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quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Californication

Hank Moody é um bêbado incorrigível. Hank Moody é um pai do caralho. Hank Moody é um (ex) péssimo marido. Hank Moody é um garanhã. Hank Moody é sem noção. Hank Moody é um criminoso. Hank Moody é viciado em sexo. Hank Moody é depravado. Hank Moody é escritor. Hank Moody é o diabo na terra. Difícil explicar quem é Hank Moody, o protagonista da série Californication. Essa é a primeira série que estou assistindo inteira, do primeiro ao último capítulo (sem falhar nenhum) na minha vida. Já assisti outras, como Arquivo X, Mad Man e Pablo: o senhor do tráfico. Também algumas comédias, como Friends, Seinfield e Two and half man. Mas em nenhum dos casos assisti a 100% dos episódios de todas as temporadas. Claro, Californication é a primeira série que estou assistindo via Netflix, o que explica muita coisa.
Logo que assinei a Netflix, há alguns meses atrás, encontrei a sinopse de Californication e achei que era um filme (analfabeto tecnológico é isso mesmo). Aliás, mais do que isso, pensei que era um filme baseado na vida e obra de Charles Bukowsk: o nome Hank é um dos pseudônimos do velho safado, a sinopse dizia que era um escritor, alcoólatra, pai de uma garota (bomo o Buk), etc. Mas, de cara, percebi que não se tratava nada disso. Apesar das referências feitas ao Bukowski em um ou outro episódio e do nome igual ao do pseudônimo, Hank Moody é, de certa forma, o oposto de Bukowski: ele trabalha em Hollywood, ganha uma puta grana o tempo inteiro, come quem ele quer e é apaixonado pela mãe da filha (com quem nunca foi oficialmente casado).
São sete temporadas e acabei de ver a quinta há alguns minutos. Sinceramente, comecei a assistir porque achei que tivesse a ver com o Bukowski verdadeiro. Depois, continuei, porque era uma das séries que disponibiliza áudio e legendas em inglês, por fim, quando menos percebi, acabei gostando. No início (até o quarto ou quinto episódio) achei muito idiota. Um cara galã, bêbado e escritor que come todo mundo, mas que tenta recuperar a sua família, no sentido tradicional: mulher e filha. Quanto mais ele corre atrás, mais insucesso tem, e mais grana ganha e mais sexo faz com divindades hollywoodianas e mais enche a cara.
A realização total do sonho americano. Contudo, essa também é uma leitura superficial do enredo. Então, por que gostei da série? Por que, apesar das abismais diferenças, de certa forma me identifico com Hank Moody?
Primeiro, por ele ser um escritor fodido, como Bukowski, Thompson e a maioria dos escritores que valem a pena de serem lidos. No caso dele, não fodido financeiramente, mas com uma vida fodida: sempre está correndo atrás de algo que ele não pode e não consegue alcançar. Segundo, porque apesar de todas as merdas que ele faz, ele ama a filha dele mais do que tudo e o seu maior medo é perdê-la. Inclusive, caso fosse um personagem real, eu diria que ele só pensa que ama a mãe de Becca (Karen, é o seu nome) e que ele só corre atrás dela, justamente porque ela o rejeita e por um medo inconsciente de perder a filha. Terceiro, porque ele não é um granhão apenas porque é bonito (eu sei, eu sei, de garanhão não tenho nada), mas sim, porque ele sabe tratar bem as mulheres. Apesar da série poder ser facilmente considerada machista, em certo aspecto ela vai contra o ideal machista que diz: elas querem ele porque é rico, famoso e tem um carrão. Na série mesmo, há personagens desse tipo: astros do rock, atores, etc. Mas Hank Moody acaba tratando cada uma das suas milhares de amantes como se fossem únicas (claro que, em razão disso, ele acaba quebrando a cara N vezes – principalmente quando um trio de mulheres apaixonadas por ele resolvem se unir e se vingar ao serem “dispensadas”).
No entanto, é essa miscelânea que é a vida de Hank Moody que faz com que, de certa forma, eu me identifique com ele. Bem como as incertezas sobre o futuro, que estão no ar durante todos os episódios – bem como em todos os dias da minha vida desde que vim ao mundo. São acontecimentos que fazem com que ele mude os planos, são atitudes insanas que ferram com tudo a toda hora, são as loucuras feitas com seu melhor amigo, o inigualável e cômico Charlie Runkle, que fazem toda a merda deixar de ser uma tragédia para ser uma comédia, é a amizade entre eles, o amor entre Hank e suas amantes, o sentimento platônico e idealizador que ele sente em relação a mãe de Becca, a infantilidade com a rebeldia da garota (que começa criança, e vai ficando adolescente no decorrer dos capítulos),
enfim, tudo mostra a não-linearidade e a loucura que é isso que chamamos de vida. Claro, no caso de Hank, ainda há drogas e bebidas de monte, para ferrar ainda mais com tudo e, de quebra, um julgamento com condenação por ter feito sexo com uma menor de idade que (depois se descobre) era, então, a enteada de Karen (sua ex-mulher).
Minha dica é a seguinte: se você for assistir, deixe para se irritar com o machismo e o humor forçado dos primeiros episódios e tente ir até o fim da primeira temporada. Depois disso, se você ainda não tiver curtido, desista. Caso contrário, você não conseguirá parar até a última temporada. Para mim faltam três temporadas. Doze episódios em cada. Em cerca de um mês, termino.
As duas únicas coisas que ainda me irritam é o seguinte: enquanto Hank Moody não está com Karen, ele fica com todas e morre de ciúmes se desconfia que ela saiu com alguém (algo exageradamente machista – mesmo que esse ciúmes fique apenas em piadas irônicas, e nunca vire agressão física à ela ou aos namorados dela) e, a segunda e mais irritante ainda, é que ele toma porres homéricos até de madrugada e acorda cedo no outro dia sem sinais de dor ou cara de ressaca. Essa é uma falha narrativa, pois não há nada de verossimilhança em ficar bêbado de destilado, cerveja, etc, e se acordar DE MANHÃ de cara limpa e disposto a encarar o dia que vem pela frente. Esse é o principal ponto que separa realidade e ficção em Californication. Pois, na vida real, a manhã seguinte após uma bebedeira sempre cobra o preço do que foi feito na noite anterior. Infelizmente.

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