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terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Boas histórias, boas risadas...

Hoje queria fazer algumas indicações para você, que gosta de boas histórias! E tenho certeza que você gosta de boas histórias, senão não estaria acessando a minha coluna! Rará! É mole? Pergunta pro Zé Simão que ele te responde: é mole mas sobe!
Então, primeiro, coloco o caminho do blog do David Coimbra, da Zero Hora. Para você, que é aqui do Sul, nem precisaria, já que todo mundo conhece. Mas para o pessoal de fora que ainda não conhece o David, tenho certeza que depois de ler a primeira história não vai mais conseguir parar:
- www.clicrbs.com.br
- blogs
- blog do david

E também aproveito para indicar o blog do meu ex-colega e amigo Arion Fernandes, que além de ser gente fina e muito inteligente, também descobri que escreve pá carajo! Você que gosta de boas histórias, certamente também passará preciosos minutos lendo as histórias desse maluco. Também vai a foto dele com a maninha Isabel, já que nessa até que ele saiu bem, não sei porque...




o link do blog dele é:
www.espacodiverso.blogspot.com

Também vai o link do blog do meu primo, e também jornalista, de Londrina-PR. Ele vai participar de algumas histórias que contarei futuramente, como um carnaval que passamos juntos em Balneário Camboriú, hospedados em uma pensão onde tinha até foragido da polícia...
http://zaratustra.tipos.com.br

e para finalizar, o link do blog da minha amiga de São Lui(MA), Elen Mateus:
http://notleast.blogspot.com/

BOAS LEITURAS!!!!!

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

O dia em que eu quis ser um dentinho


Uma vez quase virei dentinho. Manja aqueles caras que ficam no centro de Porto Alegre vestidos de dentinhos entregando panfletos para uma revisão odontológica de graça? Pois é, eu queria ser um dentinho, mas não me deixaram. Foi uma tremenda injustiça, e vou contar porque.
Lá estava eu, morando no bar do meu tio no primeiro semestre de 2007. Já era jornalista formado, recém aprovado na seleção de mestrado da Unisinos que não pude cursar porque não tinha dinheiro, e, como era de se esperar, estava procurando emprego. O dinheiro que eu trouxera de Ijuí com a minha saída do Jornal da Manhã estava acabando, e tinha duas opções: seguir procurando emprego em Porto Alegre ou voltar para o interior e ficar desempregado na casa dos pais. Optei por seguir correndo atrás em Porto. Mas passei a atirar para todos os lados. Pegava o jornal e circulava os anúncios em que eu me encaixava. Às vezes, saía com minha pastinha cheia de currículos e ia entregando em praticamente todos os pontos comerciais do centro de Porto Alegre. O resto do tempo dividia entre o estágio voluntário na Rádio Gaúcha, horas sentado no balcão do bar do tio observando todo aquele circo humano, uma hora na lan house da José do Patrocínio para mandar currículos e mensagens para a namorada que estava longe, e leituras deitado no colchão jogado no meio da sala do 2° andar do bar do tio.

Para você que nunca precisou circular os anúncios de emprego para enfrentar uma fila, ou fazer um roteiro encaixando os horários para participar de umas cinco entrevistas em um dia, eu explico. Em 90% dos anúncios eles não falam do que se trata. Diz apenas “comércio”, ou “cobrador interno POA”, ou ainda “auxiliar de serviços gerais para carga e descarga”. Então, você vai no lugar marcado e mesmo que chegue com meia hora de antecedência já haverá uma fila formada por, no mínimo, umas 30 pessoas. Até o horário da entrevista a fila já dobra a esquina. Toda a segunda-feira é a mesma história. Pois bem, se você não está habituado a procurar emprego, apenas dê uma olhada nos anúncios de qualquer Classificados, e saia no centro de Porto Alegre numa segunda-feira de manhã, e você entenderá superficialmente do que estou falando.

A minha tia Leila, que não é a minha tia do bar, sabia mais do que ninguém da minha situação, afinal, pelo menos uma vez por semana eu ia lá para conversar com ela. Tem pessoas que te deixam a vontade para que você fale tudo o que você pensa, e minha tia é uma dessas pessoas, logo, adorava ir lá. E numa dessas conversas, eu reclamando que não arranjava emprego nenhum, ela disse que sempre saia nos classificados vagas para panfleteiros e que geralmente contratavam de 20 a 30 numa só tacada. No primeiro final de semana depois dessa conversa, comprei a Zero Hora e, coincidentemente, havia uma empresa contratando 20 panfleteiros. O salário era 20 reais por dia mais refeição e transporte. Já dava para ficar em Porto Alegre por mais um tempo, pelo menos para seguir fazendo meu estágio, até arranjar algo melhor. Fiz o roteiro. Ia começar com os panfletos, depois iria num anúncio de uma locadora, e depois mais duas vagas para o comércio, que não explicava nada direito, mas que suspeitava que era para ser vendedor externo. Sinceramente, me via mais como panfleteiro do que como vendedor externo. Cheguei no endereço marcado, uma rua acanhada que não lembro o nome próximo a Voluntários da Pátria. No anúncio dizia às 9h, mas cheguei às 8h30. Como o esperado, já tinha uma fila formada por aproximadamente 20 pessoas. Até às 9h, a fila já saía do prédio e seguia rua afora.
A fila foi andando, e minha vez foi chegando. Uma mulher baixa e gorda dava uma rápida olhada nos currículos e fazia algumas perguntas.
- Então você fala inglês?
- É.
- Fala e lê?
- Sim.
- Where did you work before?
- Que que é?
- Próximo!

- Então você já entregou panfletos?
- Já.
- Qual seu último emprego.
- Portocred.
- E por que saiu de lá?
- Ah, os cara eram muito xaropes. Ficavam pegando no pé do cara.
- Como assim?
- Ah, se passavam. O maninho roubou meu cliente ai dei umas bifas nele, aê a chefia me mando embora.
- Hmmmmm. Próximo...

- Hmmm. Você é formado?
- Sim.
- E por que quer entregar panfleto?
- Porque to sem dinheiro.
- Hmmmmm. Olha, eu não dou muita conversa pra ninguém. Mas vou falar pra você. Esse anúncio é para ficar vestido de dentinho entregando panfleto o dia todo, de pé. E você é formado...
- Sim, eu sei. Mas não tenho de onde tirar dinheiro.
- Eu não vou deixar você trabalhar aqui. Você é formado! Pode conseguir algo melhor!
- Escuta, eu não tenho daonde tirar dinheiro para comer um pão com banha e ninguém quer me dar emprego na minha área, tá entendendo? Se você não me der emprego, vou seguir procurando em outros lugares.
A gordinha anota uns rabiscos num papel e me entrega. É o endereço de uma agência de empregos.
- Vai lá. Você pode conseguir algo melhor.
- Mas eu quero ser dentinho.
Ela ri.
- Porra, nunca vou conseguir emprego desse jeito – dou as costas e saio. Os primeiros da fila que ouviram a conversa ficam me olhando, com ar de pena. Devem ter pensado “pô, o cara formado não consegue emprego, imagina eu, que parei de estudar com 10 anos e já estou com 30”. Pois é, eu pensava nisso tudo enquanto ia para o segundo anúncio, que estava marcado para às 10h. Como perdi quase uma hora nesse, cheguei um minuto atrasado. Mas como as outras pessoas também estavam em outras filas, algumas na mesma que eu estava, então, não haviam muitos na minha frente, considerando o horário. Deviam ter ali, quando cheguei, umas 50 pessoas. Atrasou uma hora, e eu comecei a pensar “se foi a entrevista do auxiliar de serviços gerais. Que merda”. Um gordinho negro de cabelo pixaim ouvia um mp3 com fones de ouvido e começou a cantar La Gasolina. Eu olhei para ele com a mesma cara que o Garfield olha para o Oddie. Ele tirou o fone e disse:
- Escuta só esse som.
Coloquei um fone na minha orelha.
- Sóóóó. Maneiro.
- To ligado. Pô, os caras não vão chamar a gente – disse ele, mudando a expressão do rosto, ficando com a testa franzida de preocupação.
- Pois é, já perdi o anúncio da 14 de Julho.
- Para serviços gerais?
- É – respondi.
- Só, eu vi esse. Mas eu queria ir naquele de cobrador interno.
- Hmmm. Não lembro desse. Acho que precisava ter experiência na área...
- Escuta rapaziada – nos interrompe um senhor negro de cabelos grisalhos – esse anúncio é pra fazer o quê?
- É de uma locadora – respondi – só não sei pra fazer o quê.
- Deve ser de atendente – diz o gordinho com cara de Oddie.
- Só, vou encarar essa fila. Valeu gurizada.

Existe um clima estranho entre quem está na fila. Parece que todos pertencem a mesma família, que todos são irmãos. Todos estão ali lutando por uma vaga, mas o tom de amizade que domina as conversas dá a impressão de que cada um está torcendo para que o outro se de bem. Na verdade todos estão mal e sabem que todo mundo ali está numa pior, levantando todas as manhãs para tentar tirar dinheiro de algum lugar para não precisar pegar uma arma e apontar para a cabeça da primeira velhinha que dobrar a esquina com uma bolsa. Alguns estão nessa situação há meses. Outros há mais de ano. Lá pelas onze e meia as portas da tal locadora, que não tinha fachada, se abriram e a fila começou a andar. Foi rápido. Um cara forte falava para quem entrava: “larguem os seus currículos nessa caixa e entraremos em contato com quem for selecionado. Muito obrigado”. Parecia fila de quartel. A, esqueci um detalhe do anúncio. A locadora estava selecionando somente rapazes maiores de 18 anos. Quando entrei, entendi o porque: se tratava de uma locadora de filme pornô. Larguei meu currículo e pensei: “esses caras não vão ter culhões para contratar um jornalista formado para trabalhar num lugar desses. Filhas da puta, se ao menos fizessem uma entrevista. Preconceito com quem é formado, porra!”. Sai dali com raiva.
De lá, fui para os outros dois anúncios de vendedor externo sem a mínima vontade no corpo. Conheci mais umas pessoas, que também já tinham participado de outras entrevistas na parte da manhã e também já estavam perdendo a esperança de procurar emprego. “Faz meio ano que toda a segunda-feira faço esse roteiro. É triste, mas é o único jeito”, me disse uma guria de 18 anos que tem uma filha de dois anos. “Vai dar tudo certo. Quando você menos espera, vai aparecer alguma coisa”, disse à ela, sem muita convicção.

Fui almoçar eram quase três horas num restaurante na Borges de Medeiros. De lá, segui para o bar do tio, com a cabeça baixa, pensando em uma forma de conseguir emprego. Então tive uma idéia brilhante! Lembrei do pessoal que entregava panfleto na João Pessoa e sempre me davam um. Olharia o endereço, iria até lá, pediria para falar com o “cabeção” do negócio, contaria minha situação e estaria empregado! Simples, fácil e rápido. E foi assim que fui parar nos panfletos para empréstimo pessoal que já contei em outra coluna, e que certamente ainda voltarei a falar outras vezes! Ah, e tem a história do curso de porteiro, mas ai já é outra crônica, ônica, ônica....

sábado, 23 de fevereiro de 2008

Competição dissimulada e muitos dólares!


Fazendo a cobertura da chegada do Inter no aeroporto de Santo Ângelo para o jogo contra o São Luiz em Ijuí, lembrei de algumas colunas do David Coimbra, da Zero Hora, em que ele defende, em outras palavras, a seguinte idéia: o futebol, ou melhor, o esporte em si, principalmente os com bola (todos inventados pelos ingleses) foi um aprimoramento da civilização (inventada pelas mulheres, mas se quiser saber mais indico Jogo de Damas, do próprio David) para atender a necessidade que o ser humano tem de assistir competições e disputas, que no tempo dos gladiadores, eram bem mais violentas. Ou seja, o ser humano tem que ver violência de alguma forma, já que a competição, através do esporte, é uma representação da violência, da dissimulação, enfim, do que antes era realmente uma questão de vida ou morte, mas que através do futebol se tornou de honra ou desonra, ou uma situação de vida ou morte representada.
Pensei nisso tudo ao ver centenas de pessoas aglomeradas e se empurrando para ver de perto os jogadores colorados. Não vou negar que, como jornalista, também prefiro acompanhar uma chegada do Inter com vários jogadores campeões mundiais de 2006 no aeroporto do que outros jogos que não interessam tanto ao público. Enquanto voltávamos do aeroporto, vinha comentando com o radialista Irani Brum, da Rádio Santo Ângelo (onde o Zé Aldo, do texto “Um cara fudido, mas de valor”, já trabalhou), como só o futebol consegue mobilizar tantas pessoas daquela maneira. Concordo com muitas das críticas que fazem sobre o futebol, que os supersalários que as “estrelas” futebolísticas ganham é um absurdo em um país como o Brasil, e tudo mais, mas é só o futebol, por essa necessidade que as pessoas têm em ver quem é o melhor em uma competição, consegue fazer isso. Isso fica bem visível em uma cidade com cerca de 80 mil habitantes, onde é difícil conseguir mobilizar um grande número de pessoas em torno de qualquer causa. E o Inter conseguiu isso. Centenas de pessoas foram esperar a delegação no aeroporto, e outras centenas aguardavam a passagem do ônibus colorado pelas ruas da cidade.
E foi justamente nesse momento que, cobrindo a chegada de Fernandão e Cia, pelo Jornal das Missões, fiz algumas fotos, sendo que seis saíram na edição do JM e outra saiu na página oficial do Fernandão, que conta com a assessoria do Marcelo Campos:
www.fernandaof9.com.br/f9/artigo.asp?cat=1&idartigo=339

Já na quarta-feira de noite, saí do jornal às 18h e fui direto para Ijuí com o colunista do JM, Flavinho, para assistirmos ao jogo. Chegamos de volta a Santo Ângelo às 2h, mas, como eu também sou ser humano e adoro ver a violência e a dissimulação representadas nas quatro linhas, valeu a pena, mesmo sendo torcedor da SER Santo Ângelo.

Coloco a seguir uma foto da partida, uma foto da mala contendo U$ 1 milhão que eu achava que ia ser usada pelo Inter para que o São Luiz entregasse o jogo, mas que depois descobri que na verdade o vice-presidente da CBF, Emídio Perondi, que estava lá presente, andou lendo minhas colunas, e, comovido com minha alergia a ovo, me doou para que eu procure um bom médico e trate da minha triste alergia.... Obrigado Perondão! E primeiro, uma foto tirada de dentro do ônibus, antes que o carrancudo técnico Abel Braga aparecesse para me tocar...







quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

La cucaracha bukowskiana

Esses dias o velho Buk apareceu em um sonho. O pai Xangu havia me dito naquele contato feito da outra vez que é normal isso acontecer quando alguém conversa pessoalmente com uma alma do além. Eu mal havia dormido, comecei a sentir um bafo de cachaça, e em meio a uma fumaceira apareceu Chinaski, Henry, Hank, ou Buk, como preferirem.
- Essa tal de caipirinha é do caralho. É a melhor invenção da humanidade depois da cerveja e da cama –disse ao me ver.
- Como vão as coisas? – perguntei.
- Olha, você sabe como o negócio funciona. Já expliquei da outra vez. Mantenha meu copo cheio e contarei tudo a você...
Era estranho, porque ao mesmo tempo que tudo era tão real, eu tinha consciência que aquilo era um sonho. Ou seja, era como se eu estivesse ali, consciente, no meu sonho!
- Que do caraí – disse eu, pensando em voz alta.
- O quê?
- Porra, nada. Vou pegar uma cerveja.
Olhei em volta e enxerguei um bar, quase igual ao do meu tio, lá da Venâncio, em Porto Alegre.
- Espere ai, vê se não some.
- Ok - disse ele, secando o copo.
Entrei no bar, estava completamente lotado. E pra variar, meu tio estava atendendo.
- Tio! – chamei.
- Não chama ele. Esse ai é alemão, não é bom confiar – me disse aquele mesmo cliente da outra vez.
- Tio! – insisti.
- Ô alemão xarope! Vem atende esse guri aqui que ele é gente fina.
O tio nada. Nem olhava. Após mais umas quatro tentativas ele veio me atender.
- Me vê uma jarra de caipirinha – pedi, já que a sede do velho Buk sempre é grande, e a minha não fica muito atrás...
Voltei correndo para o local onde Bukowski estava (o meio do vazio) e enchi o copo dele. Como não me liguei de pegar um para mim, tratei de tomar direto na jarra.
- Então é isso – disse eu.
- Ééééééééééé! – resmungou ele – Você conhece o dono daquele bar?
- Claro, é meu tio.
- É um alemão xarope – disse.
- Sim. Eu também sou. E você também!
- Éééééé!
- Mas agora trate de falar, onde você fica? O que aconteceu depois daquele papo com Jesus Cristo?
- O velho não me agüentou muito tempo. Bebíamos o tempo todo. Até ai tudo bem, a gente sempre ficava horas e horas bebendo, depois a gente sorteava alguns desgraçados lá da Terra para fudermos com eles, mas isso com o tempo foi passando. No início estava achando tudo o maior barato, mas nossa relação foi se desgastando, sabe como é?
- Sim, claro.
- Mas como disse, apesar disso estava tudo bem entre nós. Enchíamos a cara, aprontávamos alguma pegadinha para os recém chegados, enchíamos a cara, mandávamos um bebê iluminado para cada um milhão de desgraçados, enchíamos a cara, mijavamos na cabeça das pessoas, enchíamos a cara, e por ai ia seguindo a vida. Ou melhor, a morte. Quer dizer, nem sei mais o quê. Até que um dia ele se virou para mim e disse: “Cara, se continuar bebendo desse jeito vou fuder com o mundo”. “Isso não é legal. Se você fudesse com todo mundo era diferente..”, respondi. “Éééééé!”, retrucou. “Mas estou falando sério. Eu não era assim. Antes bebia somente uma vez por semana, mas desde que você chegou aqui, bebo todos os dias”, reclamou, com os olhos vermelhos, a testa franzida e um ar de cansado.
Nesse momento o velho Buk coça o queixo, como se estivesse longe.
- Ainda convenci o velho a me deixar ali com ele um pouco mais. Tinha tudo o que precisava. Dormia nas nuvens, enchia a cara, não precisava ir no banheiro para mijar, e sabia que não morreria de fome, afinal, já estou morto!
- Tu vês – eu disse. Ele continuou, como se eu não tivesse dito nada:
“O tempo ia passando, e aos poucos fomos voltando a velha forma. Até que um dia o velho tinha ido resolver umas paradas com o carinha lá de baixo, estavam disputando a foice uma pobre alma... Ele foi e me deixou lá. Fiquei sentado, tomando minha cervejinha, quando surgiu a Tina, descendo com suas asinhas e seu rabinho maravilhoso em minha direção. Na hora, não me preocupei, pois o velho tinha me dito que não se trepava depois de morto. Mas agora percebo que ele mentiu só para evitar que eu fizesse alguma cagada pelo céu. Então, a Tina me cumprimentou e perguntou do velho. Eu respondi:
- Foi resolver umas paradas com o dito cujo.
- Hmmmmmmmmmmmmmmmmmmm” - ela murmurou.
- Hmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmm” - eu respondi.
- Hmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmm - ela resmungou vindo em minha direção.
- Hmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmm - eu retruquei pegando ela pela cintura.
- Hmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmm - ela fez já em cima de mim. E o resto foi “hmmmm” para tudo quanto é lado. Mas tudo bem, deu tempo da gente dar duas e ela voltar lá pra cima. Eu ainda tomei mais meia dúzia de garrafas quando o velho apareceu. Até ai tudo bem de novo. Mas o tempo foi passando, e o velho foi percebendo que a Tina começou a inchar e a engordar. Ele começou a ficar mais quieto, como se estivesse desconfiado de alguma coisa. Até que um dia, depois da Tina trazer a 19° garrafa, e ia voltando para a sua nuvem com muita dificuldade, ele sentenciou:
- Meu Pai! Ela está grávida.
- Grávida? – perguntei.
- Você.... Você.... Você só pode ser um... um.... novo Judas!
- Pow velhinho, não esquenta. Não vale a pena a gente estraga essa amizade por um rabo de saia.
- Seu... seu...
- Olha, lá na Terra está cheio de Tinas! Vamos dar uma volta lá qualquer hora...
- Seu... seu...
- Olha, vai se fuder! Toma a porra da tua cerveja antes que esquente ou eu te rache a garrafa na tua cabeça.
Depois só ouvi: POW! Fiquei mais um tempo desacordado, e desde então estou nesse vazio, com aquele bar ali na frente. Mas o dono não me deixa passar para a saída que tem do outro lado. É um alemão xarope!”.

Eu ouvi toda explanação do velho Buk, tomando vez em quando um golinho direto da jarra. Quando me dei por conta, ela estava vazia!
- Ei! Eu fiquei falando, falando, falando, e você secou essa porra! O que está pensando?
- Calma, calma – respondi – vou lá pegar outra.
Sai correndo bar adentro gritando “To! Tio!”. Até conseguir sair de lá já tinha se passado meia hora. Quando voltei, o vazio estava vazio. Não havia nem indícios do velho Buk. Eu comecei a correr no escuro, e de repente tropecei. Quando ia bater a cabeça no chão, ouvi:
PIPIPIPIPIPIPIPIPIPIPIPIPIPIPIPIPI....
Era a porra do despertador.
Levantei, liguei o som como sempre, estava indo de cueca do quarto para o banheiro, ao mesmo tempo em que minha irmã ia saindo do quarto dela para o banheiro, coçando o nariz com a palma da mão, quando nos vimos. Eu fui mais ligeiro que ela e entrei primeiro.
- Que é isso guri! – resmungou.
Eu comecei a assobiar “Você vai lembrar de mim” do Nenhum de Nós, e entrei no chuveiro. Tinha uma porra duma barata bem no meio da banheira (não tomo banho de banheira, mas o chuveiro fica em cima dela). Peguei o chinelo e comecei a tentar a jogar ela pra fora. Como fiz pouca força, ela escorregou de volta e ao parar, de novo no meio da banheira, começou a remexer todas aquelas patinhas ao mesmo tempo. Então, lembrei do Metamorfose, do Kafka, e pensei que aquela barata poderia ser meu irmão.
- Fábio, é você?
Não houve resposta. Fiquei olhando para ela com ar de curiosidade e dúvida. E se fosse algum membro da família e eu a matasse. Melhor não arriscar. Na segunda tentativa ela saiu voando banheira afora e piso do banheiro adentro. Bateu com a cabeça na parede e, por azar, caiu de costas e continuou mexendo aquelas malditas perninhas. “Mas que barata mais burra”, pensei. “Agora que espere eu tomar banho”. Liguei o chuveiro e quando estava terminando de ensaboar meu sovaco, minha irmã começou a bater na porta:
- Apura guri! To me mijando!
Continuei assobiando “Você vai lembrar de mim”. Terminei de me lavar, sai do chuveiro, mijei, me olhei no espelho, desvirei a pobre cucaracha, e sai do banheiro. Me vesti, tomei um café, escovei os dentes, juntei minhas tralhas de trabalho e sai para a rua. Enquanto caminhava pensava na maldita barata. E se ela fosse o velho Buk?




terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

O ângulo do "golzinho"

Comentário do nobre leitorinho tupiniquim, meu amigo, Vinícius Longo, o Carioca, sobre meu primeiro texto publicado “O dia em que Kaká se tornou o melhor do mundo”: "Mas saindo da vida noturna e voltando aos dias de sol a beira mar, eis que numa bela tarde, em meio a um “golzinho” – duas traves feitas com chinelos". Até ai, tudo bem! "Saída de bola para o adversário, em poucos segundos roubei a bola de um argentino cabeludo e bati de fora da área, a bola entrou no ângulo, sem chances para o goleiro." - hahahahahaha, quero que você me mostre onde fica o angulo de um gol feito com chinelos na areia! Excelente! hahahahaha Muito bom! "A bola ainda tocou na trave direita antes de entrar." Chinelo bom esse hein? Se fosse na praia aqui perto de casa, o chinelo ia sair voando e seria gol de qualquer maneira... Pois então, agora mostro para o meu amigo carioca as traves das praias de Santa Catarina, reproduzidas pelo meu amigo Beck:



sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

O OVO ASSASSINO - A saga continua



É amigo, a vida segue sendo dura. E pelo jeito que as pessoas insistem em falar o tempo todo na minha maldita alergia a ovo, acho que até eu morrer vou poder escrever um mega-livro dividido em 25 volumes de 500 páginas cada sobre o assunto. Depois da minha primeira crônica sobre o ovo assassino, muitas pessoas me disseram: “ficou bom o texto, mas é sério isso?”. Bom, como tratam-se de nobres leitorinhos, e eu adoro todos os leitorinhos da minha coluna, eu não dei nenhuma daquelas respostas mentais e segui guardando elas para as profundezas do meu intelecto. Mas confesso que com os leitorinhos eu não chego nem mesmo a ter elas... Pelo contrário. Resolvi fazer mais, muito mais! Claro, que com a ajuda da minha maninha queridinha (pra não dizer sarninha) Carol Ritter.

Eis que eu estava com meu amor e toda a minha família em um rodízio de pizza em Meia-Praia (SC), maior clima de praia, todo mundo muito alegre, animado e tudo mais, quando eu peguei o cardápio, e ao passar os olhos por ele fui vendo que lá só tinha... só tinha...? só tinha...? tchan tchan tchan tchan!! BINGO! Só tinha pizza, ora pois! Muito interessante. Chamei o garçom, que confirmou a minha hipótese inicial de que a massa continha ovo. Mas antes de dar risada e dizer “óbvio que tinha, seu escritorzinho tupiniquim idiota”, eu lhe informo que aqui em Santo Ângelo tem pelo menos duas pizzarias que fazem a massa sem ovo, e ainda farei fotos nelas. E na padaria aqui da esquina também fazem pizza sem ovo, e minha mãe também!!! Mas, infelizmente, a maioria dos cozinheiros das pizzarias pelo mundo afora são malvados e ficam colocando ovo na massa... Ainda serei deputado só para apresentar um projeto de lei que proíba o uso de ovo na massa de pizza (como diria o David Coimbra, já que querem proibir tudo mesmo...). Pois é, mas no fim, como ia dizendo, o fiá-da-puta do ovo estava no meu caminho mais uma vez.

Mas como os restaurantes catarinenses primam pelo bom atendimento, o garçom logo me informou que no final do cardápio, lá na última linha, com letras minúsculas, tinha o tal de filé na chapa! Filé na chapa! Eis a solução. Três palavrinhas mágicas: filé-na-chapa! Nunca imaginei que um dia ficaria tão feliz em ver essas três palavras impressas em um papel plastificado. Cocei o queixo com o dedo indicador e fiz um “hmmmmm” como se a decisão fosse muito difícil de ser tomada, esperei exatamente 14 segundos e 27 décimos, e respondi para o garçom, categórico: “um filé na chapa, por favor”.
- Sim senhor – respondeu o garçom, que ia saindo, provavelmente pensando: “nossa, esse cara tem um gosto apurado”, quando alguém, provavelmente a Carol Ritter, disse:
- Ele tem alergia a ovo!
Ai o garçom me olhou com aquela cara que falei da outra vez: como se eu fosse um híbrido humano alienígena ou algo semelhante, e seguiu em frente.
A seqüência do jantar, as fotos da Carol Ritter dispensam minhas palavras. Enquanto todo mundo enchia o buxo com pizza, eu fiquei ali, aguardando, pensando na vida. Não adiantava nem falar, que ninguém prestava atenção.

- Pai, tu viu que o Inter perdeu para o Juventude em pleno Beira-Rio?
Em uma situação normal ele ficaria espantado, diria “fala sério!”, mas dessa vez não. Na-nã-ni-nã-não! Ele disse:
- Pede pra alguém trazer uma portuguesa.
Pra mim portuguesa é a Lusa! Vice-campeã do Brasileirão de 96. Mas enfim, olhei para o lado e resolvi tentar o meu amor:
- Amorzinho, vamos voltar a pé pela praia? Está tão bom de caminhar olhando as estrelas...
- Mas que coisa, eu pedi para o garçom trazer calabresa e ele sumiu! Ei! Calabresa, por favor!
Olhei em volta, todo mundo, em todas as mesas, estavam centrados única e exclusivamente na maldita pizza! Parecia uma droga alucinógena! Havia dezenas, talvez centenas de pessoas ali, e todas estavam completamente obcecadas por pizza! Mas minha mãe é minha mãe. Você sabe, mãe é mãe. Mãe nunca abandona o filho em hipótese alguma. Para a mãe, o filho está acima de tudo! Ela me dará ouvidos! Ahá! Agora vocês vão ver! A minha mãe está aqui!
- Mãe! – chamei.
- Hum? – perguntou ela de boca cheia.
- O pai estava só olhando para aquela mulher ali, de mini-saia branca. Pois é, pois é, pois é...
- Eu não gostei muito dessa de frango, prefiro a de quatro queijos.
- Nara – disse meu amor para minha mãe – experimenta essa de strogonoff, está ótima!
- Eu gostei mais da de coraçãozinho – disse minha irmã do outro lado.
- É boa, mas a melhor é a portuguesa – respondeu o namorado da minha irmã.
- Hmmmmmm – resmungou o pai com a boca cheia.
Eu realmente não existia ali. Restava pensar na vida, nos meus cachorros que estavam em Santo Ângelo. Será que estão se alimentando bem? O Jimbo já tem 16 anos... a Pipoca uns 14, e a Pretinha, bom, a Pretinha tem só uns 4. Somando tudo dá 34 anos. É muito tempo para um cachorro...
Enquanto eu divagava mentalmente sobre o assunto, chegou o garçom com meu filé na chapa. Vinha arroz, salada, filé e batatinha frita. Ai, como se não bastassem encher o buxo com pizza, ainda se atracaram nas minhas batatinhas!!!!!!!! Onde andamos? Quando vi, restavam poucas dezenas delas no prato! Mas antes que você, nobre leitorinho, sinta pena de mim, eu digo que o bife estava muito bom. Até levamos metade dele para o outro dia, já que o preço não era lá muito bom não.

Pois é, nobre leitorinho tupiniquim. Essa foi apenas mais uma das tantas histórias que vivo diariamente em função da dita alergia. Ah, o pessoal aos poucos vai me lembrando de outras perguntas, então lanço mais uma para o dicionário do óbvio ovante (não precisa me criticar, é imitação pura do Zé Simão e o dicionário do óbvio lulante...):
- E ovo de páscoa, você come? – como em todas as piadas, a pessoa se mata de rir se achando um Shakespeare do ovo (se você tem preconceito com Shakespeare, leia, é muito cômico. Esse sim é um gênio do humor).
- E capim, você pasta? O quê!? Não?! E desde quando jegue não pasta? – HAHAHAHAHAHAHAHAHAHA, como sou engraçado!! E por ai vai...

Seguem as fotos, para sua diversão!
































segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

O dia em que Kaká se tornou o melhor do Mundo – A VERDADE

Tudo bem, chega de modéstias. Eu não gosto muito de aparecer, gosto de ajudar os outros sem estrelismo e tudo mais, mas dessa vez vou ter que confessar a você, nobre leitorinho tupiniquim: foi graças a mim, Eduardo Ritter, que o Kaká hoje é o melhor jogador do mundo. Vou contar essa história porque acabei de voltar do litoral catarinense e foi justamente lá, nas praias de Santa Catarina, que o Kaká começou a se tornou o Kaká do Milan e da Seleção. Antes ele era apenas o Kaká do São Paulo, que não conquistava título nenhum e que era chamado de pipoqueiro pela torcida do tricolor paulista...
Mas a vida do Kaká começou a mudar de verdade quando ele estava sentado em um banco na beira da Avenida Atlântica em Balneário Camboriú, no longínquo janeiro de 2002. Naquele verão, eu estava trabalhando como mensageiro no Hotel Costa do Marfim, em Camboriú, na tentativa de ganhar alguma grana enquanto não começava o curso de jornalismo. E nós, mensageiros, gostávamos de levar os hóspedes, em especial as excursões de férias de turmas que estavam terminando o segundo grau, para a balada, para o futebol de areia, para os luais inesquecíveis à beira mar regados a caipirinha de abacaxi e muita cerveja de litro. Mas saindo da vida noturna e voltando aos dias de sol a beira mar, eis que numa bela tarde, em meio a uma pelada (no sentido futebolístico) a beira mar e a alguma caipirinha com um pessoal de Tejupá-SP (terra do Iranildo, ex-Flamengo e Botafogo - eles me diziam isso com muito orgulho) aparece um cara alto e magro se dizendo jogador do São Paulo. Ele interrompeu a pelada bem quando nosso time ia marcando o 18° gol da goleada de 18 a 4, e o pior, eu tinha acabado de dar um chapeuzinho no goleiro, inclinei o corpo para dar uma bicicleta cinematográfica, quando vi aquele sujeito de bermuda de surfista invadindo o “campo”, ou melhor, a areia.
- Pára o jogo! - disse ele.
- Que porra é essa??!! – respondi aos berros.
- Lindo! Lindo! – gritavam as gurias na beira da praia.
Eu não estava acostumado com todo aquele assédio, a mulherada me chamando de lindo e um torcedor invadindo o campo para falar comigo.
- Cara! – disse o cara magro, ofegante, e com os olhos arregalados de tanta excitação – Desculpe interromper, meu nome é Ricardo Izecson , mas me chamam de Kaká lá no São Paulo. Estou de férias e queria aprender como você faz isso?
“Que sujeito mais ingênuo. Coitado, ele não sabe que quem sabe... simplesmente sabe! Não existe fórmula!”, pensei, vendo ele se aproximar.
- Olha meu jovem – respondi em tom professoral – quando a gente é novo é normal a gente sonhar bastante. Meu sonho era ser astronauta, mas nasci no país errado, fazer o quê. Eu até acho que você pode levar jeito para jogar, e acreditaria no seu futuro se não fosse esse seu jeitão de playboy. Mas podemos dar um jeito...
- Eu lhe seria eternamente grato – disse o garoto, em tom tímido.
“Tsc, tsc, tsc! – pensei - Ele é muito educado para ser jogador de futebol. Se ele chegasse e dissesse: ´porra, tu joga pá caralho! Me ensina a fazer isso mermão!’, eu até acreditaria nele”. Mas, movido pela pena que toma conta das almas bondosas, como é a minha, eu respirei fundo e respondi num suspiro.
- Ok, ok, meu filho. Primeiro fica sentadinho naquele banco e fica observando, depois você joga e vamos ver o que aprendeu.
- Ótimo! – disse, eufórico. E saiu correndo bestialmente de volta para o banco, de onde não tirava os olhos de mim. Por coincidência, quando ele saiu as gurias pararam de gritar “lindo, lindo”, desconfio que é porque a partida iria reiniciar e elas não queriam perder nenhum minuto do espetáculo.
Bola rolando, nosso time pressionando, a primeira bola que recebi deixei três marcadores para trás, o goleiro deu um carrinho, e ficou na saudade. Puxei a bola para um lado, e ele passou feito um touro, e apenas toquei para o fundo da rede. Passei pelo tal de Kaká e dei a primeira lição: “simplicidade, garoto!”. Ele puxou um bloquinho do bolso e começou a escrever.
Saída de bola para o adversário, em poucos segundos roubei a bola de um argentino cabeludo e bati de fora da área, a bola entrou no ângulo, sem chances para o goleiro. Passei novamente pelo jovem e recitei o segundo mandamento do craque: “objetividade, rapaz!”. Ele baixou a cabeça, e seguiu escrevendo. Os pobres dos adversários deram nova largada, e quase descontaram. Na cobrança do tiro de meta, a bola veio em minha direção e acertei uma bicicleta com direito a pedalada e tudo mais. A bola ainda tocou na trave direita antes de entrar. Passei novamente pelo tal Ricardo e parei na frente dele. “Ousadia! Ousadia! Agora vai lá, é sua vez”.
A bola voltou a rolar e fiquei observando o tal de Ricardo, que ainda bem que chamavam de Kaká, porque Ricardo não é nome de jogador, mas sim de amante de mulher de sargento. O garoto levava jeito, até. Fez um gol atrás do outro, e, devo admitir, alguns mais bonitos do que os meus. Antes de ir embora ele veio me agradecer solenemente pela minha aula particular e me garantiu. “Eu serei eternamente grato a você, Dudu. Sempre estarei pronto para ajudá-lo no que for preciso. Tudo o que eu ganhar daqui para frente devo a você”, disse. Eu fiquei olhando para aquela cara de bundinha de nenê, baixei a cabeça, e fiz um breve comentário:
- Não quero nada de você, meu bom rapaz. Apenas faça o que eu lhe ensinei hoje e siga sempre em frente. O resto virá automaticamente. Seja feliz, meu jovem, você merece.
Dei-lhe as costas e caminhei rumo a pensãozinha onde eu estava hospedado no lado do Hotel. No outro dia, lá estava eu, puxando roupa suja do quarto dos hóspedes para a lavanderia. O tempo passou, e naquele mesmo ano o Felipão enxergou o talento do jovem Kaká, e o convocou para a Copa do Mundo. “Começou bem, o garoto”, pensei ao ver a notícia na TV. Em pouco tempo ele já era campeão do mundo, e logo foi para o exterior. No Milan, se tornou o melhor do mundo. Mas como você, nobre leitorinho tupiniquim, bem sabe, o Kaká é gente boa, como todos somos. E não é nada ingrato. Após 80 mil pessoas gritarem “Ah! Melhor do mundo!” para ele no Maracanã depois da goleada de 5 a 0 contra o Equador no dia 17 de outubro de 2007, em jogo válido pelas Eliminatórias da Copa do Mundo de 2010, ele me escreveu uma carta, que publico aqui, na íntegra.

“Caro Dudu. Enquanto o grupo está rezando o Pai Nosso aqui do lado, eu consegui me afastar dos repórteres, dos colegas e do professor para te escrever essa carta. Você disse que não queria nada de mim, mas se quiser é só pedir. Tenho até hoje minhas anotações daquela aula que você deu na beira da praia no verão de 2002, e as leio todos os dias quando acordo. Se mudar de idéia e quiser me pedir qualquer coisa, dinheiro, carro importado, viagem para a Europa, hospedagem no melhor hotel de Milão, ou até uma vaguinha como chefe da assessoria de imprensa do Milan, é só falar. Um abraço de seu disciplinado discípulo, Ricardo Izecson, o Kaká”.

Recebi a carta, e confesso que cheguei a quase me emocionar. Fiquei feliz por ter mudado a vida de uma pessoa, então, resolvi responder-lhe esses dias.

“Caro Ricardo ‘Kaká’ Izecson. Estou feliz por você. Não quero seu dinheiro, tenho mais do que isso. Muito menos sua fama. Mas você sabe aproveita-la muito bem e estou feliz porque você realmente entendeu e levou a sério o que eu lhe disse. Onde estou, nem meu cachorro me ouve. Sucesso, sempre. Um abraço, e me mantenha sempre no anonimato. Se alguém lhe questionar sobre essa história, negue! Pois eu posso cair em tentação e publicá-la, mas será um momento de fraqueza, então, deixe que eu passe por louco. É o melhor para mim. Estou torcendo por você. Abraço, Eduardo Ritter”.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Bar, panfletos, choro e praia! - Não necessariamente nessa ordem...


Os textos publicados antes desse já saíram no link
colaboradores, mas você, que não viu nem votou, pode
ler agora! O Dudu agradece!!!
Começo a retrospectiva a partir daqui:

O bar do meu tio. Se você continuar lendo as minhas colunas, ou se não colocarem veneno na minha cerveja, com certeza você ainda ouvirá falar muito dele. Trata-se do Bar Garibaldi, localizado na Avenida Venâncio Aires, em frente à Praça Garibaldi, na Cidade Baixa em Porto Alegre. O nome do meu tio: Nebusaradan Ritter, mais conhecido por nós, sobrinhos, como Tio Dãe, e pelos clientes e pessoal das redondezas simplesmente como Ritter.
- Ô alemão xarope! - O tio nada.
- Ô alemão xarope, me vê uma cachaça - O tio nada.
O senhor de pele negra, aparentando cerca de 80 anos, insiste:
- Ô alemão xarope. Pára de se faze de surdo.
O senhor me olha, com os olhos revirados, e o tio fica ali, com a testa franzida, como se nada estivesse acontecendo.
- Esse aqui – me diz o bêbado, apontando para o meu tio – é alemão. O sobrenome dele é Ritter. É um baita dum alemão xarope. Não é bom confiar nele. Não dá para confiar em alemão.
O tio escuta tudo e diz, apontando para mim com a cabeça:
- Esse aí também é alemão. Pergunta o sobroneme dele?
O bêbado me olha desconfiado, cambaleia para um lado, para o outro, ergue o dedo indicador e diz:
- Não é nada! Esse guri é gente fina – depois volta-se para mim de novo e resmunga no meu ouvido, soltando algumas gotas de cuspe – esse cara é alemão. Não confie nele – então ,volta-se para o meu tio novamente e diz: Ô ALEMÃO XAROPE! ME VÊ UMA CACHAÇA.
O tio me olha e balança a cabeça, com uma cara de quem não tem nenhuma paciência, mas que ao mesmo tempo está cansado de bater em bêbado e também não tem mais saco para ficar brigando.
- Cadê o dinheiro? – pergunta o tio.
- Anota aí! – retruca o bêbado.
O tio nem se meche. O bêbado olha pra ele, olha pra mim, fica uns dois minutos revirando o bolso até tirar uma nota de um real completamente amassada:
- Ô alemão xarope! Me vê uma cachaça! – e coloca o “pila” em cima do balcão. O tio, com calma indiana, pega o que sobrou da nota de um real, guarda, vai até a prateleira que tem todos os tipos de bebidas, pega uma garrafa e serve uma dose.
- Esse alemão xarope é gente fina – diz o bêbado – tu não é alemão né? –questiona.
- Eu sou sobrinho dele. Também sou Ritter – digo, com toda a seriedade do mundo. O bêbado começa a rir como uma criança. E recomeça a mesma ladainha:
- Não confia nesse alemão xarope. Você não é alemão, não é?
Se eu quisesse, poderia ficar a noite inteira com a mesma conversa. E o pior é que essa cena se repete todos os dias. O tio só olha, com a testa franzida, e vai tomando uma cerveja para não ficar maluco. Ele não se impressiona com nada. Bukowski se sentiria em casa no bar do meu tio.
A primeira que vez que fui lá foi em 1996. Tinha 15 anos, viajei para Porto Alegre para assistir o Grêmio de Felipão contra o Palmeiras de Luisão, Djalminha e cia no Olímpico pelo Campeonato Brasileiro. Ia posar duas noites lá no bar do tio. Nunca tinha ido no boteco – no Olímpico já, num Grêmio 2x3 Botafogo em 95, com dois gols do Túlio Maravilha. Cheguei em Porto Alegre, fomos no jogo, estádio Olímpico completamente lotado, 1 a 1, gol do Viola para o Palmeiras e do Paulo Nunes para o Grêmio (28 de outubro de 96). Saímos do jogo, primeira noite posando no bar do tio, barulho de carro, vozes, buzinas na avenida, risos, copos, garrafas, gargalhadas, gritos, berros e ameaças:
- Vou te matar filha da puta!
- Então vem, fiá-da-puta! Vem se tu é homem!
Coração acelerado, olhos arregalados, suor frio. “Agora vão puxar um revólver e matar todo mundo. Sobem aqui, me matam, e levam tudo. Podem ligar pra minha mãe em Santo Ângelo. ‘Alô, é da residência do sr. Eduardo Ritter? Você é o quê? Mãe dele? Escuta, tem alguém próximo da senhora? Ninguém? Olha, aconteceu um pequeno acidente aqui em Porto Alegre...´ Pronto. É apenas questão de segundos e conhecerei o outro lado. Será que existe mesmo um bar no lado direito da porta de entrada do céu? Bem, vou descobrir em breve...”. Fiquei divagando mentalmente sobre o assunto. Já estava até conformado com a dita cuja da tal da sorte, digo, da desgranida que você sabe o nome, quando meus olhos de repente foram pesando, os crápulas mentecaptos não subiam para me matar e ficavam só gritando lá embaixo, quando vê, já estavam rindo, e no final das contas acabei sonhando com a Demi Moore jogando com a camisa 10 do Grêmio e fazendo o gol do título mundial na vingança contra o Ajax....
Na segunda noite no bar, chegou a hora de dormir, subi as escadas, deitei, e fiquei novamente com os olhos arregalados fixos no teto. Não demorou muito e começaram:
- Vou te matar, filha da puta!
- Então vem!-
Vou te matar, seu corno filho de uma cadela.
Comecei a falar de mim para mim: “não vai nada, cagão. Fica só ameaçando e não mata nem uma barata”. E é assim todos os dias.No ano passado, fiquei morando no bar durante quatro meses. São muitos personagens, a maioria deles têm histórias tão ou mais impressionantes do que as do próprio Bukowski. Meu tio, por exemplo. Depois de tantos anos passando por todo o tipo de situação, acredita perdidamente que tem o corpo fechado. “Eu não morro mais”, diz. E completa: “se me puxarem um revólver, nem ligo. Cago de laço. Agora, se puxarem um facão, fico arrepiado. Mas vou pra peleia igual”.
Certa vez, o tio estava tranqüilo, lavando um copo, como sempre faz. De repente, sentiu um cano encostando na cintura. Não pensou duas vezes, estourou o copo na cara do infeliz, que saiu correndo e disparou contra o bar do outro lado da rua, com o rosto ensangüentado, sem acertar ninguém. Outro dia, o tio passando na rua, cruzou pelo assaltante, que aliás, sempre anda pela área, como muitas figuras dali. “Viu só, filha da puta, se eu quisesse podia te matar agora. Mas não vou sujar minhas mãos com vagabundo. Vai quieto e não faz mais merda”. Sempre que o cara passa pelo bar cumprimenta meu tio como se fosse um peão dele.
Nesse período em que passei no bar do meu tio fui obrigado a entrar no clima. Passei por muitas situações que ainda vou contar aqui. Várias delas foram no período em que entreguei panfleto de empréstimo para o pessoal aposentado do Exército. Isso mesmo que você leu. Para você que conhece ou mora em Porto Alegre, eu trabalhava ali, na João Pessoa, ou senão lá na Andradas, a umas três quadras do Correio do Povo. Foram muitas as situações inusitadas, que ainda escreverei aqui para você, nobre leitorinho tupiniquim.Uma delas foi na minha primeira semana de trabalho. O salário era 100 reais por semana, mais comissão (que nunca vinha) e 10 reais por dia para o almoço e o busão. Eu ia e voltava a pé pra economizar. Como tinha trabalhado dois dias, chegou na sexta-feira e tinha 40 reais para receber. Vou explicar brevemente que estava fazendo tudo isso, primeiro, porque não conseguia emprego em lugar nenhum, e segundo, para seguir fazendo meu estágio na Rádio Gaúcha, já que era um estágio voluntário, mas que foi muito importante para mim como uma ótima experiência. Pois bem, eu estava na fila, junto com meus colegas panfleteiros (galera maluca, mas gente boa), e um carinha, negro, com toda a ginga que só quem mora na favela tem, me olhou e disse com um sotaque que era mistura de porto-alegrense com carioquês:
- Aê, quantos dias tu trabalhou?
- Dois.
- Aê. Já dá quarentão aê! – ele pensou um pouco, calculando, e completou – 20 já deixa pras meninas e 20 dá pro findi.
Eu dei risada enquanto pensava em toda a minha vida: o diploma de jornalista, o dinheirão das mensalidades da faculdade, o estágio por amor a profissão na Gaúcha, o 100 na monografia, os elogios dos professores, no meu amor, que estava me matando de saudades e que também estava ralando em Santo Ângelo... Parei de rir, baixei a cabeça. Senti um aperto no peito e uma dúvida: “tudo isso vale a pena? Por que o pessoal que ganhou a faculdade paga pelo pai e pela mãe, que nunca precisou trabalhar e pouco se importa com isso é justamente quem está ocupando o lugar de quem rala, de quem corre atrás nos grandes meios? Por que o Bukowski ficou 60 anos só levando no rabo até ser reconhecido? Por que o Cafu teve que trabalhar como papeleiro e ser reprovado no Corinthians, no Palmeiras e na Portuguesa antes de entrar no São Paulo e se tornar o Cafu capitão do penta? Por que estou entregando panfleto para ganhar 20 reais por dia? Por que...? Por que...? Por que...????”. Enquanto fazia todas essas perguntas, e muitas outras, caminhava a pé pela Borges de Medeiros, rumo a Loureiro da Silva, até a José do Patrocínio, e quando via, estava chegando no bar da Venâncio. Entrava e via o Pula-Pula, o Mateus, o bêbado que chamava meu tio de Alemão Xarope, e toda aquela gente sem dinheiro e sem esperança, mas que mesmo assim virava a noite tomando cerveja e dando risada, sem nada para ganhar nem para perder e sem qualquer perspectiva de que algo de bom lhes aconteça no futuro. Ganhava um pequeno ânimo e subia as escadas, me atirava no colchão velho colocado no meio da sala. Fechava a janela que estava aberta e que deixava a sala com temperatura abaixo de zero, colocava a cabeça entre as pernas e a única coisa que me restava a fazer era chorar e torcer para que o dia seguinte nascesse e morresse o mais breve possível, até a próxima viagem em que eu pudesse ver o meu amor e seguir sonhando com um futuro cheio de alegria, felicidade e viagens para a praia....
Pois é amigo, o futuro chegou (ele sempre chega!). E no carnaval estou indo para a praia com o meu amor!! Me despeço, entonces, com un “hasta la vista, bybes”!!!

O ovo assassino


A vida é dura. E não é só porque perdi muitas horas do meu precioso tempo tentando inutilmente contatar novamente o Bukowski através do pai Xangu. Não. Mais uma vez não! Eu descobri isso muito cedo, muito antes do que você, nobre leitorinho tupiniquim, pode imaginar. E não estou falando da batalha que tive com milhões de outros espermatozóides que lutavam arduamente para fecundar o óvulo da minha mãe. Não! Esses são dignos de todas as homenagens e honrarias. Falo de algo muito sério e que até hoje não encontrei ninguém que tenha passado pelo que eu passei, e pelo que ainda passo todos os dias da minha vidinha: a minha triste alergia a ovo.

É isso ai, nobre leitorinho. Sou alérgico a ovo. O pior é que isso realmente me acompanha. Muda o prefeito, mudam os vereadores, mudam os deputados, muda o presidente, mudam os jogadores da seleção brasileira, passa Copa do Mundo, passam as Olimpíadas, passam e voltam as crises políticas, as eleições, mas sempre que vou comer com alguém que não sabe da alergia ou na casa de alguém que não desconfia que não posso comer absolutamente NADA com ovo, sempre as atenções se voltam para esse assunto. E o pior, as perguntas são sempre as mesmas. São 26 anos respondendo todo o ano, todo o mês, toda a semana, e às vezes todos os dias as mesmas perguntas!!
A seleção brasileira pode estar decidindo a Copa do Mundo, o Brasil inteiro pode estar acompanhando o rebaixamento do Corinthians pela TV, pode até estar estourando a 3ª guerra mundial, que quando me oferecem um pastel, um doce, ou um salgadinho qualquer com maionese e eu digo “não posso, tenho alergia a ovo”, as pessoas esquecem tudo, absolutamente tudo, até a trepada que deram na véspera para saberem mais sobre a maldita alergia.
- Cara, ontem a Sharon Stone me ligou.
- Sério? E o que você disse?
- Falei que era comprometido...
- Não brinca? Quer um salgadinho?
- Não, valeu.
- Porra, come só um. Vai sobrar um monte.
- Não, não estou com fome (já tentando me livrar do bagagem).
- Cara, olha o tamanho disso, que que custa comer um?
- Não. Não posso. Tenho alergia a ovo...
Ai o cara arregala bem os olhos e fica me olhando como se descobrisse que eu fosse um espião da máfia italiana ou um hibrido humano alienígena...
- Sério – digo, já rindo de nervoso – não posso comer nada que contenha ovo...
- Porra cara! Nunca tinha visto isso...
Ai segue sempre o mesmo questionário, que eu já respondi milhões de vezes, e que seguirei respondendo até o último dos meus dias nesse mundo cruel. E a conversa é a mesma se estou aqui no Rio Grande do Sul, ou se estou passeando em Santa Catarina, Paraná, Rio de Janeiro, Espírito Santo, enfim, em qualquer lugar. Geralmente tento responder com educação, para não perder o amigo ou a simpatia do próximo. Mas eu tenho minhas respostas mentais...
- Mas é só ovo de galinha, ou de codorna também?
- Todo o tipo.
- E como você faz com os seus? – geralmente a pessoa faz essa pergunta e se mata rindo, como se fosse um gênio do humor.
- É segredo. Mas a tua mãe sabe, pergunta pra ela.
- E o que você come?
- Comida. ( pra não dizer outra coisa que ofenda a mãe do próximo)
- Mas você não come lasanha, pizza, bolo, pastel, maionese? O quê? Não!!?? Não acredito! Eu não consigo imaginar a minha vida sem comer bolo!!!
- Não diga. E eu não consigo imaginar a minha vida sem fazer sexo. Tem horas?
- Mas se comer só um poquinho, faz mal?
- Faz.
- E o que acontece?
- Vomito tudo. Até as tripas. Se tomar remédio pela boca, volta tudo na hora. Tenho que ir para o hospital tomar na veia.
- É só a clara, ou a gema também?
- Escuta, você sabe o que é um ovo ou quer que eu desenhe?
- Ah, mas come só um pouquinho. Não vai fazer mal...
- Ah, mas vai se fuder.
- Ah, é psicológico.
- Ah, psicológico vai ser o soco que vou dar na tua fuça.
Uma das besteiras mais repetidas é essa. E não adianta eu contar trocentas histórias de situações em que passei mal por comer alguma comida sem imaginar que tivesse o maldito do fiá-da-puta do ovo. Elas fazem “tsc. É psicológico”. Então, eu começo a fazer o Ommmm pra não responder: “porra, eu falei grego por acaso? Ou você é burro mesmo e não sabe entender uma história simples?”. São 26 anos de alergia a ovo, uma tonelada de vômitos, algumas internações, e vários inconvenientes, e o mané vem dizer que é psicológico! Psicológico é o chifre que ele deve ter na cabeça! Mas enfim. Existem pessoas que devem ter um ovo no lugar do cérebro.
É, amigo, a vida não é fácil. Já fiquei a noite toda ouvindo piadinha de garçom mala, já fui em restaurante e me servi só de arroz e alface (porque no resto, tudo ia ovo), já tive que explicar isso pra sogro, sogra, tio, tia, cunhado, amigo, amiga, colega, professor, enfim, tudo que você imaginar. Mas o pior é quando você explica tudo direitinho, mas sem falar coisas pesadas, como vômito, e no meio da janta ou almoço a criatura (geralmente pai ou mãe da pessoa que me convidou) faz algum comentário como se eu estivesse dando uma desculpa esfarrapada para não comer. “Porra, eu não posso comer essa birosca porque senão eu vomito na tua mesinha limpinha, ta entendendo??”. Mas eu nunca dei essa resposta, portanto, pode me convidar para jantar na sua casa...
Mas um dos comentários que mais ouço é: “ainda bem que não tem ovo na cerveja”. A criatura fala isso e se mata rindo, bestialmente, novamente como se tivesse falando uma genialidade que eu nunca tivesse ouvido. E sempre tem um espertinho pra completar: “nem na cachaça”.
HAAHAHHAHAAHAHAH. E eu fico lá, com um sorriso amarelo igual ao da gema do ovo, pensando, “como algumas pessoas tem o dom de serem estupidamente estúpidas e sem criatividade”.
- E nos aniversários, você comia o bolo?
- Se comia, vomitava.
- E o teu bolo?
- Comia e vomitava.
- E você sente falta de comer coisas com ovos?
- Não. Elas nunca ficam no meu estômago por mais de um minuto e meio.
- E se te atiram um ovo, faz mal?
- Não sei e prefiro continuar não sabendo.
- Quando você descobriu que tinha isso?
- Depois da 34ª vomitada na sala da minha mãe.
- Quer um salgadinho?
- Não.
- Ah, come um vai?
- Não, valeu.
- Ah, só um....
POWWW!!!!!!
Para encerrar. Uma história contada pelo meu amigo Eduardo Fronceck, o Fronga, de Horizontina-RS. Fronga chega no posto de saúde para se vacinar contra alguma doença qualquer. A enfermeira, segundo ele bem jeitosa, pergunta com aquela boca carnuda antes de colocar a agulha nele:
- Você tem alergia a ovo?
- Eu não...
Fica um silêncio e ele fica pensando, enquanto ela vai introduzindo a agulha no braço dele.
- Quem é que vai ter alergia a ovo? – questiona, indignado com a pergunta que a jeitosa fez.
- É verdade. Nem sei por que pergunto isso....
Nossa! Se eu fosse o próximo da fila não estaria aqui escrevendo pra vocês. Aliás, em tempos de febre amarela, eu, como jornalista, fazendo matérias sobre a vacinação, perguntava para os especialistas sobre as contra-indicações. Não foram todas, mas algumas fontes respondiam normalmente, e quando paravam de falar, eu questionava:
- É só isso?
- É – respondiam meio sem jeito.
- Mas não é contra-indicada para quem tem algum tipo de reação a substâncias que contém ovo de galinha?
- Ah, sim. Também.
Desse jeito, eu ainda vou morrer por causa dessa maldita alergia!!
Hora de fazer o Ommm. Ommmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmm!!!!

O dia em que Bukowski tomou cerveja com Jesus Cristo


“Toda a história tem que atrair o público pelo início”. Ouvi essa frase do diretor e roteirista Jorge Furtado, de O Homem que Copiava, Meu Tio Matou um Cara, Houve uma vez dois Verões, entre outros longa-metragens brasileiros. Então, queria algo marcante para a minha primeira coluna em O Rebate. Mas hoje em dia o que prende o leitor? Pensei em várias coisas. Primeiro, em escrever uma coluna com alguma história de ficção... Uma história com doze macacos, em que um cientista está fazendo experimentos neles. Os macacos têm asas e estão apostando uma corrida. Seis machos, e o resto você sabe... Ei, não está dando certo. Essa o velho Bukowski já experimentou uma vez e não deu certo. Acabou com um casal de macacos trepando em um beco, e um guarda metendo uma bala na cabeça do macho, e após tentar transar com a fêmea e não conseguir, deu fim a rápida passagem dos macacos voadores na terra. Muito triste, essa história. Eu não queria terminar desse jeito.
Depois, pensei em escrever algo real, que aconteceu, algo que realmente atraísse você, nobre leitorinho tupiniquim. Mas não é fácil atrair você. Não, muito pelo contrário. Ainda mais no meio de tantas notícias desastrosas, tragédia no Quênia, corrupção em Brasília, tráfico no Rio, sempre a mesma ladainha que se repete e que sempre choca. Choca como a cerveja chocou no copo de Jesus Cristo, no dia 9 de março de 1994, quando ele recebeu Charles Bukowski no bar de entrada, localizado na direita de quem passa pela porta do céu.
Em tempos de consulta a pais e mães de santos para as previsões que nunca acontecem para o ano que chega, eu consultei o Pai Xangu para saber o que aconteceu no tal dia 9 de março. O velho safado só aceitou contar em poucas palavras após oferecermos uma dose de whisky. Como ele não se mostrava muito disposto a falar coisa com coisa, resolvemos tentar subornar ele com uma caipirinha, que pelo nome ele não conhecia, mas após provar três doses acabou dizendo que amava o Brasil e que iria reivindicar a Jesus que na sua próxima reencarnação ele nasça no país tropical mais sem-vergonha do mundo. “Um charlatão como eu vou me dar muito bem ai”, disse. Mas chega de papo furado, e vamos as revelações do velho Buk:
“Porra, acordei e parecia que tinha tomado uns cinco garrafões de vinho. No início achei que era só mais uma ressaca, já que toda vez que acordava de ressaca achava que tinha morrido, mas no fim era pura ilusão. Dessa vez nem me iludi. Mesmo vendo aquele portão dourado na minha frente, com aquela campainha do lado. ‘Devo ter tomado um porre e me largaram na frente de um hosípicio’, pensei. Resolvei apertar a dita campainha, até porque não havia mais para onde ir.
- Como se chama?
- Quem quer saber? – respondi.
- Como se chama?
- Foda-se.
- Como se chama?
- Porra, só sabe perguntar isso?
- Como se chama?
- Mas que saco. Ok. Henry Chinaski – murmurei, dando meu nome literário.
- Mentira.
- Porra, vai se fuder. Se sabe meu nome por que pergunta?
- Está bem, entre.
Depois disso, abriram-se os portões.
‘Estou no paraíso’, pensei, esperando que viessem um monte de anjinhas peladas pulando no meu colo, cada uma trazendo um litro de cerveja para a festa sem fim... Mas ao contrário disso, encontrei um velho barbudo.
- Venha por aqui – disse ele.
- Não vou – respondi.
- Te pago uma cerveja – retrucou.
- Ok.
O velho me conduziu até um barzinho que parecia com um que eu quebrei a cara de um garçom, certa vez, em Los Angeles.
- Senta ai.
Sentei. Ele sentou-se na minha frente e ficou me olhando com uma cara de quem também estava acostumado a ressacas.
- Você tem alguma pergunta para fazer? – me perguntou.
- Cadê a cerveja?
Ele colocou os dedos na boca e soltou um assovio que quase me deixou surdo. Então, veio uma anjinha pelada com uma garrafa de cerveja e dois copos. Era a Tina Thunder em miniatura. Enquanto ela subia de volta para o além fiquei olhando para o rabinho dela pensando ‘ainda vou te pegar’. Eu via ela desaparecendo no céu do céu, quando de repente só ouvi POW! e um monte de estrelinhas... Olhei para o velho e ele estava injuriado.
- Escuta aqui, rapaz. Meu nome é Jesus Cristo e aquele anja é só minha, portanto, nunca mais olhe para ela assim ou estouro seus miolos.
- Ok – disse ainda meio tonto pela pancada.
- Bom, essa foi a primeira vez em mais de dois mil anos fazendo isso em que perco a paciência. – explicou-se – Na verdade gente como você vai direto para o inferno. Mas como você influenciou milhares de pessoas, e eu não tenho como mandar todas elas para o inferno, resolvi te dar uma chance. No fundo sei que você é uma boa pessoa.
- Todos somos – respondi.
- Exatamente. Todos somos. Está vendo. Você compreende isso. Mesmo sendo do jeito que você é, você entende o que eu levei dois mil anos tentando explicar para as pessoas. Que todos somos boas pessoas.
- O que você quis dizer com ‘mesmo do jeito que você é?’ – questionei, acabando com a cerveja, e já esperando a Tina Tander de volta.
- Olha você sabe...
- Hummm. Sei. Não tem mais cerveja?
Ele deu outro assovio, e agora veio um Silvester Stalone em miniatura pelado. Quando vi, quase vomitei tudo, mas consegui segurar.
- E a Tina? – perguntei.
- É ela. É que esse é um anjo bem humorado, ele gosta de aprontar com os recém chegados.
Não falei nada, apenas continuei bebendo. Ele também não falou nada e ficou me olhando. Gostei dele. Não é chato. Poderíamos ficar a vida inteira bebendo (Mas que vida, se estou morto, apesar de não ter certeza disso). Tomamos mais umas cinco garrafas, até que comecei a me entediar com a cara do velho.
- Eu estou morto?
- Óbvio que sim.
- A gente tem ressaca quando está morto?
- Não.
- A gente fode quando está morto?
- Também não.
Fiquei calculando o que era melhor: estar vivo fodendo ou morto sem sentir ressaca? Acho que é melhor estar vivo, conclui.
- O cara morto é uma merda – comentei.
- É sim.
- Você é foda. Passaram-se dois mil anos e você continua com a mesma popularidade – disse a muito custo, já que nunca admiti que alguém fosse foda.
- É, sou sim.
- Então é isso.
- Éééééé.
- Me empresta a Tina?
POW!!! Só fui acordar agora, sei lá eu quantos anos depois, com você me chamando...”
E assim terminou o depoimento do Bukowski. Ele contou tudo isso enquanto tomava sua caipirinha. Tentamos outros contatos, mas não conseguimos nada. Acho que é porque em início de ano da congestionamento de baixar espíritos alheios. Mas continuaremos tentando novos contatos com o velho Buk. Enquanto isso, contentem-se comigo: Eduardo Ritter, 26 anos, gaúcho de Santo Ângelo, jornalista, escritor, leitor, sonhador e tudo mais que quiserem....