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quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

O anjo pornográfico

Acabei de ler ontem “O anjo pornográfico”, a biografia de Nelson Rodrigues escrita por Ruy Castro. Esse livro fazia tempo que eu queria ler e, como caiu em minhas mãos meio que por acaso, acabou furando a fila dos outros que estão na estante. Mas vamos ao que interessa...
O livro, como a maioria das obras literárias, tem pontos fortes e fracos (são poucos os que só têm pontos fortes, e os que só têm pontos fracos, não passo da décima página – como os de Paulo Coelho). O principal ponto fraco, na avaliação de um leitor que tem mais interesse em literatura e em histórias malucas, como eu, está nas extensas descrições feitas sobre o teatro (o que não chega a ser um demérito, pois trata-se de uma biografia sobre um dramaturgo...). Claro que tem muitas interessantíssimas, mas em alguns trechos você lê duas ou três páginas sem entender muita coisa porque você simplesmente não tem noção de quem são algumas das pessoas citadas. E se você está lendo mais ou menos apressadamente, você não para toda a hora para pesquisar no Mr. Google quem é aquela meia dúzia de gente. Mas isso não compromete o todo da obra, apenas não a coloca no mesmo nível de Chatô, o rei do Brasil, de Fernando Morais.
Já os pontos fortes são vários. Gostei muito da recuperação que Ruy fez da vida de Mário Rodrigues, pai de Nelson, e de seu irmão Mário Filho (o que empresta seu nome ao Maracanã). Essas histórias enriqueceram muitíssimo a obra e, como Ruy destaca ao final, esses dois personagens dariam outras duas putas biografias. Outro ponto forte é a linguagem, que foge da idiotice da objetividade, tão criticada por Nelson. Ou seja, é algo mais próximo da literatura do que do jornalismo.
Mas o principal da biografia, obviamente, é a vida do biografado. Nelson Rodrigues, pelo que deu para perceber, era um cara que só se preocupava com o teatro, a literatura (incluindo aí seus subgêneros) e um pouco com o jornalismo (profissionalmente falando, pois suas maiores paixões eram a própria família e as mulheres). Ou seja, foi um sujeito que, diferentemente de Chatô, não ligava muito para quem estava no poder, para brigas de esquerda e direita (apesar de ter apoiado o regime militar por ser declaradamente anticomunista – lembrando que ele teve um filho preso e torturado pela ditadura, que praticamente matou Nelson dos nervos durante anos), enfim, ele tinha suas posições políticas, mas suas obras não tinham essa preocupação. A obra dele, como é de conhecimento mais do que público, preocupava-se mais com a tragédia, a comicidade e o sexualismo do dia-a-dia.
Para ser sincero, até hoje só li dois livros do Nelson: À sombra das chuteiras imortais, uma coletânea de crônicas escritas por ele sobre futebol e publicadas em jornais da época, e Mentira, que fui descobrir no livro do Ruy que é um romance publicado a partir de um folhetim que Nelson escreveu. Agora, estou curioso para ler o resto, principalmente Vestido de Noiva, Beijo no Asfalto e A falecida. Ah, e óbvio, A vida como ela é, que já vi um pouco na TV.
Assim como na obra de Fernando de Morais sobre Chatô, em “O anjo pornográfico” também há toda uma recuperação histórica, pelo simples fato de que Nelson convivia com figuras como Getúlio Vargas, ministros, prefeitos, etc. Principalmente quando teve obras censuradas. Já sobre as curiosidades, há uma lista infindável delas. Uma que mais chamou a atenção foi a revelação de que Nelson Rodrigues precisava usar óculos, mas se negava a isso e, dessa forma, ele praticamente não via o que acontecia em campo nos jogos de futebol. Apesar disso, seus textos, que eu li em À sombra das chuteiras imortais, são impressionantes.
Mas a principal surpresa que tive ao terminar a obra foi o estilo de vida que Nelson levou. Sempre foi um sujeito pacato, nada boêmio, que não bebia absolutamente nada de álcool e super família, daqueles que às 22h está de pijama pronto para dormir com a patroa. O único “desvio” do autor, que era conhecido como “tarado”, “depravado”, e por aí a fora, eram as amantes que ele acumulou ao longo da vida. E mesmo assim, o primeiro registro de uma amante só ocorre quando ele já tinha seus 36 anos. Outro ponto que chama muito a atenção são as mortes trágicas na família de Nelson, além das suas doenças (principalmente a tuberculose, que quase o mata mais de uma vez) e a sua infância, onde ele presenciou várias histórias de traição e assassinato, que tanto aparecem na sua obra.
Assim como no Chatô, não tenho muito o quê escrever, pois o vagal leitor deve ler a obra completa, que é muito boa. Como está escrito na contracapa do livro, a história de Nelson às vezes emociona, às vezes deprime e às vezes diverte. Enfim, é um bom livro para quem gosta de emoções diversificadas, de futebol, de cinema, de teatro e, principalmente, de tragicomédias de todos os tipos. Boa leitura a todos!

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