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sábado, 8 de janeiro de 2011

Abusado

Dando seqüência ao projeto para elevar a média de leitura do preguiçoso leitorinho brasileiro, terminei de ler o Abusado, do Caco Barcellos. Como já havia me referido aqui, para descrever a qualidade dessa obra de não-ficção teria que transcrevê-la inteirinha, em suas 560 páginas da edição de 2010, o que causaria espanto no assustado leitorinho desse blog.
Tentar fazer algum resumo da obra também seria em vão. Dizer que se trata da biografia do traficante Marcinho VP, que é descrito com o codinome de Juliano VP, seria reducionismo puro. Chamar o livro de raio X do tráfico é passar uma imagem de tecnicismo a uma obra estritamente humanista. Na verdade, no livro, Caco consegue fazer o que os autores do New journalism, como Gay Talese, Turman Capote, Tom Wolfe, etc, fizeram: conta com riqueza de detalhes histórias inacreditáveis, no caso do Abusado, de traficantes e moradores, não só do morro Santa Marta, mas de diversas favelas do Rio de Janeiro. Lendo o livro você realmente se enxerga andando e subindo ruelas em Santa Marta, ao lado de homens que carregam fuzis, metralhadores, revólveres, granadas, etc, mas sabendo da história de vida de cada um desses homens (que na verdade, na maioria dos casos, são adolescentes, ou até mesmo crianças) e sabendo que eles não são monstros irracionais e sem sentimento, como muitos pensam.
Lendo o Abusado, lembrei do Carnaval de 2005 no Rio, quando fiquei hospedado na casa de um grande amigo meu, o Vinícius, que na época morava em Bonsucesso, na Zona Norte, muito próximo ao Morro do Adeus (citado no livro). Recordo-me que durante todo o carnaval, não passamos nenhuma noite em casa, pois íamos cada dia em um lugar diferente (no primeiro dia na Imperatriz Leopoldinense, na segunda na Lapa, na terceira no Terreirão do Samba, na quarta em Copacabana, etc). Porém, eu fiquei uma semana a mais depois do carnaval, e na primeira noite em que ficamos em casa, estava toda a família reunida vendo alguma novela da época, quando escuto: PÁ! PÁ! PÁ! – silêncio – RATATATATATATATATA! Olho para o lado, e o pai do carioca está tranquilamente vendo a novela, sem tirar o olho da TV. Alguém faz um comentário sobre alguma cena qualquer, todos dão risadas, menos eu, que fico tentando ver se tem algum furo em meu corpo. Nada. Comento com eles o fato.
- Que nada, gaúcho. O barulho parece que é perto, mas é longe.
- E alguma vez entrou alguma bala perdida aqui?
- Que eu lembre, não – responde o Vinícius, tranqüilizando-me. Entretanto, ele complementa – Mas isso não é nada gaúcho! Você tem que ver quando atiram granadas! O chão treme, gaúcho! Você não pode ir embora sem ver as granadas...
Pois é. Mas acabei voltando ao Sul sem ter essa honra de sentir o chão tremer com as granadas do Morro do Adeus.
Enfim, fica a dica de leitura aí, novamente, para o vagal leitorinho. Até porque, da minha parte, nessa semana vou focar mais na apresentação da minha dissertação de mestrado. Portanto, para não baixarmos a média de leitura brasuca, leia Abusado!
Hasta!

1 Comentários:

  • Bah, fiquei com mais vontade de ler esse livro. Eu li o Rota 66 e já gostei muito, esse deve ser melhor ainda.

    Boa sorte na apresentação da tua dissertação!

    Aguardo com muita curiosidade um texto teu sobre o fim da novela gremista Ronaldinho ou, como andam falando por aí, MERCENÁR10.

    Boa semana!

    Por Blogger Dilea Pase, às 10 de janeiro de 2011 às 10:05  

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