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terça-feira, 22 de setembro de 2009

Erico Verissimo e Luis Fernando: tal pai, tal filho

Fazia tempo que não acordava de manhã cedo, olhava para fora, via a chuva, e pensava: “mas que belo dia!”. Pois é, fiz isso na sexta-feira do último dia 11 de setembro, enquanto o mundo desabava em água no bairro Partenon, em Porto Alegre, da mesma forma que anos atrás as duas torres gêmeas desabavam após o histórico atentado que marcou a maior tragédia da história nova-iorquina. Meu ânimo se explicava pela entrevista que havia agendado para aquela manhã com o escritor global Luis Fernando Verissimo, para falar sobre o seu pai, Erico Verissimo, para a minha dissertação de mestrado pela PUCRS, que tem como tema Jornalismo e Literatura. Peguei meu guarda-chuva velho, daqueles que protegem somente a cabeça, e fui para a parada de ônibus, rumo ao bairro Petrópolis.
Desembarquei a umas três quadras do endereço indicado, subi uma pequena ladeira e cheguei na rua onde Erico Verissimo havia comprado aquela mesma casa há 42 anos. É uma casa antiga, discreta, que não chama nem um pouco a atenção pela beleza ou pelo luxo, com várias plantas e flores na frente, ao melhor estilo interiorano cruz-altense. Inclusive, quando Luis Fernando me passou o endereço por telefone, perguntei:
- E qual o número do apartamento?
- Não é apartamento, é casa – respondeu.
Tu vês. Imaginava que um dos cronistas mais importantes da história da literatura brasileira morasse em um prédio hiper-moderno, com mil seguranças e obras pós-modernas no pátio. Mas não. Luis Fernando Verissimo preserva as raízes plantadas por seu ilustre pai. Chegando lá, apartei uma campainha e uma senhora abriu. Luis Fernando estava escrevendo, e ela me convidou para assistir a um vídeo de uma viagem feita por alguém da família às Águas Quentes de Minas Gerais. Além da senhora, que depois descobri que era a esposa de Luis Fernando, Lúcia Helena Massa, também estavam na sala: a filha, Fernanda Verissimo, seu respectivo marido, o americano Andrew Sikes, e a neta de Luis Fernando, Lucinda Heather Verissimo Sykes, que tem pouco mais de um ano. Fiquei observando a mais nova integrante da família Verissimo virar cambota na frente da TV, entre uma resmungada e outra, na tentativa de articular algumas palavrinhas em inglês para o pai, e outras em português para a mãe.
Enfim, eu estava ali, embasbacado com tudo aquilo, quando entrou na sala o próprio Luis Fernando Verissimo. Cumprimentou-me timidamente, e fomos para a biblioteca particular dele, que contém, literalmente, milhares e milhares de livros.
Sentado de frente com um monstro da literatura brasileira (no melhor dos sentidos, obviamente) eu tentei explorar o máximo que pude as informações e o conhecimento dele para usar na minha dissertação.
Entre outras coisas, Luis Fernando Verissimo contou que seu pai, Erico, tinha um programa infantil na Rádio Farroupilha, mas tirou-o do ar porque a censura da época queria ver o conteúdo antes, e como ele ficava com as crianças no estúdio contando histórias na base do improviso, ele resolveu cancelar tudo. Inclusive, Luis Fernando destacou que as primeiras leituras que fez em sua vida, foram dos livros infantis do próprio Erico. “Já o primeiro livro adulto que li foi o Caminhos Cruzados, também do pai. Mas tinha que ler escondido, já que era proibido para crianças na época”, revela.
Além disso, ele ressaltou que Erico sempre lhe deu liberdade total para escrever. “Lembro que quando comecei a escrever ele me disse que gostou do meu estilo e que eu escrevia bem. No entanto, essa opinião é um tanto suspeita, já que ele é meu pai...”, disse, antes de soltar um tímido sorriso.
E foi com a fala pausada e com a sua famosa e característica timidez escancarada na minha frente que ele lembrava de algumas histórias de seu pai, enquanto eu as ouvia atentamente, sem piscar os olhos. Confesso que cheguei a lembrar de uma frase dita pelo próprio Erico, certa vez, em uma entrevista para algum jornal da época: “na verdade eu sou escritor, e quem quer saber o que eu penso deve ler os meus livros, e não pedir para que eu fale”. No entanto, entre um silêncio e outro, eu olhava os livros nas estantes, as fotos e quadros com a imagem de Erico Verissimo espalhados pela sala, e para a cara redonda e simpática de Luis Fernando Verissimo, enquanto pensava: quantas histórias! Terminada a entrevista, ainda dei uma carona de guarda-chuva para Luis Fernando até me despedir e ingressar na chuva novamente, descendo a ladeira, rumo a parada de ônibus. Realmente, esse foi um belo dia de chuva em Porto Alegre.

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