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sábado, 6 de junho de 2015

Alagados

Nunca imaginei que em 2015 Porto Alegre estaria tão sucateada. Bem como o jornalismo praticado pela “grande imprensa” – que é grande financeiramente e baixa moral e jornalisticamente. Na sexta-feira, eu estava voltando do encontro da Rede Alcar (história da mídia) que aconteceu na UFRGS e a minha passagem de volta para São Borja era para às 22h30. Mesmo considerando que o trajeto que eu tinha que fazer de onde estava até a rodoviária levava normalmente 15 minutos de ônibus, saí uma hora antes, pois estava chovendo e era noite de sexta-feira. Tomei um banho razoável para chegar até a parada, mas nada muito grave. O pior foi quando o busão chegou perto do túnel que dá acesso ao terminal. Estava tudo trancado, alagado, bagunçado, sucateado. Eram filas gigantescas de carros e de ônibus. Olhei para o relógio, ainda faltavam 40 minutos para o meu bus partir.
Perguntei ao cobrador o que ele achava. “Pois olha, não posso te dizer nada”. A chuva caía forte. As torneiras do céu estavam definitivamente abertas. A situação era a seguinte: sair com uma mala gigante naquele chuveiro ligado a todo o vapor à céu aberto ou ficar dentro do ônibus e perder uma passagem de quase 200 reais... Optei pela primeira opção.
Desci do ônibus em meio à chuva e perguntei para o guardinha que estava na primeira esquina o que tinha acontecido. “O túnel está alagado. Estávamos liberando apenas para ônibus mas alguns carros se enfiaram e estão trancados lá dentro”. É, o povo tem o que merece. Não respeita aos outros, faz o que não deve, se fode e ainda fode com todo mundo. A cena que se seguiu foi digna de filme. Abaixo de um temporal eu andei umas oito quadras, incluindo a lombada da Barros Cassal, atravessando a Farrapos e chegando diretamente nos piores becos do centro de Porto Alegre. A tragédia urbana: a cidade alagada, sem trânsito, sem segurança pública, sem metrô, sem táxi. Brasil sendo Brasil. Apenas uma opção: chegar até a rodoviária totalmente encharcado. Lá, entrei no banheiro masculino – que fede mais que o inferno – e, puto da vida, tirei a roupa e me troquei ali, na frente de todo mundo. Mas, primeiro, tive que catar a única calça e camiseta que não estavam molhadas – pois a mala estava encharcada por dentro também. Enquanto me trocava e me secava com papel higiênico, praguejava contra a cidade que, tantas vezes, declarei paixão. “Cidade do cu do mundo mesmo... Cidade de bosta... Porto caco alegre da porra.... Comparado com isso aqui, Catuípe é primeiro mundo”. Quando estava finalmente pronto, já era hora de embarcar.
Mas se não bastasse tudo isso, no outro dia ligo a TV e o Jornal do Almoço (vulgo jornal da indigestão) mostrou uma matéria apenas falando que choveu demais em Porto Alegre e que tudo ficou alagado. Em nenhum momento se criticou a infraestrutura da cidade que ficou totalmente parada em uma de suas regiões mais movimentadas t devido a uma chuva de três ou quatro horas. Não se ouviu ninguém a respeito – secretário de obras, prefeito, governador, deputado, vereador... Foi de um tom conformista de deixar qualquer um inconformado. É o jornalismo zumbi entrando em campo mais uma vez – reproduzindo a postura da população mais sangue de barata do mundo (ah, e o calor humano, é só pra samba e futebol?!?!). Está tudo errado e quem não se conforma é quem geralmente é criticado, culpado e execrado pela grande mídia e pela maioria. E o povo segue engolindo toda a merda enfiada goela abaixo pela mídia hegemônica. São milhares de corpos em coma recebendo esterco como soro para manter o coração batendo.

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