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sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Entrevista com Mazaropi (ok, aceito sugestões para trocar o título...)

Como promessa é dívida, publico aqui, na íntegra, a entrevista completa com o Mazaropi, goleiro campeão da Libertadores e do Mundo pelo Grêmio em 1983, hexacampeão gaúcho, bicampeão carioca, bicampeão da Taça Guanabara e campeão Brasileiro pelo Vasco, campeão pernambucano, campeão da Copa do Brasil de 89 pelo Grêmio, e que entre 77 e 78 (no Vasco) ficou mais de 20 jogos sem levar gols, um recorde mundial até hoje inigualável. Apesar de todo o currículo, o cara é super humilde e muito bem humorado. Chega de papo e vamos á entrevista:
Como foi o início da sua carreira no Vasco da Gama?
Eu fui para o Vasco da Gama passar por um período de teste, a convite do treinador do juvenil do Vasco, que era da mesma cidade que eu, e foi ferroviário junto com meu pai, e no final do ano, durante as férias, ele esteve na nossa cidade e um amigo nosso da família disse pra ele que havia um guri lá, um goleiro, em Além Paraíba, que ele poderia dar uma olhada. Aí nós encontramos com ele num baile, e ele me fez um convite, até porque eu estava para ir para o Flamengo, junto com o Cantareli, mas daí eu fiz a opção de ir para o Vasco da Gama. Eu fui, fiz o teste, e não queria ficar, porque eu era muito apegado a minha mãe e tal, e guri, saindo, com 16 anos para o Rio de Janeiro, apesar de ser próximo, já que a cidade fica a 140 km do Rio de Janeiro, e eu não estava acostumado a ficar longe da minha família e foi difícil, para mim. Tanto que no final do teste eu pedi para ir embora, porque faltava uma semana para acabar as minhas férias na escola, e eu queria curtir essa semana na minha cidade, mas aí ele falou “você vai, mas vai voltar”, e eu respondi “o senhor deve estar enganado, são 12 goleiros e você vai escolher a mim?”, mas ele falou que eu tinha sido aprovado e conversou com meu pai, eles acertaram lá, e eu voltei e fiquei nas categorias de base do Vasco da Gama durante cinco anos, e no dia 2 de fevereiro de 1974 eu assinei o meu primeiro contrato profissional e conquistei meu primeiro título, apesar de ser reserva do Andrada, foi o primeiro título a ser conquistado. E ali eu fiquei mais dez anos no profissional, que nesses dez anos eu fui emprestado em 79 para o Coritiba, ficando lá um ano. No final do ano nós chegamos entre os quatro finalistas do Brasileiro e a semifinal foi contra o Vasco, e após o jogo no Maracanã, a direção do Vasco que estava assumindo foi ao vestiário do Coritiba, já que eu tinha contrato até março do ano seguinte, e eu queria ficar no Coritiba, e essa diretoria foi lá e conversou com a direção do Coritiba e se acertaram pelo meu retorno ao Vasco. Aí eu voltei para o Vasco e eles negociaram o Leão com o Grêmio, e eu me efetivei novamente, e em maio de 83 eu fui emprestado ao Grêmio para disputar a Libertadores, e fiquei de 1° de junho até dezembro do Grêmio, onde participei da Libertadores e do Mundial. Mas aí não houve o acerto com o Grêmio e eu voltei para o Vasco da Gama, e ali eu fiquei por mais dois meses e recebi um convite do finado Ênio Andrade, que estava assumindo o Náutico, e o Náutico há nove anos não era campeão, e ele gostaria de contar comigo no Náutico naquele ano, até porque nós havíamos trabalhado juntos no Coritiba, onde fomos campeões, ele era o treinador. Aí eu me acertei com o Náutico e fui lá trabalhar com o seu Ênio, ficamos lá um ano também, e terminamos o ano tirando o jejum de nove anos sem título, conquistando o pernambucano, e retornei ao Vasco e recebi o convite do Grêmio se havia interesse de minha parte e prontamente aceitei. Nem discuti contrato com o Grêmio. Quando recebi o convite, aceitei, e a direção pediu para que eu fizesse uma proposta, mas eu disse “não precisa, o Grêmio faz a dele e está tudo certo”, e aí retornei ao Olímpico, onde fiquei mais seis anos, com mais oito conquistas como atletas. Em agosto de 90 eu saí do Grêmio, fiquei parado, em 91 eu fui para o Figueirense, onde fiquei um ano, e retornei, mas quando ia parar, eu recebi um convite do doutor Pedro Wetsphalen, de Cruz Alta, que o Guarani estava lançando uma sede campestre, e ele gostaria de contar comigo no Guarani naquele ano, até para fazer a promoção da sede campestre, e aí eu fui trabalhar no Guarani em Cruz Alta, e ao mesmo tempo eu concorri a vereador em Porto Alegre. Então eu fui eleito vereador, e uma semana depois o Grêmio me convidou a ser treinador de goleiro. Como eu ia parar, eu aceitei e retornei para o Grêmio como treinador de Grêmio, e ali eu lancei o Murilo e o Danrlei, e havia trabalhado com o Émerson, na época que eu jogava, em 89 o Rafael Bandeira pediu para que eu fizesse um trabalho com a categoria de base, e já havia feito esse trabalho, e retornando ao Grêmio, 15 dias depois o Rafael Bandeira pediu para que eu assumisse o Grêmio, porque se encontrava em uma situação difícil, chegando em final de temporada, seria difícil contratar um treinador, e ele estava dispensando seis jogadores e o Grêmio vinha de uma derrota para o Pelotas na quarta-feira no Olímpico e jogaria no domingo em Pelotas. Eu aceitei e cumpri o restante da tabela do Grêmio, chegamos na final do Campeonato Gaúcho, perdemos a final para o Internacional, e aí eu achei melhor continuar a minha atividade como treinador de goleiro, até porque recém eu havia sido eleito vereador, e era um projeto de vida. Como treinador de goleiros, dava para assumir essas duas funções, então, eu fiquei na vereança durante três anos, no último ano eu recebi um convite do Otacílio Gonçalves para ir trabalhar no Japão, aí eu pedi licença na Câmara não remunerada, e lá fiquei oito anos, e retornei ao Brasil no final de 2003, e aí montei um Centro de Treinamento em São Lourenço do Sul, e em janeiro de 2005 eu assumi o Sapucaiense quando ele se profissionalizou, e eu fui o primeiro treinador profissional do Sapucaiense.
Dentro de toda essa história dentro do Grêmio, qual foi o momento mais marcante como jogador?
Eu acho que tive uma passagem marcante no Grêmio. Em No período em que estive no Olímpico eu conquistei dez títulos e participei das duas maiores conquistas que o clube possuí na sua história, e eu acho que tudo isso marca, tudo isso são momentos, e cada conquista é um momento especial, seja ela qual for. Agora, se você me perguntar sobre a Libertadores e o Mundial eu respondo que lógico que é o ápice na vida de qualquer profissional do futebol, e eu tive o prazer de fazer parte desse grupo que foi vitorioso e carrego no meu currículo o título de campeão da América e de campeão do Mundo.
A defesa do pênalti contra o América de Cali na semifinal da Libertadores de 83 foi um momento crucial nessa história toda?
Foi um momento decisivo e que é dito pelos próprios gremistas que ali foi a oportunidade do Grêmio de ser finalista, porque se o Grêmio empata aquele jogo estaria fora da final da Libertadores. E eu tive a felicidade de defender o pênalti e conseqüentemente a condição de finalista da Libertadores.
Passando para a sua vinda para Santo Ângelo, como surgiu o convite e por que o senhor assumiu esse desafio de assumir a SER Santo Ângelo para disputar a Série B do Gauchão?
Eu estava no Guarani de Venâncio no ano passado, e terminada a temporada, e eu saí antes por uns detalhes lá que me desagradaram e eu resolvi sair, e o China, que é meu compadre, trabalhava com o Atlântico de Erechim, com a categoria de base, e ia disputar uma copa em Santa Catarina. Só que ele recebeu um convite do Cascavel, para disputar o paranaense, e como eu estava parado, ele me pediu para que eu desse uma força para o pessoal em Erechim, e estava trabalhando com a gurizada lá. Nesse meio tempo eu recebi propostas de outros clubes gaúchos, assim como do Santo Ângelo. O deputado Adroaldo Loureiro me ligou, me perguntando se havia interesse de minha parte de vir trabalhar, eu disse que sim, e aí ele pediu. Eu fui a Porto Alegre para participar da festa comemorativa dos 25 anos do Mundial, e ele pediu para que eu desse uma passada no gabinete para conversar com ele. E eu passei lá, conversamos, disse para ele a maneira que eu gostava de trabalhar, e ele colocou para mim qual era a situação da SER Santo Ângelo, que iriam ter uma reunião para decidir se participariam na Sergundona e que haveria uma eleição no clube, que ainda não estava definida a diretoria e tudo, mas que ele já queria deixar alguma coisa encaminhada com relação ao treinador, e aí me disse que ligaria assim que houvesse a decisão, e eu fiquei no aguardo, e ele me retornou a ligação, perguntando se eu estaria disponível para ir a Santo Ângelo para a gente conversar, e eu estava chegando de Santa Catarina, e vim aqui e sentamos, conversamos, eu fiz a minha proposta e eles aceitaram, claro que tudo dentro de uma realidade, já que nesse ponto sou uma pessoa coerente, e sei que a realidade de um time da Segundona não é a mesma dos da primeira, e sei que os clubes do interior também não tem o potencial dos times da Primeira, até porque eles recebem um aporte da Federação bem maior. Eu fiz a minha proposta dentro da realidade da Segundona, e foi prontamente atendida, e nós aceitamos a vinda para a SER Santo Ângelo. Eu me sinto satisfeito, feliz, completamente adaptado, até porque eu sou uma pessoa que não tenho dificuldade para me adaptar. Sou uma pessoa sossegada, e numa cidade do interior as coisas são bem mais calmas, bem mais sossegadas, então está bem dentro do meu estilo e não tenho essa dificuldade.
Qual o estilo do Mazaropi dentro do vestiário e as orientações que o senhor gosta de passar aos jogadores?
Eu sou calmo. Eu procuro passar tranqüilidade e confiança aos jogadores, até porque você trabalha a semana toda para o jogo e os jogadores tem que ter a consciência do que eles precisam realizar dentro de campo. Eu sou exigente com a questão da disciplina, porque eu acho que sem disciplina você não vai a lugar nenhum. E isso não é só no futebol, é na vida da gente. Eu sempre pautei a minha vida em cima de uma disciplina bastante rigorosa, e eu não me arrependo disso, porque eu tive uma carreira como atleta vitoriosa. Em 19 anos de profissionais foram 17 títulos conquistados e todos os tipos de títulos que você possa imaginar, inclusive ostento a posição de recordista mundial de tempo sem tomar gol. São 1.816 minutos, o que da mais de 20 jogos, mas isso foi em cima de muito trabalho, muita dedicação, muita disciplina, então, eu sou muito exigente nesse aspecto. Eu admito jogador não estar bem tecnicamente numa partida, mas não admito que falte empenho dele dentro de campo, dentro das partidas. Eu acho que isso é o mínimo que o profissional pode oferecer ao clube. Você estar mal tecnicamente é admissível. Às vezes você mesmo na sua função não está inspirado para fazer as suas matérias, entrevistas, às vezes você quer buscar uma palavra lá e não consegue, mas você se determina para superar aquele momento. Então, eu acho que isso é o mínimo que o profissional pode oferecer ao clube: é a sua dedicação, o seu empenho, a sua vontade, o seu desejo de superação, para que você recompense a sua deficiência técnica naquela partida.
Com o Chico Alves (preparador de goleiros) você trabalhou no Guarani, e com o Zeca Albuquerque (preparador físico que integrou a delegação do Paraguai na Copa de 98) você já havia trabalhado antes?
Eu fui jogador do Zeca, só que nós acompanhamos muito o trabalho dele. Ele é um profissional que tem um currículo invejável. Trabalhou no Grêmio, no Fluminense, no exterior, foi campeão no Criciúma, trabalhou na seleção brasileira, e para você chegar na seleção brasileira você tem qualidade. E a gente sempre acompanha e eu tive a oportunidade de trabalhar e vivenciar o trabalho do Zeca de perto, porque ele foi meu preparador físico no Grêmio (85, 86 e 89) e a gente conhece o Zeca e o currículo do Zeca e a competência é indiscutível.
Você chegou a Santo Ângelo para trazer o título da Série B?
A gente tem sempre esse pensamento e as coisas não depende única e exclusivamente de você. Depende de todo um trabalho que vai ser realizado, de todo um planejamento, depende da imprensa, depende do apoio do torcedor, que é fundamental, queira ou não o torcedor faz o diferencial nos jogos em casa, e eu acho que é importante o torcedor apoiar a equipe, dar confiança, após a partida, se tiver insatisfeito, faça cobrança, isso é normal, isso faz com que você cresça também. Se há a cobrança, se há a crítica, porque se tem alguma coisa que você precisa mudar, então você vai buscar a razão e procurar corrigir os erros para buscar o objetivo final. Hoje nós somos uma única célula, que o seu miolo, o seu embrião, é a SER Santo Ângelo, e todos nós temos que estar alimentando esse embrião. Nós temos que estar juntos. Eu até digo, aqui o Grêmio e Inter passam a ser secundários, nós somos SER Santo Ângelo hoje.
Para encerrar, teve algum treinador que mais te marcou e que te passou ensinamentos que o senhor carregue de forma especial?
Eu acho que toda a temporada e em qualquer passagem sua, você está sempre aprendendo, e você continua aprendendo até hoje. Eu peguei a Sapucaiense sem nenhum atleta, vinha de uma mentalidade amadora, porque foram 64 anos como amador, então, eu tinha que me preocupar com o time dentro de campo, eu tinha que me preocupar em educar os dirigentes com relação ao que é o futebol profissional, tinha que ajuda-los a estruturar o clube como profissional, e passar para os jogadores, que nunca tinham participado de uma competição profissional e nunca tinham feito um trabalho de base, um trabalho técnico e tático, porque eram jogadores que jogaram o Amador, e é diferente. As pessoas acham que é a mesma coisa, e não é. Acham que você joga o amador e vai jogar da mesma maneira no profissional, e é diferente. No profissional você tem a parte física, que é importantíssima, tem a parte técnica, tem a parte tática, e no amador você não tem as mesmas responsabilidades, é diferente. Então, tudo isso nós tivemos que fazer e tudo isso é um aprendizado para a gente. Tem as dificuldades da competição, o grau de dificuldade, e com tudo isso, com os tropeços, você vai aprendendo. E assim foi no Guarani de Venâncio no ano passado. Peguei um time só de garotos que no primeiro treinamento que realizei, ficou todo mundo parado, um olhando para o outro, e eu perguntei o que estava havendo e eles disseram “nós nunca fizemos isso”, aí eu disse “então vamos fazer!”. Porque é isso que vai condicionar os atletas. E as pessoas não acreditavam que nós passaríamos da primeira fase, e passamos, o mesmo aconteceu nas demais, e terminamos em 5° lugar. Com um clube com todas as dificuldades financeiras imagináveis, com salários atrasados, e nós ainda ficamos em 5° lugar. Então, tudo isso serve de aprendizado para a gente, e aqui também eu vou estar aprendendo, porque são ensinamentos que o dia-a-dia nos dá para que faça com que você vá crescendo como profissional e até mesmo como pessoa.

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