Nada será como antes – I’m back – Again!
Estou de volta
neste abandonado canal, um ano e meio depois da última postagem. Tudo porque,
depois de ler a biografia do Lula, li alguns livros e acabei não resenhando em
lugar nenhum. Apenas escrevi brevíssimos comentários na minha coluna do Diário
Popular, de Pelotas. Assim, como percebi que alguns livros que li há cerca de
um ano eu já mal recordo a história e os personagens, lembrei que esse espaço
tem como principal finalidade fazer resenhas públicas dos livros que leio para
consultar anos depois, quando minha massa cinzenta já tiver deletado a porra
toda do meu cérebro corroído pelos anos de uso e pelo álcool.
Bom, sem mais
delongas, acabei de ler outra biografia: Nada será como antes, sobre Elis
Regina, escrita pelo jornalista Julio Maria. Antes de falar da obra, conto rapidamente
como cheguei nela. Certa madrugada, depois de muitos latões de cerveja, estava
ouvindo no youtube “Como nossos
pais”, da Elis, quando pensei: “meu, essa mulher é foda”. Tomei mais um gole e
completei: “Deve ter tido uma vida do caralho!”. E então, eu pesquisei no
Google uma boa biografia sobre Elis. No dia seguinte, acordei e levei minha
vida normalmente, até que recebi um e-mail da Estante Virtual dizendo que meu
pagamento havia sido aprovado. “Como assim, pagamento?”, perguntei a mim mesmo.
“Caralho, clonaram meu cartão!”. Abri o e-mail, apavorado, mas tomei um susto
ao ver que eu, de fato, havia encomendado a biografia da Elis Regina, “Nada
será como antes”, com pagamento à vista, por 90 reais, às 4h30 da madrugada.
Puta que pariu, preciso parar de beber.
Enfim, o livro
chegou e acabei lendo todas as suas 417 páginas. O investimento acabou valendo
a pena, pois, de fato, a biografia da Elis é foda pra caralho. O livro,
inclusive, é como a vida da Elis: cheio de altos e baixos. Os pontos mais
altos, na minha humilde opinião, é o início e o fim, com a narração dramática
da morte da cantora. Ali, realmente Julio Maria conseguiu fazer a narrativa
“cena a cena” do New Journalism,
lembrando, além dos jornalistas literários americanos, os grandes biógrafos
brasileiros, tais como Fernando Morais e Ruy Castro. Nestes dois trechos, o
texto que te transporta para o apartamento da Elis, para o seu último dia de
vida, etc e tal. Mas o miolo do livro, que efetivamente narra a carreira de
Elis, varia entre outros momentos em que você se sente ao lado dela na sua vida
vivida andando sempre a 200 por hora, e contações de histórias de bastidores da
Música Popular Brasileira, algumas maçantes e que não acrescentam muita coisa
ao principal, que é a vida de Elis.
Eu até entendo o
Julio Maria, porque ao final do livro tem a lista de todas as pessoas entrevistadas
e, tenho certeza, ele deve ter ficado tremendo de êxtase ao ouvir cada uma
delas. Só que algumas histórias acabaram não acrescentando muita coisa à
narrativa como um todo. Enfim, críticas à parte (que nem tenho moral para
fazer, afinal, o cara fez a biografia de uma das maiores cantoras da história
do Brasil entrevistando um monte de lendas vivas da cultura brasileira), o que
interessa para o eu do futuro é: afinal, quem foi Elis Regina? Vou pontuar
algumas impressões que tive, lendo a obra.
1) Elis Regina, enquanto pessoa, é o que hoje seria
considerada alguém clinicamente doente, com uma bipolaridade extrema. Como eu
convivi durante anos com pessoa portadora dessa doença, sei que não é fácil. Só
de ler determinadas histórias da artista, tive calafrios. Pensei: caralho, eu
não gostaria de ter conhecido ela pessoalmente. Não vou descrever a doença,
mas, em toda a narrativa, percebi ela na vida de Elis. É aquela coisa de
enlouquecer todos que estão ao seu redor para fazer com que TODOS se sintam
igual a você: quando estou feliz, todo mundo tem que estar feliz; quando estou
puto, todo mundo tem que estar puto, não importa se você ganhou na megasena ou
acabou de ter um filho; quando estou deprê, todo mundo tem que ficar deprê. Na
boa, nem se tratando de Elis Regina eu viveria um inferno desses de novo.
2)
Como bipolar, ela vivia tudo intensamente. Se
ficava brava com o marido/namorado buscava nos braços de outro algo que sentia
falta. Depois, se arrependia e fazia o inverso: destratava o amante e caia nos
braços do marido. Traia e era traída. Tinha ciúmes e sofria pelos ciúmes dos
outros. Enfim, tudo vivido com o pé no acelerador, numa montanha russa de
emoções que, com uma pitadinha de elementos químicos faria tudo ir pelos ares.
3)
Na biografia escrita por Julio Maria, repórter
especializado em música, senti falta de “romantizar” mais a infância, fazendo a
narrativa cena a cena para alguns episódios. A infância/adolescência é contada
mais por cima, talvez porque não tivesse tantas fontes para descrever detalhes
de certos episódios. Mas aí acho que ele poderia ter liberado a veia
ficcionista e criado mais em cima do que ouviu. Apenas compartilho aqui um
palpite que me ocorreu enquanto lia. Por outro lado, outros episódios não tão
importantes receberam páginas e páginas, tornando alguns trechos da leitura
monótonos, por mais que a história fosse sempre acelerada.
4)
O legal de ler hoje em dia, com a internet, é
poder ler sobre a história de uma música ou de um show e ir buscar lá no
youtube. Um exemplo foi quando li a boa história da gravação de Elis Regina com
Tom Jobim nos Estados Unidos e, ao concluir esse trecho, catei vários vídeos
dos dois artistas cantando músicas como “É pau, é pedra” no estúdio ou em shows
e por aí vai.
5)
Agora, para alguém como eu, que peguei o livro
para ler apenas sabendo que Elis era uma lenda da música nacional e que havia
morrido de overdose, há a curiosidade de saber como era essa relação dela com
as drogas. E aí vai um pequeno spoiler:
o livro inteiro praticamente não fala disso. E o motivo é bem simples: durante
a vida toda, ela detestou qualquer tipo de droga, com exceção da bebida, mas no
seu último ano de vida, ela começou a usar cocaína. E aí é a fórmula perfeita
para a tragédia: um bipolar em grau máximo, sem tratamento psiquiátrico, bebendo
e usando cocaína. É como ver um sofá pegando fogo e atirar um galão de gasolina
para tentar apaga-lo. Explodiu tudo e a tragédia foi certa.
6)
O fim do livro, com as últimas 24 horas da Elis,
é espetacular, mas me fez pensar que, de fato, o ser humano não sabe lidar com
relacionamentos. Não sei é justo dizer isso, mas a misturança de drogas e
álcool que a levou ao óbito surgiu da imaturidade de dois adultos de lidar a
temática. Para piorar, como quase sempre, quem mais sofrem são os filhos, no
caso, três, na época, de quatro a onze anos.
7)
Sobre política, há trechos interessantes. A
questão da ditadura militar e todo o seu absurdo aparece de maneira marcante,
pois inicialmente Elis foi acusada pela esquerda mais militante de ser “chapa
branca” com os milicos, porém, depois, ela se engajou a tal ponto de ter um
dossiê detalhado sobre a sua vida no DPOS, além de ter sido ameaçada por
militares. O capítulo 19 também mostra que ela queria contar as feridas sociais
nas suas músicas e descreve, na página 323, como ela conheceu o presidente Lula
e sobre como ambos se identificaram um com o outro. Lula, inclusive, esteve no
velório de Elis Regina, lamentando a morte da cantora.
Enfim,
há outros pontos diversos, mas estou fora de ritmo e por hoje deu. Se me der la gana, futuramente volto aqui para
comentar mais.
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