Subo as escadas escuras que ligam o bar à sala. Em cima do chão de parquê velho, encontra-se uma mesa no centro da peça, rodeada por caixas de cerveja, que estão ocupadas por todo o tipo de sucata. Em uma delas, uma meia encardida adormece na ponta, exatamente da mesma forma que repousa um cadáver recém derrubado por uma coronhada. A luz da lua cheia que entra por uma fresta dá alguma cor ao local. Olho para uma pequena escadaria, que leva até o sótão, e percebo um vulto sumindo na escuridão. Apesar da rapidez do objeto, ainda enxergo seu rabo sumindo por entre o vão da porta. Aproximo-me da mesa, puxo uma cadeira, e sento. O braço direito do moletom fica sujo com a poeira. Empurro a cadeira, que enrosca em um pedaço de madeira solto do chão, e vou para o quarto, onde em cima de um colchão, colocado no meio da peça abandonada, estão todas as minhas coisas, completamente bagunçadas. Não é muito: dois pares de meia, duas cuecas, uma bermuda, uma calça, um par de tênis, um boné azul marinho e uma foto dela. Não preciso mais do que isso e de meia garrafa de vinho. No meio das minhas roupas, acho um caderno velho. Começo a folhear na tentativa de encontrar alguma página em branco. Acho-a. Arranco-a, como o homem apaixonado arranca a última peça de roupa e o que sobrou do pudor de sua amada com um único movimento. Depois, passo a procurar por uma caneta em meio àquela baderna, como o amante bêbado que tenta achar o sexo feminino em um quarto escuro às cinco da madrugada. Encontro uma caneta preta, e volto para a sala escura.
Ponho o papel em uma das faixas de luz da lua cheia que entra pela janela. A perna traseira do lado esquerdo da cadeira cai em um pequeno buraco, formado por uma rachadura no chão. No apartamento de cima, um casal começa a fazer sexo, e o barulho me irrita. Enquanto ela geme, ele bate nas carnes saturadas dela. Provavelmente está enrabando ela de pé, já que parece que estão próximos a janela. Tento ver algo, mas não dá. Dou uma tossida, mas parece que eles se excitam mais em pensar que alguém está ouvindo tudo. O volume e a intensidade dos gemidos aumentam. E as palmadas também. Ela pede mais, e ele a xinga de tudo que se pode imaginar. Diabos, como vou escrever desse jeito? Tento me concentrar. Não consigo. Fecho a janela, e ao ouvirem o barulho, ambos parecem gozar. Na verdade, ele goza. Ela finge. Jogo rápido, penso. Provavelmente o marido dela, ou a esposa dele, está chegando. Um crime, logo imagino. Mas não, apenas acaba o barulho.
Volto a olhar para o pedaço de papel que seguro nas mãos. Faz frio. Que diabos aquela ratazana fazia aqui nesse frio? Esses bichos estão cada vez mais ousados, filhos da puta. O frio parece congelar tudo, inclusive meu coração. Começo a suar olhando para aquele papel. Um nó toma conta da minha garganta. Rabisco a primeira letra, e depois, uma puxa a outra, e em pouco tempo a carta está escrita. Uma lágrima caí de meus olhos, e dá ponto final a tudo.
1 Comentários:
bom pacas!
(sò pra colocar lenha na dicussao, escritor precisa de diploma?)
Por Zaratustra, às 7 de junho de 2009 às 09:28
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