Texto do Anônimo, que não é Gourmet

Quando mudei para Guarapari, em 96, lembro de termos trocado algumas ligações ainda. Uma delas, memorável, quando o Grêmio conquistou o campeonato brasileiro, em meio a uma emoção avassaladora que só a cumplicidade futebolística é capaz de estabelecer entre dois camaradas.
Depois disso, não nos falamos mais e achei que aquela amizade ficaria no passado, como ficaram todas as outras, incluindo a das gêmeas, já mencionadas há algum tempo neste Ababelado.
Mas aí surgiu o Orkut, em 2004, e em meio àquela euforia inicial despertada pelo site, resolvi ir atrás de velhos amigos que não via há décadas, só pra matar a curiosidade. Vasculhei um pouco o sistema de buscas e lá estava o Eduardo, com a mesma cara, mas, aparentemente, muito mais bem quisto entre as mulheres (pelo menos, era o que se podia adivinhar pelas fotos e recados). Não quis mandar recado ou e-mail. Acreditei que o tempo já tinha feito crescer demais as distâncias.
Então aconteceu de eu ir para Porto Alegre em 2005. Tinha acabado a faculdade e decidir prestar um concurso para a Assembléia Legislativa, na capital gaúcha. Não estava muito certo se queria realmente voltar para o Rio Grande do Sul, mas precisava de dinheiro e, na pior das hipóteses, faria uma visita aos meus tios e aproveitaria para curtir um pouco a cidade, a única que me interessa lá. Veio então um feriado de páscoa e meus tios decidiram visitar o resto da família que ainda estava em Santo Ângelo. Fiquei entre aceitar o convite ou ir para Caxias, visitar uma madrinha. Acabei ficando na primeira opção.
Em Santo Ângelo, a casa de meus outros tios, onde por um bom tempo viveram meus avós, ficava próximo à antiga casa de Eduardo. Em meio ao tédio, pensei: “Não custa nada, vou passar lá para ver se os pais dele estão e perguntar como anda o cidadão”. Qual não foi minha surpresa quando o Eduardo, em pessoa, me recebeu com um sonoro: “Mas bá!”. Conversamos um bocado naquela tarde e combinamos de sair para beber à noite. No posto (de gasolina), que era onde bebiam os santo-angelenses, matamos umas boas garrafas cerveja e relembramos histórias como se nunca tivéssemos estado tanto tempo longe. No dia seguinte, passei mal.
No carnaval, ele apareceu em Guarapari. E a amizade se restabeleceu de vez.
***

Outro elemento definidor do caráter do Eduardo é a distração. Digamos que ele é um tanto quanto sonso (no bom sentido, claro, pois a “sonseria” é qualidade nos homens de bom coração). Quando esteve em Guarapari, por exemplo, deixei-o na Praia do Morro, para passar a tarde, enquanto eu ia para a labuta no jornal onde eu trabalhava. Marquei de encontrá-lo às seis, no mesmo quiosque em que o havia deixado. Esperei um pouco e logo avistei sua figura, vindo em minha direção, com um passo de orangotango e um sorriso de orelha a orelha. Sua primeira frase foi: “Perdi meu chinelo!”. Fiquei me perguntando onde estava a graça e não demorei muito a perceber que ele era do tipo que ri da própria desdita. Havia perdido o chinelo numa caminhada pelo Morro da Pescaria. Teve de andar um bom trecho a pé e, pra ajudar, não sabia dizer o nome do morro, que chamava ou de morro do pescador oude montanha da pescaria. Enfim, uma figura.
Em casa, ele saiu para tomar um banho, enquanto eu preparava alguma coisa para comer, enquanto meus pais não chegavam. Foi quando Eduardo apareceu com outra notícia bombástica: “Tu não vai acreditar! Perdi meu cartão!”. Era o cartão que ele utilizava para movimentar sua conta. Sem ele, ficaria limitado a fazer pequenos saques na boca do caixa.
Isso, por si só, já seria um transtorno, mas, obviamente, não parou por aí. O lance é que havia um salário a ser depositado e uma passagem a ser comprada. Resumo da ópera: meu pai teve de emprestar-lhe uma grana para a passagem de volta e o carnaval acabou sendo meio pobrinho, animado com cerveja barata e jogos de imagem e ação (que ele chamava, sabiamente, de “imagination”). O bom é que pra ele todo programa seria genial se atendesse à seguinte interrogação: “Tem praia?”.
Pelo que me consta, ele curtiu a viagem, no melhor estilo “vagabundo iluminado”. Prova disso é que a foto que ilustra seu blogue foi tirada por mim, na Pedra da Cebola, em Vitória.
***
Eduardo é jornalista, leitor de Bukowski e, mais recentemente, estudante de mestrado. Tem uma irmã de belos cabelos ruivos e um pai que atende pelo curioso nome de Nabucodonosor. Da mãe dele, o que lembro, é que tinha tendinite e preparava copos de Nescau de meio litro, que ele bebia entre uma partida e outra de Superstar Soccer.
Formou-se em Ijuí, mora atualmente em Porto Alegre, formou-se em Ijuí e namora uma menina de Santo Ângelo. Sua monografia de conclusão de curso foi um livro reportagem sobre as putas pobres das Missões. Já venceu um concurso de contos e já deu carona ao Jorge Furtado. Um de seus passatempos preferidos é xingar o Arion, que acredito ser uma espécie de alter-ego que ele criou para destilar seu ódio do mundo.
De Santo Ângelo, foi o único amigo que restou. É uma das pessoas mais divertidas que conheço para dividir uma mesa de bar. Acho que se daria bem com o Fausto Wolf. Gostar do Rio ele já gosta".
Só pra fechar: nessa vez em que eu passei o carnaval em Guarapari, que o Anônimo contou, eu pedi demissão para ir no show dos Rolling Stones em Copacabana e, para isso, pedi demissão do jornal onde trabalhava. Contei isso dia desses para um grupo de alunos e um deles arregalou os olhos, olhou para os outros, olhou novamente para mim e disse: "Nossa, o senhor é mesmo mais louco que eu". Enfim, outra hora escrevo um texto contando, inclusive, as partes inéditas dessa minha ida, e que estão no livro reportagem sobre a putaria que fiz quando terminei a graduação. Hasta!
PS: A primeira foto é a mesma que o Anônimo usou no blog dele. E a segunda foi tirada por ele lá em Guarapari. Ah, aliás, descobri, lendo o livro da minha avó, que meu bisavô (pai da minha falecida avó) nasceu no Espírito Santo. Vejam vocês. Outra hora também escrevo mais sobre isso. Agora sim, Hasta la vitoria!
Fim
3 Comentários:
hahahaha... mt bom cara... ele te descreveu muito bem hein... hahaha
é uma figura esse Ritter... hahaha
Abraço ae manolo!
Por
Mr. Gomelli, às 24 de outubro de 2011 às 20:26
porra alemao
Por
Zaratustra, às 26 de outubro de 2011 às 12:27
como alguém perde os chinelos???
Por
Carolina, às 26 de outubro de 2011 às 16:03
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