Professores dessa vida
No entanto, como estava falando, no Sepé tive uma professora que certamente teve muita influência sobre a visão crítica de mundo, às vezes quase revolucionária: Adriana Andreis. E não foi só comigo não. Antes de eu ter aulas com ela, já ouvia da boca do meu irmão as coisas que ela ensinava em sala de aula. “Tu é um boca aberta, guri. Tu não sabe nada do mundo. Espera ter aulas com a Adriana”, dizia-me ele, e eu ficava acuado como um cachorro, com os olhos arregalados e as orelhas baixas, porém, morrendo de curiosidade para saber o que a professora Adriana falava em aula.
Se não me engano, comecei a ter aulas de Geografia com ela na 7ª série. Desde as primeiras aulas, a turma inteira já ficava quieta e concentrada para ouvir o que ela ia nos dizer, algo raríssimo tratando-se de adolescentes com 13, 14 anos. Confesso que eu não conseguiria isso. Uma das questões que ela colocou em certa aula foi: por que os mapas são do jeito que são? Estados Unidos e Europa no norte, o Brasil e a África no sul. Ou ainda: por que o Sul é sul e o Norte é norte? Quem definiu isso? Seria porque o mundo estaria representando um corpo, onde a parte de cima pensa e a parte de baixo obedece? Confesso que são questões que me faço até hoje, sem saber a resposta, mas desconfio que seja por isso mesmo.
Enfim, além do meu irmão e eu, a minha irmã também foi aluna dela. Esses dias, eu sentado aqui, escrevendo raivosamente contra o Gilmar Mendes, olhei para a minha irmã, que tentava planejar comigo um seqüestro de avião para jogar no prédio do Senado, refleti por um segundo, de repente me veio a questão, que repeti em voz alta: será que eu, tu e o Fábio somos assim por termos sido alunos da Adriana?
Ela pensou por alguns segundos e disse: “acho que sim”. Só para esclarecer, a professora nunca deu a idéia de jogar um avião no Senado, e apesar de não faltar vontade de fazer isso, eu e minha irmã também não tomaremos essa drástica atitude. Mas o que eu quis dizer foi que a professora certamente foi uma das pessoas que mais influenciou no que se refere ao nosso espírito crítico de ver as coisas. Basta ver as nossas profissões: eu e meu irmão, jornalistas. E minha irmã, assistente social, marxista convicta, apesar de ter uma boa inclinação consumista capitalista. E entre tantos e tantos professores que tive na escola, certamente a Adriana foi a que mais nos fez pensar. Tanto é que a maioria dos episódios e das falas de professores daquele tempo que eu tenho claramente na memória, 90% ocorreram nas aulas dela. Lembro-me que desfilei feliz da vida fantasiado de morte, com um machado na mão, ameaçando o mundo, como uma forma de questionar se o capitalismo estaria ameaçando o futuro planeta? Isso em 1995, quando o consumismo exacerbado era um monstro ainda em formação, que foi se alimentando ano a ano com a internet e o desenvolvimento da mídia. Se isso é bom ou ruim, é outra questão. Mas também lembro que foi ela que me explicou de uma forma que lembro até hoje o que era capitalismo, socialismo, globalização e tudo o mais. Enfim, ela sabia dar aula, e ao mesmo tempo sabia despertar em nós uma vontade de questionar o porquê das coisas. E pelo que vejo (é só espiar no orkut), até hoje ela segue formando uma legião de seguidores de suas idéias.
Depois do colégio, tive outros professores que seguiram despertando esse espírito de inquietação, de busca por respostas, de questionamento do que está estabelecido e tudo o mais. Entre eles, destaco o Larry, meu orientador de monografia no curso de Jornalismo da Unijuí. E atualmente, no mestrado em Comunicação da PUC, encontrei nesse semestre mais um professor que levanta questões que, como ele mesmo diz, são para te deixar pensando durante todo o final de semana: Juremir Machado da Silva. E além dele, ainda conto com a orientação de Antônio Hohlfeldt. Seguindo um pensamento de Edgard Morin, na autobiografia Meus Demônios: o negócio é sugar todo o conhecimento possível de nossos professores. Principalmente quando eles têm muita qualidade, como é o caso da Adriana. Ah, e queria outra camiseta azul da turma de Geografia de 1995, com o mapa mundi de ponta cabeça. Alguém tem uma pra me dar?
PS: como só tenho a minha foto fantasiado de morte lá em Santo Ângelo, roubei uma do Orkut da professora, com uma das turmas contemporâneas do Sepé.
5 Comentários:
um professor que me marcou muito foi o professor Raimundo...
e o salàrio ò...
Por Zaratustra, às 27 de junho de 2009 às 20:46
uhulles manuxo! eh vero, fazendo aula de docência sempre lembro da prof. adriana com o atlas de "cabeça para baixo", qdo discutimos como romper com a educação tradicional. Com certeza ela é uma das culpadas por eu ser assistente social, uma quase mestre e marxista heheehe e viva la revolucion!
Por Carolina, às 28 de junho de 2009 às 12:13
Caraca! A Adriana! Nunca vou esquecer dessa maluca (isso é um elogio). Não tenho dúvida de que ela é a mãe do nosso senso crítico. E aquele mapa de cabeça pra baixo, que idéia! Não poderia existir técnica de memorização melhor para entender as relações entre norte e sul.
Por ababeladomundo, às 29 de junho de 2009 às 07:58
Até eu já ouvi a história do atlas de ponta cabeça.
Por Unknown, às 29 de junho de 2009 às 21:39
Não gosto muito de jornalistas, quase nunca são críticos. Não gosta tbm de quem alerdea demais que é muito crítico. Não é porque você não é da Globo e escreve umas noticiazinhas do lado do povo que é um "jornalista crítico". Pare de pensar pelo que uma professora disse e deixou de dizer e vá ler "Os caras" de verdade. Marx, Hobsbawn, Gramsci, Meszaros, Ricardo Antunes...
Por Aline L., às 4 de abril de 2010 às 19:13
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