse mais pelo que lutar. E o Ciro, bom, eu não tenho nada a ver com o Ciro, pois ele é aquele cara que as mulheres dão em cima, de tão bonito e bonachão.
Portanto, por eliminação, entre os cinco, diria que o que mais parece comigo é o Sílvio. Mas com a ressalva que, se eu tivesse que escolher uma dessas cinco vidas para ser a minha, eu – e toda a torcida do Flamengo – escolheria a do Ciro. E se você se confundiu com os nomes - Ciro, Neto, Álvaro, Ribeiro e Sílvio - não se preocupe, pois eu até agora, mesmo depois de ter lido o livro, ainda confundo. E, provavelmente a Nanda também. Mas nada que tire o prazer de ler esse mix de comédia com drama. Até fiquei curioso para ler o segundo livro dela, uma coletânea de crônicas publicadas na imprensa brasileira. Enfim, chegamos finalmente ao fim do meu comentário sobre Fim.

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